Um Pequeno Anjo

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Acordo ouvindo um grito e sei que veio do quarto de mamãe. Olho pela janela e vejo que ainda está escuro lá fora. Continuo deitado e não faço barulho, sei que ele está ai como mamãe, então é melhor eu ficar na minha, não quero correr o risco de tomar outra surra, minha cabeça ainda dói pela última.

Quando ouço a porta batendo tomo coragem e me levanto, saio do meu quarto e vejo mamãe sentado no sofá, ela está com seus cabelos bagunçados e com a boca cortada e um olho roxo. Olho para ele e vou em direção à cozinha, abro a torneira e molho um compressa, volto à sala e me aproximo de mamãe, ela sorri enquanto limpo seu rosto machucado.

Passo o pano por sua testa que parece um pouco quente e ela estremece. Dou um beijo suave sobre sua testa e mamãe dá um leve beijo em minha mão. Pego a escova na mesinha ao lado do sofá e começo a escovar seus cabelos.

—Você está com fome Christian? —Mamãe pergunta com seus olhos cinzas brilhando.

—Um pouco. —Minto para tranquilizá-la.

—Não minta seu merdinha. —Ela diz sorrindo.

Mamãe tem uma forma estranha de me tratar, mas noto o carinho em sua voz.

—Eu tenho algum dinheiro, você quer sair e comprar um bolo? Amanhã é seu aniversário.

—Nós podemos?

—Tudo por você Christian. —Mamãe diz dando palmadinhas no meu bumbum. —Agora pegue sua jaqueta. Ande.

Corro até meu quarto e pego meu casaco amarelo, ele é meu favorito. Está um pouco surrado, mas tem o cheirinho da mamãe.

Volto à sala e encontro mamãe, nós saímos e deixamos a porta encostada, andamos pela calçada juntos e entramos na padaria, ela me deixa escolher o meu bolo e depois que paga nos voltamos para casa. Vamos no caminho de mãos dadas observando a lua no alto céu. Ela está linda hoje.

Quando passamos em frente ao beco eu no algo, paro para ficar olhando e quando mamãe percebe que parei olha para o mesmo lugar.

—O que é? —Pergunto olhando para a pequena sombra de cabelos castanhos.

—Um menina, eu acho. —Mamãe diz se aproximando dela e me deixa parado. —Olá. Qual o seu nome?

—Anastásia. —A pequena sombra diz, e mesmo que não possa vê-la noto um sorriso.

—Onde está sua mãe?

—Eu não sei. —A menina dá de ombros.

—Você está sozinha?

—Sim, a mamãe me deixou aqui e disse que não poderia cuidar de mim.

—Ah, isso é horrível.

—É, acho que sim. —Anastásia fala e solta um risinho.

—Hum... Que tal você vir comigo?

—Por que?

—Porque você é uma criança, e não pode ficar sozinha. Me diga, quantos anos você tem?

—Assim. —Ana diz levantando a mão mostrando seus quatro dedos.

—Uau. —Mamãe diz. —Então é melhor você vir comigo, é perigoso ficar aqui sozinha, e aposto que você está com fome.

—Tudo bem. —Ela diz e posso ver outro esboço de sorriso.

Mamãe segura à mão de Anastásia e as duas se aproximam, assim que a claridade da luz bate no rosto da menina eu vejo como ela é bonita, parece um anjinho. Como os que mamãe descrevem... Anjinhos que nos protegem.

Anastásia tem cabelos castanhos que vão à altura das duas coxas, ela tem olhos grande a azuis e é bem branquinha, realmente me parece um anjo.

—Oi. —Ela diz sorrindo para mim e acho aquilo engraçado. Ela parece meio doida. —Eu sou Ana.

—Eu sou Christian. —Digo baixinho e encolho os ombros.

—Você tem olhos engraçados. —Ela diz rindo. —Cinzas.

—Eu acho os olhos dele muito bonito. —Mamãe diz enquanto caminhamos.

—É diferente. —Ana diz. Ela se encolhe um pouco e sei que é pelo frio.

—Toma. —Digo lhe entregando minha jaqueta. —Está frio.

—Mas é sua. —Ana diz se recusando a vestir e eu fico bravo.

—Para de ser boba e vista. —Digo em tom autoritário, como mamãe diz quando está brava, e funciona, pois ela veste a blusa.

Chegamos a casa e eu levo a sacola para a cozinha enquanto mamãe fecha a porta. Quando volto à sala vejo a pequena Ana olhando tudo em volta e sorri ao ver meus carrinhos.

—Você pode brincar com eles se quiser. —Digo baixinho e ela ri.

—Você fala muito baixo. —Ana diz rindo.

—Ana, venha aqui. —Mamãe diz se sentando no sofá. —Me conte o que aconteceu com sua mãe.

—Hum... —Ana faz uma careta. —Ela disse que eu não era uma boa menina.

—Por quê? —Pergunto sentando ao lado de mamãe.

—Porque eu fiz o papai ir embora. —Pela primeira vez a vejo triste. —Por isso eu sou má, e ela disse que não poderia ficar comigo, eu traria muitos gastos.

—Você não é má. —Mamãe diz. —É uma linda garotinha.

Ana encolhe os ombros e suas bochechas ficam vermelhinhas.

Mamãe pega Ana no colo e fica fazendo carinho em seus cabelos. Elas tem cabelos parecidos. Quando olho para a menina vejo que ela dormiu.

—Nós podemos ficar com ela? —Pergunto baixinho.

—Sim. —Mamãe diz. —Mas não podemos contar para ele... Ele pode querer ganhar dinheiro em cima dela, e não queremos isso, certo?

—Certo, mas onde vamos deixá-la?

—Quando ele chegar ela fica no seu quarto... Debaixo da cama, e bem quietinha, depois que ele for embora você pode tirá-la de lá. Mas nunca o deixe vê-la. Ok?

—Ok. —Balanço a cabeça e abro um pequeno sorriso com a ideia de ter Ana por perto.

Ela me parece boa... Sem contar que eu terei alguém para cuidar além de mamãe.

Eu vou protegê-la, e nunca vou jogá-la fora como sua mamãe fez.

A pequena Ana não merece isso.

Eu vou cuidar dela.

Eu e Você, Para SempreOnde histórias criam vida. Descubra agora