Em becos escuros- Parte I

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"Inquieta é a cabeça que carrega uma coroa." - Shakespeare.

Charlotte tinha certeza de que não poderia estar mais certa. "Os estudiosos são ignorantes" era o que ela queria gritar por todos os 4 cantos daquela mansão de luxo, mas estava tentando ficar o mais calada possível enquanto Estela Morgan levava James e ela em silêncio até seus aposentos; mal sabia ela que Charlotte queria enforcar seu irmão. Luke Morgan foi muito ignorante com os dois caçadores. "Eu pedi os melhores caçadores de Londres, não adolescentes", as palavras ecoavam nos ouvidos de Charlotte como se fossem espinhos, mas como sempre James resolveu a situação com calma e delicadeza, coisa que ela não tinha.

- Aqui está Sr. Collins - falou Estela parando em frente a uma porta.

- Pode me chamar de James ou Jem, como preferir - disse ele sorrindo para Estela.

- Bom... James aqui é o seu quarto, pode entrar e ficar a vontade - falou Estela.

James se despediu de Charlotte, acenou para Estela e entrou no quarto.

- O seu fica no próximo andar Sra. Pierce - disse Estela virando-se para Charlotte.

- Esse lugar é enorme - disse ela.

- Realmente, mas já estou acostumada, vivo aqui desde pequena - disse Estela sorrindo. - Mas devo avisá-la que nos primeiros dias será difícil se acostumar com a música - concluiu.

- Não tem problema, eu sempre toco a noite - falou Charlotte.

-Também toca?! - disse Estela animada.

- Sim, violino além de ótimo instrumento é uma ótima arma - respondeu.

Elas estavam subindo as escadas em direção ao quinto andar; o lugar estava muito quieto, parecia que não havia ninguém lá.

- Ah, meu principal instrumento é o piano - falou Estela.

-Principal? - perguntou Charlotte confusa.

- Sim, eu também sei tocar vários outros, aprendi quando pequena - respondeu.

-Estudiosos- sussurrou Charlotte com deboche.

-Como? - perguntou Estela ainda sorrindo.

- Estamos chegando? - perguntou Charlotte disfarçando e tentando sorrir.

-Sim, é logo ali - falou Estela apontando para uma porta. -Meu quarto é na porta à frente. Se precisar de mim é só bater ou ir até a biblioteca ou a sala de música - disse ela chegando até a porta.

- Obrigada Srta. Morgan, e desculpe a grosseria de antes- disse Charlotte. Ela odiava pedir desculpas, mas às vezes era necessário. Além disso, tinha achado Estela simpática.

- Não se preocupe. Só para deixar claro, eu não me importo com a idade de vocês, se são os melhores, eu acredito; e não se preocupe, meu irmão é um pouco estressado mesmo - falou Estela meio sem graça.

- Inquieta é a cabeça que carrega uma coroa - citou Charlotte sorrindo.

- Exatamente. Eu já estou indo Srta. Pierce, tenho assuntos para resolver - falou Estela.

Charlotte acenou com a cabeça e abriu a porta do quarto enquanto Estela se retirava.

O dia estava longe de acabar para Anne Johnson que nem teve tempo para dormir direito depois de ter voltado do trabalho. Ela tinha conseguido um emprego na cozinha do bar Jazz e Bourbon a quase 2 dias e já estava exausta. O lugar ficava lotado quase o dia inteiro, era um dos bares mais famosos no French Quarter, mas não podia reclamar, pois precisava do trabalho para ajudar sua mãe que estava muito doente e seu pai que estava muito velho para trabalhar. Por isso depois do sol se pôr ela se despedia de seus pais e saía de sua casa para mais uma noite de trabalho. Já estava bem acostumada com o caminho, mas ainda tinha muito medo de sair sozinha pelas ruas do French Quarter. Os últimos 2 meses estavam muito sombrios na cidade. Passando pelas ruas que antes ficava cheia de pessoas ela podia ver o deserto; as mortes estranhas apavoraram os cidadãos de Nova Orleans, inclusive ela que estava passando pelo beco cheia de medo. Não tinha jeito, aquele era o único caminho que levava até a porta de trás do bar. Estava bem escuro, pelo menos o suficiente para tropeçar na barra de seu vestido e cair. Ela sentiu uma dor aguda na perna, com certeza tinha se machucado.

- Era só o que faltava - sussurrou ela.

Anne se levantou e prosseguiu o caminho. Estava começando a esfriar, ela levantou um pouco a barra do vestido para ver seu ferimento e encostou-se na parede de tijolos do beco, era só um arranhão ensanguentado, mas como ela quase não se machucava a dor estava a incomodando. De repente ela escutou um barulho, um barulho de passos, Anne se virou imediatamente, mas não tinha nada ali. Assustada ela ajustou o vestido e começou a andar mais rápido. Escutou de novo o barulho, mas não tratou de olhar para trás, precisava chegar logo no bar. De repente ela caiu no chão, ou melhor, foi empurrada, mas desta vez com muita força bateu com a cabeça e o corpo no chão. Seu cabelo que antes estava em um coque agora estava caído em seus olhos. Ela sabia o que aconteceria.

- Por favor, eu... não tenho nada comigo - suplicou ela.

Ela sabia que alguém estava atrás dela, podia ver sua sombra na parede. Ela escutou uma risada sádica e seu corpo foi virado para cima, agora podia ver a cara da pessoa que estava prestes a matá-la, ela conhecia muito bem aquele rosto.

- Não é... como?! - disse olhando para a pessoa que estava a sua frente que sacou uma faca que estava em sua capa e em questão de segundos fez com que Anne não visse mais nada.

***

Depois de sua irmã deixar a sala com os novos visitantes Luke fez questão de escrever uma carta para Christine Collins, mas logo depois de ter terminado-a colocou em cima de um dos livros que estavam na sua mesa. Não adiantaria mandar a carta, não sabia o que a líder da Sede de Londres pensaria, mas com certeza criaria antipatia por ele, e Luke não podia estragar as relações. Ele estava com raiva do que Charlotte tinha dito, mas era verdade, não tinha descoberto nada e estava desesperado. Ele saiu de sua sala, não adiantaria nada ficar lá pensando. Estava cansado. O primeiro andar estava deserto como quase sempre ficava, nem tinha percebido que já era noite.

- Senhor - falou John entrando pela porta da frente. Ele parecia assustado e estava pálido.

- O que aconteceu? - perguntou Luke se aproximando do cocheiro.

- Eu vim lhe avisar que teve outra morte está noite- respondeu ele tirando seu chapéu e colocando contra o peito. - O senhor disse para avisar...

- Sim John, eu disse, vamos logo - interrompeu Luke pegando seu chapéu e capa que estava no mancebo.

-Mas... não acha melhor avisar os caçadores ? - perguntou John.

- Não... quer dizer, não é necessário, seria inoportuno, já é noite e eles são adolescentes - disse Luke indiferente.

- Sim senhor. Irei preparar a carruagem - falou John se retirando.

Luke vestiu a capa e colocou o chapéu olhando as escadas para ver se tinha alguém. Provavelmente Estela o chamaria para jantar a poucas horas. Ele inventaria algo e pediria para John não comentar, mas uma coisa era certa, ele não receberia ajuda de crianças. "Seria muita humilhação", era o que pensava enquanto saía pela porta da frente.


Os Dois Lados Da Espada : Caça as Bruxas Onde histórias criam vida. Descubra agora