Hefesto, o deus do trabalho

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     Vivi no Monte Olimpo por quase um milênio, acreditando que os deuses Olimpianos eram os únicos que existiam, e só precisei de um dia para descobrir que há divindades além das que conheço.

     Se Ganesha realmente for o autor desta carta, tudo o que eu acredito pode estar errado!

     Passei horas daquele mesmo dia em frente à janela, observando as nuvens e pensando em como Atena poderia ter mentido para mim. Ela me criou desde bebê, me ensinou sobre muita coisa, tive a melhor educação de todo o Olimpo! Como poderia me esconder a existência de um deus indiano?

     Os únicos deuses em que deve acreditar, são os gregos. –Ela dizia.

     Talvez o homem elefante fosse uma divindade odiada pelos Olimpianos, assim como Hades que residia o submundo.

     -Encontrarei respostas. –Disse a mim mesma.

     Minha viagem à Índia tinha sido divertida por um lado, mas me fez indagar ainda mais sobre os mortais. Não era a primeira vez que os via de perto, houve um tempo atrás na qual visitei o magnífico templo de Atenas, pude encontrar as sacerdotisas de minha mãe. Eram belas, decentes e disciplinadas. Mas em Madras, haviam homens –Os quais eu nunca tinha conhecido.

     Calcorreei até o grande salão, afim de distrair a cabeça, talvez um pouco de ambrósia me fizesse bem.

     -Lana, aí está você! –Uma voz familiar vociferou, ecoando do centro.

     A mesa estava rodeada por deuses, ou melhor, Hefesto estava.

     -Hefesto! –Exclamei, no momento em que corria até ele.

     Hefesto raramente estava no palácio, ele se ocupava demais com a construção do Novo Monte Olimpo e com a produção de armas para os deuses. Sua morada era em um vulcão na ilha Lipari, e sempre que nos visitava, costumava trazer seus novos armamentos. Ele foi o responsável por criar o tridente de Poseidon, o raio-mestre de Zeus e o garfo de Hades. O deus do trabalho era como um pai para mim.

     -O que trouxe desta vez? –Perguntei, animada.

     -O mesmo de sempre. –Respondeu sorridente, com sua voz fraca. –Armas!

     -Alguma diferente?

     -Ele trouxe o meu novo arco! –Exclamou Eros ao lado dele, exibindo seu branco arco recurvo e batendo levemente as asas, como ele sempre fazia estando alegre.

     -Eu não só trouxe o teu arco, como também trouxe um projeto. –Hefesto tirou de seu grosso saco bege um papel enrolado e o abriu na mesa. Nele havia o esboço de uma espada que mais se parecia com uma lança. –É uma nova criação, ainda não arranjei um nome para ela.

     -O que ela faz? –Indaguei.

     -Ela poderá ser usada como uma lança... –Seu dedo traçou sobre a ponta afiada da arma. –E também como uma espada! Sua funcionalidade é bem simples, os gumes da espada ficam guardados dentro da lança e podem ser ativados assim que o deus proprietário ordenar. Ela será capaz de cortar o vento e até mesmo penetrar em uma rocha.

     Essa arma deve ter sido planejada para Atena, ela é a única deusa do Olimpo que usa lanças para guerrear.

     -Lana, preciso que me acompanhe até a ventana, para conversarmos a sós. –Ele continuou, mancando até ela.

     Hefesto mancava devido os maus tratos que sofria na infância, de sua mãe Hera. Ela esperava por um filho perfeito em sua gestação, já que era o primogênito de seu casamento com Zeus. Mas devido à sua pouca beleza, Hera o jogou da janela de seu aposento assim que nasceu, por vergonha. Ele então caiu no mar, sobrevivendo, mas ficou deficiente graças a queda.

     -Sobre o que precisamos conversar? –Perguntei, assim que já estávamos em frente à imensa ventana.

     -Você sabe que sua mãe não pode te prender aqui.

     -Ela não está me prendendo aqui, só está me preparando para ser uma grande deusa. –Atena dizia que a melhor maneira de ser uma deusa vigorosa, era ficar no palácio e adquirir conhecimento. No entanto, aquilo não parecia mais ser verdade, não depois de conhecer Ganesha.

     -Sim, ela está. E um dia, você precisará saber lutar, terá que deixar a sua delicadeza de lado.

     -O que quer dizer com isso?

     -A lança na qual estou projetando, é especialmente para você...

     Por algum tempo, permaneci estática, sem palavras.

     Não pode ser verdade!

     -Essa arma não pode ser minha! Eu não sei nem ao menos usar uma...

     -Você passou tempo demais isolada neste lugar, adquirindo conhecimentos nas quais são inúteis. Uma nova era está chegando e você precisa saber gladiar.

     -E o que seria essa nova era?

     -Em breve, muitas coisas irão mudar, principalmente a sua maneira de ver o mundo.

     -Isso tem a ver com este outro deus?

     -Que outro deus?

     -O deus hindu, Ganesha!

     -Você esteve na Índia?

     -Estive. –Confessei, Hefesto jamais contaria a alguém.

     -O conheceu? –Ele coçou sua barba negra.

     -Não, mas encontrei uma carta em minha cama assim que retornei. Nela, ele agradecia a minha visita em Madras, com a sua assinatura em baixo.

     Hefesto me olhou direto, como se alegasse que a carta verdadeiramente pertencia a Ganesha.

     -Então, ele realmente existe?

     -Sim! Fico estupefato por descobrir isso somente agora.

     Me virei para observar os deuses que permaneciam na mesa, conversando, bebendo e comendo.

     -Todos aqui sabem disso?

     -Sim, mas há uma longa história do porque não te contaram sobre ele, não quero que saiba por mim.

     -Consigo permanecer ainda mais confusa. –Bufei.

     -Definitivamente, você não é uma deusa comum.

     -Disso estou cansada de saber...

     Um alto som de passos soou pela escada, devia ser Atena.

     -Preciso ir! –Ele exclamou. –Voltarei em dois dias, com a sua nova lança.

     -Certo. –Assenti, talvez Hefesto estivesse certo sobre aprender a lutar.

     O deus do trabalho apanhou seu saco da mesa e desceu as escadas do palácio. Senti um leve frio na barriga.

     -Lana?! –A deusa da sabedoria clamou.

A deusa do nadaOnde histórias criam vida. Descubra agora