W de Walkie-talkie

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Maio de 2014: presente.

Motivado — e assustado — pela ligação repentina, giro a maçaneta com a mão direita enquanto a esquerda segura o celular, que ainda está vibrando com o número dela.

Quando a porta abre, ela vira assustada, com olhos rápidos de quem está fazendo algo errado.

Então ela percebe que sou eu, desliga o celular, que cai no chão, devido à surpresa.

Ela está com um roupão branco, mas tem o cabelo arrumado e o rosto maquiado.

Ela está linda. Deslumbrante de linda.

Seus olhos estão lacrimejados e ela parece tensa, mas ao mesmo tempo, parece feliz em me ver.

Sua boca está meio aberta, provavelmente porque tem muitas coisas na sua cabeça, assim como na minha e ela está pensando, assim como eu, em como botar isso pra fora.

— Eu te amo — nós dizemos juntos, ao mesmo tempo.

E a gente diz porque não tem frase melhor para ser dita neste momento.

Ela vem até mim, eu vou até ela. Nos abraçamos, com força e urgência. Aos poucos vamos deslizando no abraço um do outro e, quando me dou conta, tem lágrimas saindo de nossos olhos.

Eu a seguro com força, como se tivesse achado algo que perdi há muito tempo...

Ela se agarra em mim, como se fosse incapaz de soltar, como se nunca tivesse soltado antes.

O cheiro dela parece estar preenchendo todo o vazio, todos os espaços em branco que eu adquiri nesse tempo.

Ela afasta seu tronco de mim e coloca as mãos no meu rosto. Ela sorri, ainda em meio as lágrimas que borraram toda a maquiagem de seu rosto.

— Eu pensei que nunca mais fosse te ver... — diz, me acariciando.

— Não deixaria isso acontecer, amor... — tiro suas mãos do meu rosto e as beijo com carinho — Eu senti tanto a tua falta...

Ela olha para a porta, ainda aberta, beija meu rosto e vai até ela para fechá-la. Ela tranca. Fica encostada ali, me olhando.

— Saudade é pouco para o que eu senti... — passa a mão no rosto, para se limpar — Eu devo estar horrível! — ri, devagar.

E eu sorrio, sorrio como um bobo porque a risada dela me faz muito bem.

— Você está radiante... — me aproximo com um lenço que peguei da penteadeira e limpo seu rosto — Você está sempre radiante... — beijo sua testa e paro em frente ao seus lábios — Eu te amo, okay?

— Eu te amo mais, meu pequeno cineasta... — sela meus lábios.

E então nós sorrimos, também ao mesmo tempo.

Eu acho que vou desmaiar. Ainda não acredito que estou aqui, em sua presença depois de tanto tempo. 

Sento no chão, sem tirar os olhos  dos dela. Minhas pernas estão levemente bambas.

— Já parou pra pensar como nos parecemos com walkie-talkies? — falo e ela ri.

— Como assim?

— Em todos esses anos, de 2008 até agora... Seis anos, Amie! Nossa ligação nunca terminou, foi sempre eu e você. Continuamos interligados mesmo estando do outro lado do país.

— É... Cê nunca saiu de mim, mesmo saindo de fato.

— Estamos interligados, meu bem... — encosto a cabeça na parede — Não tem botão de desligar.

— Eu não quero que tenha.

Isso quer dizer que ela quer ficar comigo pra sempre?

Ela vai até o filtro e enche um copo com água.

— Como vai tua ansiedade? — pergunta-me.

— Já estive pior. O caminho até aqui foi... Uau!

— Bebe um pouco, okay? Vai te acalmar.

Ela agacha na minha frente e me entrega o copo. Eu o pego com uma mão e com a outra a puxo para o meu lado. Ela segura minha mão e a beija, devagar, enquanto eu bebo o conteúdo do copo rapidamente.

— Por que me ligou, Amie? — pergunto após acabar de beber.

— Pelo mesmo motivo de você ter vindo aqui.

Pego seu rosto, selo seus lábios mais uma vez.

— Me diz uma coisa... — falo. — O que estava sentindo quando me ligou? Você parecia tensa quando entrei.

— Eu estava apavorada! Na verdade, acho que ainda estou. Qual é? Estou prestes a me casar com alguém que... — uma lágrima desce de seus olhos, mas ela limpa no mesmo instante. — Eu não sei, Jimmy... Eu precisava ouvir sua voz, precisava sentir que você não me odiava...

— Por que odiaria você? — a olho confuso, aquilo não fazia sentido.

— Eu estou me casando com outro. Eu te convidei para o meu casamento com outro. Fiquei com medo de que você não entendesse meus motivos para isso, pra falar a verdade, até agora pouco eu achava que você não tinha entendido.

— Como assim?

— Eu te convidei porque queria que você me ligasse... Queria que você falasse comigo te explicar tudo. Pra te explicar porque estou fazendo isso comigo.

— Eu nem pensei em ligar... Sei lá, no começo eu fiquei muito mal porque pensei que você tinha me esquecido de vez. — ela faz que não com a cabeça, como uma criança — Mas depois... Depois eu pensei muito na gente, em tudo que a gente viveu e pensei que não tinha como você simplesmente me esquecer assim.

— Foi tentando te esquecer que eu me emaranhei nisso tudo... — coloca a mão sobre os olhos — O que é que eu tô fazendo da minha vida?

— Ei... — a abraço — Não se preocupe com isso, estamos juntos agora. E o agora...

— É o único momento em que se pode fazer alguma coisa.

Sorrimos, apaixonados.

— Como veio da Califórnia para Chigado tão rápido? Uma viagem de ônibus daria, sei lá, você nem estaria aqui ainda.

— Avião, querida.

Ela me olha, surpresa.

— Você enfrentou teu medo... Ai, meu Deus! Jimmy, estou tão orgulhosa... — me abraça mais forte, daquele jeito que abraçava quando estava feliz por mim.

— Eu mereço um beijo, você não acha?

— Você não mudou nada, Pages... — fala, subindo no meu colo.

— Pelo jeito você também não, Jhornes... — sorrio, deitando no chão com ela em cima de mim.

— Não sorria assim... — fala, em um tom doce, enquanto passa os dedos por meus lábios.

— Não fale assim... Agora você é uma mulher comprometida, não posso te beijar.

— Não? — segura meu rosto, risonha — E o que foram aquelas duas vezes ali atrás, han?

— Beijo de amigo! — empino o nariz.

— Ah, claro!

— Ei... — falo colocando a mão em seu quadril. — O que está usando debaixo desse roupão?

— Quer descobrir? — sorri.

— Amie! — olho para os lados — Okay, eu quero...

Ela ri e selamos os lábios mais uma vez, mas quando ela vai se afastar, eu junto nossos lábios de novo. E de novo. E de novo. 

Ah... 

Ela deita do meu lado no chão e me olha.

— Queria poder ficar assim com você pelo resto da vida.

— Eu não quero nunca mais te soltar... — passo os dedos por sua franja.

— Eu nunca fiquei tão feliz em ver teu rosto, mas... — passa os dedos no meu cabelo — Por que você veio, Jimmy?

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