O de Oceâno

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Maio de 2014: presente.

Abro os olhos e ao mesmo tempo levanto quase gritando. Minhas pupilas estão dilatadas e o coração acelerado.

Eu acabo de acordar de um pesadelo muito estranho.

Volto a deitar a cabeça no travesseiro e olho o teto, procurando acalmar meu coração.

Por incrível que pareça, não sonhava com Amie, mas sim com um grande oceano de águas escuras e pesadas.

Eu estava nadando no interior dele e era sujo, muito sujo, então eu colocava a cabeça pra fora d'água e algo começava a me puxar pra baixo, tentando me afogar.

E enquanto eu me afogava, escutava a voz da Susan dizendo-me várias vezes: "o anzol, Jimmy! Pegue o anzol!", mas de algum jeito eu nunca conseguia segurar o anzol (que misteriosamente aparecera dentro d'água), ele sempre acabava por escapar das minhas mãos.

E, obviamente, o estranho foi sonhar com a minha ex.

Ela foi minha primeira namorada. Depois da Amie, a de maior tempo de duração. Eu nem sei como foi que conseguimos essa proeza. Devíamos estar mesmo muito desesperados.

Faz tempo que não tenho notícias dela. Soube que deixou de ser gótica, mas ainda continua usando preto como a cor para todas as coisas.

Ela era uma garota complicada e, sinceramente, espero que esteja se entendendo melhor agora.

Susan sumia às vezes, o que fazia nosso relacionamento ser cheio de espaços em branco que nós nunca conseguimos preencher... Ela não tinha paciência comigo e eu não tinha paciência com ela, não nos entendíamos.

Hoje eu sei que namoramos porque estávamos tentando provar algo para nós mesmos. Ela, que gostava de homens e eu, que podia ser feliz com alguém. E é claro que ambos falhamos miseravelmente em nossas missões. 

Como é que eu, um garoto, lhe faria feliz? Não que tenha sido culpa dela, afinal, ela queria que eu fosse alguém que eu não era porque também tentava gostar de mim. Além de sua sexualidade e o meu coração parecer nadar em outros mares, nós não tínhamos nada forte, nenhum elo.

Susan e eu éramos a fórmula do fracasso, mas se eu pudesse apagá-la do meu passado, eu não o faria, pois ela me ensinou uma lição muito valiosa:

Se há dúvida, não há amor. Amor é certeza.

Mesmo que tenha afinidade, atração ou simpatia. Se não há amor, não haverá felicidade, pelo menos não em um relacionamento.

Não espere que com o tempo o amor venha para uma relação assim, pois ele não virá.

O amor é aquilo que vem depois da paixão e ele é tremenda e absurdamente óbvio. Fácil de perceber.

O amor nunca foi um bicho tímido, ele é gritante.

Julho de 2011: quarto ano da faculdade.

Susan me ligara na noite anterior e me pedira para encontrá-la na lanchonete da universidade no dia seguinte. Eu demorei um pouco pra chegar, mas ela não parecia brava comigo daquela vez.

Ela estava mais gótica do que nunca, com seus lábios pintados de preto, as sobrancelhas mais escuras e com os olhos delineados. Ironicamente, ela parecia em paz.

— Como foi o show ontem? — perguntei me sentando a mesa.

— A melhor noite da minha vida — respondeu sem emoção. — Precisamos conversar.

— Okay — falei pegando o cardápio. — Quer alguma coisa pra beber?

— Eu até quero, mas não vai pegar nada bem o meu ex-namorado pagar um suco de graviola pra mim.

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