Capítulo 3: A visita (Parte um)

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"Jogai sal em minhas feridas. Tornai-me amarga, pois fui iludida."


Certa tarde, daquelas bem solarengas, eu e a Dio voltávamos do colégio. Estávamos sem vontade, aborrecidas, num completo tédio. Fomos a pé, depois de o autocarro ter-nos deixado na paragem. O caminho era tão longo que logo o "Sal da Terra" recitamos uma pequena passagem.

Recordo ter sido um dia de aulas igual aos outros, excepto pelos olhares nada discretos da Ruiva Francisca e da sua intratável amiga loira, Jessica "Duas Luas", que não foram poucos.

Há dois anos que elas me andavam a rondar e por apego ao que aconteceu entre nós nesses anos, sempre me convidavam a elas no almoço juntar. Porém, da minha parte nunca houve interesse e o convite para almoçar, eu eloquentemente recusava. Talvez não devesse, só que aquele acontecimento ainda me assustava.

De qualquer forma, andamos pela estrada tão alheias ao que se passava a nossa volta que demoramos a perceber que havia chuva e não era pouca.

Quando chegamos a casa, a rir de tanto correr, ali na nossa frente uma viatura se encontrava. Era uma velha carrinha, amarela e ferrugenta. Podia ler nas entrelinhas: "sou da década de noventa".

Eu a Dio fomos para dentro e encontramos o Carolas na sala, com um outro elemento. Ambos bebiam e fitavam-se entretanto, sempre atentos. 

Cumprimentei-os com um tímido "Olá " e Carolas virou-se para mim, com um olhar de inexplicável irritação. Assustada, ignorei o convidado e segui logo para o meu quarto, com o coração na mão.

...

Lá fiquei até alguém chamar e só saí quando a mamã - que voltara três horas depois - me chamou para jantar. Nos primeiros minutos, o infeliz silencio tomou conta da mesa, mas o homem misterioso - que se chamava Dimas, fez questão de o salvar. Ele era o dono da carrinha amarela e gostava de falar. Falou pela noite dentro e fez perguntas curiosas, até pessoais, das quais não pudemos escapar.

Para alívio meu, esse senhor Dimas era gente boa. Mas até o conhecer, eu não sabia o que pensar da sua pessoa. O seu aspecto grosseiro e tamanho ameaçador, fizeram-me pensar o pior. Fiquei contente porém, por ele ser suave como licor.

Durante todo aquele tempo, até ao momento em que o senhor Dimas se foi embora, o Carolas esteve muito calado. Na verdade, ele mal sorriu ou olhou para mim do seu jeito disfarçado. As suas respostas, quando questionado pela mamã a respeito da amizade com Dimas, foram breves e ríspidas. Foi como se lhe incomodasse tocar sequer no assunto, de tão insípidas.

 Achei ainda mais curiosa a atenção que ele deu a porta da cave. Até onde eu sabia, não havia grande motivo para ter os olhos tão virados naquela divisão. Ali não havia nada de interessante além de tralhas, velharias, bolor e ratazanas que de tão gordas, nunca nos abandonarão. Era estranho e até a Dio bem queria descobrir a razão!

Pequenos Contos de Paixão & Perigo: Ribeirinha MaiaOnde histórias criam vida. Descubra agora