Ensinamentos...
Outro dia, o sol nem havia nascido quando Sãr Lonios acordou Nimbus, dizendo que o dia seria longo e a viagem seria ainda mais longa e mais forçada.
Nimbus estava em um sono profundo e amaldiçoou ter que acordar durante a madrugada, fazia mais de um mês que ele não dormia em uma cama confortável e aquela era a mais confortável que ele havia dormido em toda a sua vida, levantar dela era uma tortura. Após alguns minutos se espreguiçando, ele tomou coragem e levantou. Lonios nem ficou esperando, apenas o chamou e saiu do quarto, provavelmente estava organizando a viagem. Nimbus colocou as suas roupas, pegou o cinto com sua espada e desceu as escadas lentamente, ainda com os olhos fechados. A mesa estava posta e haviam várias opções de desjejum, pão, frutas, doces, vinho, leite e chá. Nimbus optou por pegar uma maçã e saiu. Desde a noite passada não tinha fome. Sãr Ahbran tinha acabado com o seu apetite.
— Vamos lá, estamos atrasados — Sãr Lonios falou, assim que Nimbus passou pela porta. Ele estava montado na sua égua Tempestade, seu cavalo, o Trovador estava ao lado, pronto para a viagem.
Seu mestre deu a ordem com um movimento de cabeça e Nimbus montou e o acompanhou.
Sair do Palácio foi frustrante, na ocasião anterior todos estavam servindo os dois, abrindo portões, fazendo reverências, agora Nimbus teve de desmontar, abrir o portão e depois o fechar, sob o olhar indiferente dos guardas. A caminhada pela cidade foi sem maiores problemas, depois de algumas centenas de metros cavalgando, uma guarnição de soldados se juntou aos dois e, depois de algumas palavras, Lonios os colocou em formação e seguiram viagem. Nunca Nimbus havia visto seu mestre dando ordens diretas a outras pessoas que não fosse ele mesmo, e ele parecia confortável com isso, como se fosse algo natural para ele, será que um dia Nimbus conseguiria tamanha naturalidade?
O grupo seguiu, em comitiva, ao longo das avenidas de Solitude, mas algo chamou a atenção de Nimbus. Na porta de uma taverna, uma mulher de cabelos ruivos e esvoaçantes limpava as longas unhas com uma faca, quando avistou Lonios ela sorriu e quando notou que Nimbus a estava observando ela lhe deu uma piscadela. Era Violentina a Retalhadora, quando viu aquilo Nimbus ficou branco e teve até as vistas escurecendo, mas foi amparado por Lonios, que lhe falou baixinho.
— Calma, não vá desmaiar aqui só porque está na presença de um adversário.
— Mestre, como ela achou a gente aqui? E se ela resolver seguir a gente e atacar durante a noite?
— Ela sempre vai nos encontrar, ela provou do meu sangue, dizem que ela tem esse poder, sempre que prova o sangue de alguém ela nunca mais perderá essa pessoa, sempre saberá para qual direção ela está e a que distância. E não se preocupe, nem ela seria maluca o suficiente para atacar uma comitiva do Governo.
— Mas como alguém pode fazer isso só provando o sangue da pessoa? Isso é impossível!
— Nimbus há muita coisa nesse mundo que você nem imagina que seja possível, mulheres que conseguem rastrear as pessoas provando uma gota de sangue, guerreiros que ficam maiores e mais fortes durante o combate, adversários que podem prever o futuro e se preparar para tudo que você possa lhe fazer, são obstáculos comuns para você Nimbus, que vai se tornar um cavaleiro, vá se habituando a isso.
Nimbus ficou ali absorvendo o que seu mestre lhe havia falado e lhe ocorreu que talvez não eram só inimigos armados com espadas e poderes especiais que ele iria ter que enfrentar, depois de ver o Grande Líder, ele sabia que um embate contra alguém poderoso como ele talvez fosse até mais perigoso do que alguém que se poderia vencer com uma arma em punho, então quando os guardas que os acompanhavam estavam mais afastados ele perguntou:
— Mestre, mas como enfrentamos alguém como o Grande Líder, que tem tanto poder?
