O dia no colégio foi tenso, as meninas ainda me perseguiam e continuavam a pregar peças idiotas e sumir com meus materiais, porém, consegui sobreviver a mais um dia. Sem amigos, sem ninguém. Somente eu, e quem sabe, Deus.
Eu ainda tinha que voltar pra casa de minha tia e vestir o uniforme do trabalho.
Abri o portão e caminhei até a sala, quando reparei que tinha pisado em alguma merda de cachorro sem perceber e sujei metade da casa.
- Merda- disse baixinho.
- Que cheiro é... Argh, que nojo- disse Tasha fingindo ânsias de vômito
- Eu devo ter pisado em alguma merda por ai e nem percebi, vou la pegar um pano pra limpar.
Fui a lavanderia que ficava aos fundos da casa e, ao retornar, vejo que Alexia esta no telefone.
- Sim mãe... Não... Juro pra senhora, ela fez de proposito, xingou eu e a Tasha.... Sim, eu também não acreditei... Ela disse que ia sujar de raiva da gente
- Posso saber o que você esta falando de mim?? - eu queria socar a cara daquela garota.
- Eu vou ter que desligar aqui mãe, ela ta surtando, fica tranquila, a gente cuida disso- disse ela desligando o telefone e colocando ele na sua base com uma calma tão sínica quanto tudo que havia nela – Olha, não que a gente tenha algo contra você, mas digamos que, também não temos nada a favor.
- Sabe, quando a mãe disse que você viria morar com a gente e tudo mais, gostamos até, mas você esta roubando nosso espaço, você esta atrapalhando um ambiente familiar- completou Tasha.
- Sem falar no colégio, por que onde já se viu você ir falar que era nossa prima? Nós somos megas conhecidas e você... Bem, ninguém gosta de como se veste, de como se arruma ou de como faça qualquer outra coisa- disse Alexia rindo com cinismo junto com Tasha.
- Quer saber? - eu estava usando meu melhor sorriso irônico- quero que vocês se fodam.
Elas ficaram resmungando indignadas mas eu nem liguei, virei as costas, vesti meu uniforme e fui trabalhar.
Quando cheguei do trabalho a noite, estava meu tio e minha tia na cozinha, sentados sem conversar, agindo como se estivessem esperando algo. Dei boa noite e passei reto, mas, senti a mão da minha tia me puxando pelo pulso. Por impulso puxei meu braço com força para me soltar dela:
- Senta aqui que a gente precisa ter uma conversa mocinha- disse ela com arrogância
- Que história é essa de você ficar mandando as suas primas se foderem? É essa a educação que sua mãe te deu?- meu tio sabia me irritar.
- Eu tenho educação, mas só uso com quem merece. E minhas priminhas não passam de umas mimadas nojentas.
- Olha aqui, você tome muito cuidado com o que fala das minhas filhas sua ingrata. Você só esta aqui porque tenho consideração pela sua mãe. Eu não aguento mais você aqui, você não passa de uma má influência.
- Ingrata? A tia faça-me o favor de lavar essa boca pra falar de mim.
- Eu sinceramente pensei em falar umas poucas e boas, mas, eu não vou perder meu tempo com você. Cansei ta me entendendo? Cansei garota.
- Viu? Viu o estado em que você deixou sua tia? Vamos amor, você sabe que não pode se estressar- meu tio pegou minha tia pelos braços enquanto ela fingia que estava prestes a desmaiar e foi para o quarto.
Liguei para minha mãe e perguntei se ela estaria em casa, fazia mais de um mês que eu não via ela. Eram nove horas da noite mas eu nem liguei, só peguei algumas roupas e fui de ônibus pra casa dela.
Contei tudo a minha mãe e ela ficou igualmente revoltada, porém, pediu que relevasse e deixasse a poeira abaixar.
O dia seguinte amanheceu chuvoso, eu ainda tinha que ir para o colégio e havia esquecido o uniforme na casa da minha tia então teria que passar la.
Chegando na casa da minha tia ao pegar minha chave do cadeado vejo que ela não esta abrindo-o. A casa estava toda trancada e apesar de eu gritar o nome de minha tia ninguém saiu para o lado de fora.
Comecei a olhar em volta e notei um livro, muito familiar, ao lado de alguns sacos pretos na lixeira. Cheguei mais perto e reconheci que era o meu livro " O menino do pijama listrado", todo molhado por causa da chuva, abri um dos sacos de lixo e reconheci minhas roupas, no outro saco de lixo tinha mais livros e pertences pessoais.
Começo a bater freneticamente no portão, a porta da frente abre e sai minha tia com mais peças de roupa na mão, sem dizer nada ela caminha até o portão e joga todas as roupas por cima do portão, onde caíram no barro e em poças de lama. Ela se vira como se nada tivesse acontecido e vai em direção a porta de entrada novamente.
Eu não tinha reação, eu queria xingar ela mas precisava pegar minhas coisas antes que perdesse tudo para aquela chuva.
Peguei o que pude e andei algumas quadras até a casa de uma "amiga", era Iara, não era bem uma amiga de verdade, era só alguém com quem eu falava de vez em quando e sabia onde morava. Quando cheguei na casa dela, ela estava saindo para o colégio
- Meu Deus, o que você esta fazendo nessa chuva doida? E o que é essa tanto de coisa nas suas mãos?- disse ela apontando para os sacos de lixo na minha mão.
- São as minhas coisas, minha tia me expulsou da casa dela. Eu sei que é pedir muito mas eu posso deixar essas coisas aqui na sua casa? Só até a hora do almoço.
- Não, capaz, pode deixar sim.
Entramos e Iara deixou minhas coisas em seu quarto, não fui para o colégio, fiquei perambulando pelo bairro até dar a hora de ir trabalhar. O dia no trabalho foi péssimo como sempre, mas, suportável.
Liguei para minha mãe na hora do trabalho e conversei com meu chefe durante a noite. Tive de pedir as contas, pois não conseguiria continuar a trabalhar la devido a distância.
Voltei a morar com a minha mãe e apesar de eu não ter trabalhado registrado, meu chefe pagou todos os meus direitos, prometendo que me contrataria de novo caso eu precisasse um dia. Por mim, eu nunca mais voltava para la.
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Vivendo no escuro
Short StoryO que é a escuridão afinal? Como é viver sem nenhuma perspectiva de vida? Até que ponto alguém deve chegar para achar na morte a solução para algo? De que vale uma vida de sofrimento e ilusão? O livro aqui feito, com cada resquício de dores que já f...