A Fuga

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Acacia's POV:

Sabe aqueles momentos em que você só não aguenta mais? Quando a única saída é fugir? Isso era tudo o que eu pensava. Não conseguia mas surportar as brigas, os gritos. Eu não tinha ninguém, não conhecia nada além desse universo doloroso da ignorância por parte dos meus pais, e da minha irmã ausente quase todo tempo, em que eu vivia. Esta última noite foi a gota d'água.

Estávamos na cozinha, eu e meus pais e finalmente minha irmã havia aparecido após quatro dias longe. Sim, você tem 18 anos, mas pelo menos mande uma mensagem!

- Você é uma incompetente, descarada! - Minha mãe arfou sem folêgo pela briga que já tinha se estendia há 2 horas. - Como pôde fazer uma coisa dessas?!

Minha irmã me olhou como quem diz: É sério isso?

- Eu não aguento mais isso. Você está proibida de sair de casa pelos próximos três anos! - Conhecendo minha mãe, acharia que ela estava blefando, mas o olhar nós olhos dela mostrava que ela não estava brincando.

- Mãe, eu tenho 18 anos! Sou adulta! - Sabrina disse.

- Então aja como tal! - Minha mãe, então, olhou para mim. - Você, como você ficou quieta; sabia de algo não é mesmo?

- Como eu poderia saber de algo, eu não saio dessa casa nunca! Apenas para a escola! A sabrina mal fala comigo, mesmo que quisesse, eu não saberia onde ela estava...

- Ah, sem desculpas! - Minha mãe disse com deboche. - Você é tão ruim quanto a sua irmã, você tinha um caminho perfeito à sua frente, você desperdiçou tudo com essa... falsa depressão. Você só é tão imprestável quanto a Sabrina.

Eu tinha aberto buraco nas palmas das minhas mão, de tanto cravar as unhas nelas. Mas naquele momento eu não sentia nada.

- Fica quieta... - Eu murmurei.

- Como é que é? O que você disse? - Meu pai falou afinal.

- Fiquem quietos. - Falei claro dessa vez. Meus olhos ainda encaravam o chão, mas mantive a pose.

Senti uma dor forte no lado esquerdo do meu rosto. Ardia. Meu pai havia me dado um tapa. Até então, eles só me faziam mal verbalmente, mas agora tinham se voltado para a violência física, eu sabia que só pioraria.

Permaneci parada no mesmo local, olhando para ele, esperando algo, qualquer coisa que me dissesse que ele tinha se arrependido. Mas... nada, nem uma reação.

- Você é quem fica calada nessa casa, nem mais um pio, ou será pior. - Ele disse friamente.

Olhei esperançosa para Sabrina, esperei que ela dissesse algo. Mas ela ficou tão dura quanto uma parede de concreto. Eu corri para meu quarto e bati a porta atrás de mim.





Eu peguei um par de roupas, escova de dentes, comida - que havia escondido em meu armário para os momentos enquanto meus pais estavam surtados e me proibiam de descer para cozinha. Fui para o quarto da minha irmã, que ainda estava na sala brigando com os dois, cuidadosamente e peguei um pouco do dinheiro que ela tinha roubado de uma loja há algumas semanas - Okay, talvez eu soubesse de algo - e, por fim, esperei até que todos dormissem.

Desci as escadas velhas da casa, segurando a respiração com o medo e nervosismo. Me senti dentro de um filme. Estava perto, tão perto até que escutei um alto limpar de garganta, e parei instantaneamente. Virei vagarosamente para trás, coração batendo tão alto que dava pra ouvir e vi minha mãe me olhando com aqueles olhos ameaçadores. Droga. Por favor planejem um bom funeral para mim.

- Você tem muito nervo! - Ela segurou o meu pulso com tanta força, que achei que fosse quebrar.

Ela me arrastou - literalmente - até as escadas, eu esperneava e gritava por ajuda, mas ninguém parecia ouvir. Eu estava sem folêgo, quase como se estivesse sufocando, até que percebi que as mãos dela estava envolta da minha garganta. Quem diria? A querida Sra. Davis, a vizinha perfeita, a amiga perfeita, .... a mãe perfeita.... estava matando a própria filha. Eu senti o ar ficar seco envolta de mim, o som do sangue lutando para correr até meu cérebro, buscando oxigênio, desesperadamente tentando me manter viva. Era tarde demais, a sala havia ficado ainda mais escura do que parecia ser possível, meus membros pareciam ter desistido...

