Capitulo 7

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E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas.

Apocalipse 21.4

Quando abri os olhos estava em um quarto, usando um pijama de algodão, olhei para o relógio eram 4 da manhã. A ânsia de vômito havia voltado, havia um banheiro no quarto, vomitei novamente, eu ainda tremia, meu cérebro como que para me torturar trazia aquelas imagens , agora muito claras, inúmeras vezes.

Escovei os dentes e me deitei novamente, eu tremia, e meu estômago já doía devido as contrações, e minha garganta também,por ter vomitado repetidamente.

Escondi meu rosto no travesseiro e chorei ainda mais ,Shakespeare estava errado, chorar não diminuía a profundidade da minha dor. Nunca mais um homem me tocaria, eu queria ter filhos um dia, mas o preço para tê-los seria alto demais, talvez eu adotasse uma criança e seria uma mãe solteira super descolada.

Tudo em que pensava era no olhar sádico de William, no que ele fez e no prazer que ele teve com tudo isso.

Em algum momento depois de horas chorando e revivendo eu entrei em um estupor, não pensava em nada, olhei para o teto. Minha mãe entrou no quarto, não ouvi o que ela disse,nem olhei para ela, Helen e meu pai também vieram. Ignorei -os. Liza me visitou e conversou comigo por um longo tempo, como viu que eu não respondia , ficou apenas acariciando minha cabeça. A noite eu tinha pesadelos horríveis, durante o dia eu era uma casca vazia.

Em algum momento daquela semana Michael entrou em meu quarto e se sentou na poltrona azul perto da porta.

Michael

Eu não tinha notícias de Ana havia dias, em uma manhã encontrei Helen no hospital, ao fim do seu plantão e perguntei por ela.

- Oi Helen, como Ana está?

- Ela não está bem, não come, não bebe , não se comunica com ninguém, esta no mínimo 5 quilos mais magra. Beth me disse que a noite ela tem pesadelos horríveis, eles podem ouvir os gritos. Nada do que eu fiz essa semana a ajudou.

- Porque não me disse antes?

- O que você poderia fazer?

- Eu vou falar com ela

- Ela se lembrou Michael, ela está transtornada, não vai querer você lá, isso pode fazer mal ela.

- Não farei mal, eu não vou ver isso acontecer novamente.

- Como assim, novamente?

- Agora não Helen.

*******

Troquei de roupa e fui para o novo endereço dos Raen.

Elizabeth me recebeu, com o semblante cançado, seu desespero era grande, pois me deixou entrar sem objeções. Ela me guiou para o quarto de Ana, me sentei em uma poltrona e esperei.

Ela finalmente olhou para mim, estava magra, com os olhos opacos, tinha olheiras, o rosto estava manchado de lágrimas. Ela se encolheu na cama, estava apavorada.

- Não tenha medo ,não vim te fazer mal, quero conversar com você, Ana eu não posso ver você definhar.

- Porque você você importa? Porque está obcecado comigo? Qual o seu problema? Você tem fetiche por mulheres estupradas?
Eu quero mais é que tudo isso acabe

Ela me olhou com dureza, sua docilidade havia se perdido, eu o ofendi.

- Minha irma Laura, tinha 14 anos quando foi estuprada por um aluno do último ano em uma festa da escola.

Agora eu tinha toda a atenção dela, ele me encarou, e se sentou na cama.

- Ele a fotografou e mandou a foto para todo o colégio, ela não contou a ninguém da família que havia ido a festa, ou que tinha sido violentada. Minha mãe notou que ela estava distante, indiferente. Na época eu já estava na universidade, e era ex aluno da escola em que ela estudava. Numa manhã eu recebi uma foto da minha irmã de 14 anos nua, com a legenda:" a maior vadia de Hanover". Eu fui para casa imediatamente, ela estava em seu quarto, chorando com o celular na mão, havia fotos e inúmeras mensagens obscenas. Contei tudo aos meus pais, o estupro já havia ocorrido há  um mês. Levamos ela a médicos e psicólogos, ela não falava, nas sessões e em casa estava sempre muda, com cara de indiferença, mas ela chorava o tempo todo.

Suspirei para continuar, a essa altura minha voz estava embargada.

- 6 meses após o abuso ela se matou. Deixou uma carta dizendo que não suportava mais viver. Eu fui escola e espanquei o garoto até ele ficar desacordado, eu paguei dois meses de cadeia por asaltar um menor, depois ele foi julgado e condenado, o que é um milagre considerando o sistema de justiça.

Ana estava chorando, eu me levantei e peguei uma de suas mãos, ela não gritou, eu a abracei, ela ficou rígida no início mas depois cedeu,ela tremia muito ,ela chorou nos meus braços, encharcando minha camisa, mas eu não me importava, ela chorou por um longo tempo, eu apenas afagava seus cabelos que começaram a crescer em pequenos cachos.

- Ana não deixe William vencer, se você parar de se alimentar, de se divertir, se largar o seu curso, se você morrer, a vitória será dele. Minha irmã deixou o agressor vence-la , não faça o mesmo. O rapaz já saiu da prisão  e tem esposa e um filho. Minha irmã está morta.
Eu me tornei preocupadocom você  devido a experiência que mudou minha família para sempre.

Depois ela tirou o rosto do meu peito e olhou para mim com os olhos vermelhos e o rosto inchado.

- Obrigada por me contar Michael.

Ela se afastou bruscamente cortando nosso contato.

- Me desculpe, mas seu contato me incomoda, eu queria tentar o contato com um homem que não fosse meu pai, que fosse um amigo, mas não dá.

- Por isso está tremendo assim?

- Não sei...talvez....

- Me desculpe, te abracei por instinto. Eu precisava fazer isso .Ana, agora por favor coma e beba algo. Você vai ficar desidratada.

- Não tenho fome... mas eu vou tentar, vou na cozinha pedir algo a mamãe.

Ela se levantou mas estava fraca demais, coloquei a de volta na cama.

- Fique deitada, eu busco e trago aqui.

Encontrei beth na cozinha e disse:

-Ela quer comer.

Nunca vi um sorriso maior que o de beth naquele momento.

- O que você fez? Ninguém conseguiu a convencer antes.

- Te contarei em outra ocasião.

Beth preparou frutas picadas, leite, cookies de chocolate e fatias de bolo de cenoura. Levei a bandeja para Ana, ela não comeu tudo mas era um progresso.

Ela parecia cansada.

- Você parece estar exausta, quer algo para dormir?

- Sim por favor.

Ela dormiu como um anjo, eu a observei por horas, eu tinha finalmente esperanças de que as coisas poderiam mudar para melhor.

Renascida para o amor...Onde histórias criam vida. Descubra agora