Capítulo treze

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O ar estava contaminado com algo que eu não sabia ao certo definir

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O ar estava contaminado com algo que eu não sabia ao certo definir. O ringue era um lugar mágico para o qual todos os olhares se estreitavam. Mesmo que estivessem conversando, pupilas se dilatavam diante do feitiço acontecendo ali, mãos se excitavam apontando para o que os olhos achavam mais interessante, vozes queriam ter suas partes favoritas narradas em alto e bom tom. A competição era incessante, dentro e fora do octógono improvisado.

Mas não era apenas esse sentimento que contaminava o ar.

Era roubar um olhar da entrada do porão, toda vez que alguém novo descia as escadas. Era vigiar o vizinho, procurando sinais de que ele não pertencia àquele lugar. Era o queixo inclinado dos homens e das mulheres que se julgavam especiais, superiores ao resto do mundo, por estarem naquele lugar secreto, guardado por um segurança mal-encarado.

Era a efemeridade do momento, da possibilidade de tudo acabar, de dinheiros de apostas serem perdidos e amanhã as pessoas terem de voltar ao trabalho com uma história a menos para contar. Era o descaso de todos eles pela médica com jaqueta emprestada e cabelo escondido pelo boné de academia, que criava sombra sobre seu rosto, e cujo trabalho se resumia a perguntar se os lutadores tinham alguma dor ou se estavam tomando algum remédio (enquanto tentava se lembrar das aulas de Farmacologia) para desvendar as consequências das interações medicamentosas (não que os lutadores confessassem terem tomado remédios).

Cada homem e mulher com inúmeros quilos de músculos hipertrofiados negavam prontamente a pergunta, arqueando sobrancelhas ultrajadas diante das minhas palavras. Só podia ser um espelho da expressão em meu rosto, indignada ao pensar que eles realmente achavam que eu era burra assim.

"Faça vista grossa", disse Silas, "se não fosse pela minha Tigresa, você nem estaria aqui. Ninguém esperava uma consulta médica antes da luta. Não é assim que as coisas funcionam".

Não precisava dizer duas vezes que eu era a peça solta do maquinário em pleno vapor no porão. Pessoas se aglomeravam empurrando minha mesa para trás para se aproximarem da grade. Quando lutadores caíam, era o juiz (ou árbitro?) que verificava a intensidade dos ferimentos e ordenava que continuassem a luta ou não - até Silas interferir e lembrar a todos de que eu estava ali.

Na terceira vez em que isso ocorreu, o homem de calça social apartando os homens no ringue mandou que eu me fizesse útil e ficasse na grade, pronta para qualquer emergência, porque era para isso que ele estava me pagando.

Naquela altura, eu estava a dois gritos de mandar todo mundo à merda e voltar para casa. Um detalhe quase sem importância era... eu não queria ir para casa. O que havia no ar era a promessa de algo interessante, ilegal e que renderia boas histórias depois. Eu já estava me sentindo bastante segura e irreconhecível com minhas roupas emprestadas para abrir a boca e responder que ninguém estava me pagando, mas falando no assunto...

- Faça o que o cara pediu - disse Silas com uma urgência atípica que não lhe caía bem, assim como minhas meias verdes não combinavam com os tênis rosa. Os dois coexistiam, mas o mundo seria mais harmonioso se não ocupassem o mesmo espaço. - Ele é o chefe e está disposto a te pagar, eu acho. Então traz sua bolsa pra cá.

Salvando MarianaOnde histórias criam vida. Descubra agora