Capítulo 7

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Nas semanas que se passaram, todo o dia durante três, às vezes quatro horas, Sãr Lonios treinava Nimbus no uso da espada. O garoto se mostrou um bom aluno e progredia a cada treino chegando, ocasionalmente, a conseguir resistir a três movimentos do seu mestre antes de ser considerado perdedor da rodada.

De acordo com Lonios, eles estavam bem no centro do continente e, misteriosamente, o cavaleiro deixava de rumar pela estrada principal, optando por vários pequenos atalhos, todos pequenas trilhas. À noite a fogueira era velada e escondida entre os arbustos, outro ato suspeito. O cavaleiro sempre viajava com um capuz, mesmo sob o sol forte, coisa que ele nunca costumava fazer, e fazia questão de não falar muito com agricultores que cruzavam o caminho dos dois, à beira da estrada. Lonios aparentou preocupação ao notar que um homem estava se aproximando. Ele vinha muito rápido e cruzou com os dois, parecia com pressa, mas parou quando pareceu reconhecer Lonios.

— O senhor não é Lonios, o andarilho?

— Depende de quem quer saber.

— Sou somente um mensageiro de Calamidade, o senhor conhece?

— Faz muitos anos que eu não passo por lá, mas já frequentei antigamente.

— O senhor é famoso por lá, sabia?

Depois disso o mensageiro riu e partiu à galope, desaparecendo na estrada. Logo após esse encontro, Lonios mudou de trilha, pegando vários caminhos alternativos, até que resolveu parar para montar acampamento, mas desta vez ele ordenou que Nimbus não montasse a barraca, essa noite eles teriam como teto apenas as estrelas e o cavaleiro iria ensinar um pouco sobre elas e como se orientar baseando-se na sua posição.

Outros dias se passaram e o garoto esqueceu do ocorrido e começou a prestar mais atenção na espada que Sãr Lonios carregava na cintura, a arma que estava sempre envolta em faixas brancas encardidas.

Lonios nunca a desembainhava, ignorando as instruções que tinha dado para Nimbus limpar e cuidar diariamente das armas para evitar a ferrugem. Apesar disso, naquele dia Nimbus havia analisado cuidadosamente o seu cabo, ele era de um metal escarlate, com o desenho de uma cabeça de lagarto entalhada no final, o garoto havia interpretado que seria um dragão, mas quando perguntou, Lonios apenas expressou um sorriso.

— Sabe Nimbus eu admiro essa sua força de vontade, ficar semanas sem me perguntar sobre o segredo dessa espada, o porquê dela estar sempre enfaixada, acredite, eu estava esperando você fazer isso, mas antes eu preciso lhe contar uma história:

"Há muito tempo atrás, em Victórius a capital da Liberdade, existia uma família de ferreiros, eles eram bons mas não eram famosos, apenas exerciam o seu ofício, sobrevivendo com o pouco que ganhavam. Um dia o seu filho mais novo que era muito curioso, e gostava de viajar quilômetros nessas suas explorações e, naquela época, a Victórius era um continente infestado de seres semelhantes a lagartos, mas com asas e extremamente agressivos e que, ainda por cima, cuspiam fogo pelas ventas, eles eram considerados uma praga, destruíam plantações, rebanhos e até vilas inteiras, eles eram os dragões. Esse garoto curioso um dia avistou um dragão que não era muito maior do que um cachorro, entretanto esse encontro foi quase mortal para ele, felizmente alguns fazendeiros que estavam habituados a caçar essa espécie salvaram esse menino pouco antes deste ser cremado vivo pela fera.

Mas, para a sua surpresa, nas imediações ele encontrou o ninho desse monstro, e nele havia um ovo. Sem hesitar e movido pela sua imensa curiosidade, ele levou o ovo para casa. Como era de se esperar, um dragão nasceu desse ovo, ele, ainda movido pela curiosidade, resolveu poupar a vida do filhote e o criar como um animal de estimação, e ele se tornou o seu melhor amigo.

Para a sua surpresa o dragão não se mostrou feroz contra ele, o adotou como a um pai, já que o garoto o alimentava e cuidava dele em segredo da sua família, com o passar dos meses o monstro foi ficando maior e mais feroz, entretanto ele não feria o menino. O garoto curioso notou que o dragão também era muito inteligente, muito mais do que um cachorro e ainda mais leal, então ele ensinou truques para a fera e o domou completamente. Com o passar de mais alguns meses não foi mais possível manter segredo sobre o jovem dragão e eventualmente a sua família o descobriu, e depois o povo da cidade, e por fim todo o continente. Primeiramente todos queriam eliminar a fera, mas o garoto mostrou que tinha total controle sobre ele. Então o garoto ficou famoso, e os negócios como ferreiros, da sua família começaram a ser cada vez mais requisitados, principalmente quando o garoto assumiu a função de ferreiro e jurava que forjava armas e espadas a partir do fogo do seu pequeno dragão.

