Capítulo 10

422 95 37
                                    

ERIK

Passei a madrugada entre aeroportos e voos. Cheguei ao aeroporto de Lisboa às três da manhã e desembarquei dando risada, em meio a uma conversa divertida com Bellanne. Tomei um café com pão de mafra, enquanto no Brasil ela tomava seu café com torradas. Falamos sobre os tempos de escola, sobre vinhos, alergias e brigas entre irmãos. Eram tantos assuntos, tantas curiosidades, que precisei recarregar o celular para continuarmos nos falando, até que meu voo para Berlim foi anunciado e precisei desligar. Aquele intervalo de quase três horas e meia, entre Lisboa e o meu destino, foi o único momento em que dormi. Quase perco o voo de Berlim para Copenhagen e, só por isso, não tornei a ligar para Fraise. Tinha ânsia por saber mais sobre sua vida.

Cheguei em casa no final da manhã. Tudo continuava perfeitamente igual a quando estive aqui pela última vez, há cerca de três anos. Na oportunidade, eu tinha vindo para o aniversário de Mateo, mas como sempre, saí brigado com meu pai  —  Axel, que agora estava em uma UTI e, muito provavelmente, jamais voltaria a falar com ele. Ou brigar com ele.

Eu já não tinha a chave de casa, e nem era preciso. Como de costume, a porta do fundo estava sem tranca.

— Olá! Britta? — Entrei na cozinha chamando nossa mais antiga e querida funcionária. — Britta?

— Erik?

A jovem senhora loira, baixinha e sempre usando os cabelos em coque, veio correndo — dentro do que a sua saia longa e justa lhe permitia — em minha direção. Quando parou bem na minha frente, levou as duas mãos ao rosto, completamente surpresa.

— Erik, que alegria! — Falou em dinamarquês, embora todos em casa fossem fluentes em inglês e português. 

Britta me abraçou brevemente e deu dois tapinhas leves em meus braços. Era uma recepção bastante calorosa, considerando o que costumamos ver por aqui.

— Britta, e Mateo?

Sua feição mudou, desfazendo-se da alegria inicial.

— Está no hospital com o seu pai. O senhor Axel está muito mal, Erik. Precisa vê-lo.

— Irei, Britta. Passei horas em uma viagem complicada. Preciso de um banho e depois irei vê-lo.

— Mateo me avisou que você estava prestes a chegar, então, arrumei o seu antigo quarto. Fique à vontade.

Sorri, agradecido por tamanha gentileza. Apesar de Britta ser absolutamente diferente da minha mãe, em especial com relação à sua forma de demonstrar carinho, ela sempre nos tratou como filhos, depois que Diana nos deixou.

— Por favor, Britta, deixe o endereço do hospital sobre a mesa.

Me despedi, sentindo a cabeça rodar de cansaço. Entrei pela sala de jantar e me detive alguns instantes ali. As lembranças nem sempre eram ruins, como por exemplo, a de minha mãe dando comida para Mateo, sentada sob o lustre que fora da mãe do Axel. Atravessei o hall com o assoalho de madeira e parei na entrada da enorme sala de estar. A lareira, alguns móveis e os quadros eram os mesmos de anos atrás, mas o sofá era novo, notei. A decoração no estilo hygge, estava em toda a casa, com exceção da cozinha, que parecia muito moderna, se comparada aos demais cômodos. As obras de arte, os tapetes, as lareiras, os abajures e suas luzes indiretas... Tudo remetia ao conforto, ao aconchego. Um acolhimento que limitava-se à decoração.

Subi a escada e segui o tapete que cobria o assoalho do corredor. Quando ainda estava abrindo a porta do meu antigo quarto, alguém apareceu por trás de mim.

— Erik!

Só tive tempo de me virar, então, recebi Sílvia nos braços. Ela pulou no meu pescoço, me deixando completamente constrangido, afinal, nunca tivemos esse tipo de intimidade.

Bellanne-se! - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora