♪Compasso

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"Quando você toca, quem escuta nunca esquece."

— Robert Schumann


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Acordei de madrugada, sem sono para voltar a dormir. Algo martelava em minha mente, porém não tinha ideia do que poderia ser.

Levantei-me e fui até a cozinha, coloquei água para ferver e demorei-me para decidir se tomaria chá ou café. Optei pela segunda opção, não conseguiria dormir mesmo então era melhor acordar logo de uma vez.

Como sempre, meu café estava amargo demais e faltava açúcar. Era bebível, mas estava longe de ser saboroso. E toda vez que engolia uma quantia do líquido fazia uma careta. O lado positivo era que o gosto horrível me fizera despertar em um passe de mágica.

Soltei o ar lentamente e andei até o banheiro, meu estado físico não estava dos melhores. Meu cabelo estava armado como se tivesse caído um raio em mim, e o castanho-escuro mais parecia um carvão queimado. Ridículo.

Tirei minhas roupas e entrei no chuveiro, precisava dar um jeito em minha aparência. Pois pelo que eu saiba, nenhuma loja aceita a entrada de zumbis, isso afastaria os clientes.

De banho tomado e com uma toalha presa em meu torso e outra em cima de minha cabeça encarei meu armário, como se uma voz do além fosse me ajudar a decidir que roupa vestiria hoje.

Observei todas as gavetas e cabides, mas nada me parecia adequado. O que é um pouco difícil de acontecer já que meu estilo era bem diversificado. De um lado havia trajes vitorianos, de outro, vestidos de baile e outro o básico: calça jeans e camisetas lisas de cores variadas. Não era um guarda-roupa muito comum, diga-se de passagem.

Meu olhar acabou recaindo sob uma caixinha perto da cômoda. Ela guardava meu último colar, o único que não havia vendido ainda. Não tinha costume de usá-lo, apenas em apresentações ou testes muito importantes. Aquele pequeno pingente de cristal me tranquilizava e carregava muitas lembranças, tanto boas quanto ruins. Meu pequeno tesouro.

Deixei a caixinha lá, intacta e voltei a encarar minhas roupas. Até que finalmente me decidi, depois de uma boa meia hora cogitando várias opções. Escolhi um vestido verde-água, um cinto e uma sapatilha da mesma cor. Era raro que escolhesse esse tipo de roupa para ir ao Conservatório, normalmente usava o básico, não era preciso ir toda arrumada para ter aulas com um professor-demônio ou para aprender sobre as dissonâncias.

Ainda faltava muito tempo para as aulas começarem, então sentei-me diante o piano e involuntariamente comecei a tocar Rondo Capriccioso. Fazia um tempo desde que ouvia ou tocava esta peça de Saint-Saens e confesso, sentia falta. Não era a minha favorita, jamais chegaria perto de meu amor por Tchaikovsky, mas estava entre as quinze prediletas.

As notas fluíam como sempre, meus dedos já sabiam para onde ir antes mesmo de minha mente raciocinasse o que estava acontecendo.

Acabei lembrando-me do violinista misterioso enquanto tocava. Quanto mais tempo passava sem descobrir sua identidade, mais frustrada ficava. Não gostava de ficar na curiosidade por tanto tempo assim. Queria respostas, e logo.


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O horário passou sem que notasse e quando percebi já estava atrasada e tive que correr para não perder a aula de teoria musical.

Por sorte a professora não havia chegado, e os alunos conversavam animadamente sobre assuntos banais não muito interessantes.

Mozart Terminou ComigoOnde histórias criam vida. Descubra agora