Todos queriam uma arma forjada pelo fogo do dragão do garoto, e sua família começou a ficar cada vez mais rica e, com a fama e o dinheiro, a família foi ficando cada vez mais poderosa, seus filhos se tornaram cavaleiros, eles ganharam um castelo e se tornaram lordes daquela região, e foram em busca de ovos de espécies de dragões cada vez maiores, e os domesticaram usando o mesmo método do menino curioso. Depois de algum tempo após décadas de pesquisas e investindo muito do seu dinheiro, a família criou um novo tipo de aço, mais forte, mais leve, que poderia absorver impactos muito poderosos sem se quebrar, com ele poderiam se criar armas que nunca ficariam cegas e escudos que nunca seriam destruídos. Eles criaram o Aço Diamante. Com esse aço eles ficaram famosos em todo o mundo, todos queriam uma arma ou um escudo quase indestrutível feito de Aço Diamante. Mas com o passar das eras, o temperamento dessa família mudou, antes humildes, eles se tornaram cada vez mais arrogantes. Todos disseram que seu temperamento, assim como o Aço Diamante, foi forjado pelo fogo dos dragões.

— Nimbus você é como o aço, o conhecimento que estou te passando é como o pó de diamante que se junta a esse aço, o seu treinamento é como fogo dos dragões, e eu sou como o ferreiro que irá te martelar e moldar até você se tornar como essa Espada Escarlate feita de Aço Diamante. — Lonios desembainhou a sua espada e segurou com as duas mãos em direção a Nimbus para ele pegá-la.

Nimbus notou que a espada toda tinha uma coloração escarlate e não pôde deixar de lembrar das histórias que ouvira sobre seu pai que, antes de ele ir ao combate contra o monstro do éter, havia sacado uma arma que parecia ter uma lâmina vermelha. Seria ela de Aço Diamante também? Enfim, ele esticou a mão esperando segurar uma arma pesada e letal, entretanto quando pegou a espada e a ergueu no ar, notou que ela não era pesada, mas leve e elegante, tinha a lâmina muito mais fina que uma espada comum, tão fina como uma folha de papel, e era pelo menos três vezes mais leve do que uma espada normal. Ele a girou no ar com muita facilidade, apesar da arma ser feita para ser segurada com as duas mãos, ele a manipulava com desenvoltura com apenas uma.

— Esta é a Indolente, uma espada de Aço Diamante, ela pertenceu ao meu pai e ao pai do meu pai, e a muitos ancestrais da minha família antes deles, ela nunca foi afiada, somente no dia em que foi construída. Ela é tão forte que pode abrir escudos ao meio e cortar a lâmina de outras espadas.

Nimbus olhou para a arma e para Lonios com os olhos arregalados, visivelmente assustado. Como um cavaleiro andarilho sem posses, tinha uma arma dessas? Notando a expressão de espanto do garoto, Lonios o tranquilizou.

— Calma Nimbus, quando chegar a hora você vai saber de tudo, por enquanto vamos nos dedicar ao seu treinamento.

Quase no mesmo instante Lonios faz um sinal para Nimbus ficar quieto.

— Acho que vem alguém aí, você sabe o que fazer.

Correndo, o garoto começou a reunir as coisas dos dois e levar para onde os cavalos estavam, atrás de algumas árvores ali ao lado. Ele encilhou os animais e estava quase pronto para os levar até Lonios quando um bando chegou ao acampamento a galope e parou os animais abruptamente. Por sorte ele não foi visto porque estava atrás daqueles arbustos. Mas ele conseguia visualizar por entre a vegetação os cavaleiros inquietos.

— Ora, ora se não é o famoso Cavaleiro andarilho Lonios. Você não imagina como foi difícil o encontrar — falou uma garota ruiva de cabelos esvoaçantes e encaracolados, que trajava uma capa e sob ela vestia apenas um colam de couro e várias espadas e facas fixadas em todas as partes do corpo.

Lonios apenas sorriu.

— Bem, cavaleiro, eu sou Violentina, viemos cobrar o que você deve para o senhor Wynrid — a moça explicou.

Os homens que acompanhavam Violentina desmontaram de seus cavalos, desembainharam suas armas, ficando ali parados em posição de combate. Depois disso a moça calmamente desceu da sua montaria e pousou sua mão sobre um sabre que carregava na cintura, ao lado de uma espada curta e ficou ali observando Lonios com um sorriso no rosto.

***


Nimbus e os Cavaleiros de CenferumOnde histórias criam vida. Descubra agora