Eu, então, senti algo muito estranho: Uma sensação de força, maior do que jamais havia sentido, e por fim, uma luz, tão clara e forte que me fez sentir como se estivesse na frente de um holofote. Quando me dei conta, minha mãe estava desacordada e eu de pé, como se nada houvesse acontecido. Eu não esperei por uma explicação, e corri porta afora sem parar até chegar em um ponto seguro a quilômetros de distância daquela casa.


Com o dinheiro que havia juntado tinha em torno de R$ 700,00. Foi suficiente para comprar uma passagem só de ida para Nova York, e sobrar um pouco para uma emergência. Logo estaria longe de Dallas, Texas, e em Manhattan.

Meses depois...

Depois de muito trabalho, consegui alugar um apartamento simples, de um quarto apenas. Era horrível, mas era melhor do que viver na rua pedindo esmola. Dessa forma eu pelo menos me sentia dona de mim mesma, apesar de que não ia à escola há, provavelmente, 4 meses.

Estava voltando para casa, após um dia comum no trabalho, porém dessa vez decidi seguir um caminho diferente, pegar um atalho para chegar mais cedo em casa. Passei pela Avenida Madison, e fui em direção a leste. A rua estava silenciosa, não era perigoso mas me deu um pouco de ansiedade - não estava com um pressentimento bom. Senti como se alguém me seguisse, olhei para trás mas não havia ninguém. Continuei andando, um pouco mais calma dessa vez, até que, ouvi um som estranho - parecia algo se arrastando - parei e me mantive quieta, o som parecia estar mais perto, era como o silvo de uma cobra. Andei incrivelmente rápido, praticamente correndo e só parei quando achei um beco próximo, me encostando em uma das paredes pixadas de um prédio.

Quando a rua voltou a ficar silenciosa, coloquei a cabeça para fora, e pude ver que não havia mais nada. Provavelmente foi a minha imaginação... só a minha imaginação... Conclui que era seguro sair, e então continuei meu caminho, porém ao botar um pé para fora do beco

Plaft!

Fui jogada no chão com força por alguma coisa muito forte. Eu senti minha cabeça latejar, mas consegui abrir os olhos um pouco, e quando vi tinha um...um... uma pessoa muito distorcida pela queda, pois o que estava vendo era... impossível ser real. Até que veio avançando em minha direção e pude ver melhor: Um homem. Tinha uma face aterrorizante, com presas em cima e em baixo, tão grandes que quase tocavam o próprio peito.

O ser demonico, voltou a me atacar, me jogando novamente no concreto sujo, na qual tinha tido muita dificuldade para me levantar. Ele abriu a mandíbula, que se dividiu em quatro lados diferentes, pude sentir o hálito quente e podre dele, enquanto lutava para tirá-lo de cima de mim. Eu senti suas presas cravarem em minha clavícula, o sangue quente escorrendo pelo meu lado esquerdo. Não sei como, mas consegui chutá-lo para o lado e me levantei rápido, ignorando a dor agonizante um meu ombro, quando então ouvi alguém gritar:

- Abaixa!

Com isso, eu vi uma mulher - que estava meio embaçada na verdade - dar um mortal por cima de mim e cair em minha frente com as costas viradas para mim. Ela virou para mim e sorriu, novamente se voltando para o monstro. O bracelete de cobra cor de prata que estava em seu antebraço, começou a se mexer e transformou-se em um chicote e, em vários riscos prateados, eu vi o homem/ demônio ter seu pescoço enrolado pela fina cobra brilhante, e ser arrastado até a mulher misteriosa. Um grito estridente, não humano, ecoou pelo beco e o ser se desfez.

- Esse foi fácil! - A garota disse para si mesma.

Ela tinha longos e sedosos cabelos negros e pele cor de caramelo, com olhos cor de café.

- Fácil... - Eu repeti perplexa.

- Ah, não! Ele te feriu.

Eu olhei para a ferida em meu ombro, eu tinha me esquecido dela, todavia logo fui lembrada, pois tudo ficou ainda mais embaçado e eu senti meu corpo inteiro ficar dormente, e de repente o concreto não doeu tanto.

Where Do They All belongOnde histórias criam vida. Descubra agora