— O Grande Líder, é o tipo de ditador que utiliza de filosofias coletivistas para manipular o povo e reunir cada vez mais poder para si. Esse tipo você não o enfrenta, pelo menos não diretamente, se é isso que quer saber. Você não vai lá e o mata, ou você corre o risco de outro tirano igual ou pior assumir o poder em seu lugar, o povo sem ser conscientizado é muito suscetível a esses discursos bonitos e entregam a sua liberdade na mão desses crápulas. E como você viu muito bem, ditadores têm sempre pessoas como Sãr Ahbran que o protegem, seja porque foram comprados ou enganados, como é o caso do meu amigo.
— Então como se enfrenta um cara como esse se não for assim?
— Com informação! Você conscientiza o povo, os faz ver o quão ruim esse tirano é, e o povo mesmo irá se levantar e depor esse tirano.
— Mas não vamos cair no mesmo problema de o matar, outro tirano não vai assumir o poder?
— Quando você conscientiza o povo, você mostra para eles o que é certo, ensina novas ideias, mostra outros lugares do mundo onde existem essas novas ideias e a vida é melhor. E torcer para que, com essas informações, o povo crie um novo governo. Você nunca poderá impor suas ideias sobre as outras pessoas, pode apenas mostrar as opções e torcer para que eles criem uma política melhor.
— Política melhor?
— Nimbus, eu vou lhe contar uma coisa. Um bom sistema de política não é centralizar o poder na mão de uma pessoa ou grupo de pessoas como existe aqui em Cenferum, onde os legisladores são eleitos porque inauguram obras nos locais onde estão os seus eleitores e não porque suas opiniões são boas para o povo. Um bom sistema de política é a criação de grupos democráticos cada vez menores até chegar ao ponto de um líder eleito democraticamente ser amigo pessoal de cada pessoa da comunidade onde ele lidera. A descentralização do poder.
— Descentralização?
— Sim, isso mesmo. O ideal seria cada vez grupos menores de pessoas, com os mesmos interesses. Seria algo como uma vila ou uma rua que tem soberania total sobre aquele local, sem precisar se reportar a ninguém. E grupos com interesses iguais formarem alianças, criando grupos, cada um com total autonomia, mas aliados por interesses comuns, sem nunca ter alguém com poder sobre todos eles. É assim em Victórius, o lugar de onde eu vim.
— Mas por que isso? Por que isso é melhor?
— Vou lhe ensinar mais uma coisa. Quanto mais poder você tem em um cargo político, mais você vai atrair os piores elementos da sociedade que vão querer usar esse poder para ganhar vantagem sobre as pessoas honestas. Justamente porque as pessoas que conseguem convencer com argumentos, que conseguem ser úteis para os outros, que conseguem criar iniciativas sem ter que coagir ninguém, elas não vão precisar do poder de um cargo político. Agora os canalhas, os mentirosos e os psicopatas, eles precisam do poder do Estado, eles veem o Estado como uma ferramenta em que eles podem estender todas as ideias deles a nível continental. Quanto maior for o poder do cargo, maiores serão os maus elementos que vão querer se apossar dele. E você viu com os seus próprios olhos, onde um monstro desses pode chegar.
— É assustador — Nimbus respondeu.
— Tenha em mente uma coisa. Os piores dos piores, terão uma vantagem contra os menos piores, porque eles estão dispostos a fazer qualquer coisa para alcançar o poder, sempre foi assim e sempre será. Entendeu agora do porquê de grupos pequenos e autônomos?
— Acho que sim, grupos pequenos têm menos poder para atrair esses maus elementos. Assim teremos somente pessoas boas no comando.
— Não Nimbus, com grupos menores é mais fácil retirar um tirano do poder.
Lonios deu uma piscadela para Nimbus.
***
Não perca o próximo capítulo, Lonios e Nimbus chegam ao seu destino e encontram os Cavaleiros de Cenferum.
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Nimbus e os Cavaleiros de Cenferum
FantasyEm um mundo onde continentes flutuam sobre nuvens mortais onde monstros colossais ameaçam a humanidade, um jovem idealista e um cavaleiro desonrado embarcam em uma jornada desesperada a bordo de uma das últimas naves, para salvar os últimos vestígio...