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Camila se sentou na mesa com os dois clientes mais chamativos que aquela sorveteria já havia tido desde a inauguração da mesma.

O bonitão de cabelos pretos era Shawn, um chaebol de vinte anos de idade que pretendia comprar alguns terrenos na região, e o mais baixinho e bilíngue, se chamava Frederico - ou Fred, como ele mesmo fazia questão de ser chamado.

Fred havia sido contratado pelos pais de Shawn havia cerca de um ano, e, com poucos meses de trabalho, os dois acabaram virando bons amigos. Onde o filho dos patrões e megamilionário estava, o tradutor de salário gordo também marcava presença.

Os três jovens conversavam animadamente, partilhando suas vidas e suas aventuras amorosas. Camila não tinha muita coisa para contar, já que toda vez que se apaixonava por alguém, alguma pessoa muito melhor que ela aparecia e roubava sua chance de se aproximar. Por outro lado, Shawn ainda não tinha tido a oportunidade de se apaixonar, pois sempre se fechava para qualquer um que tentasse ter algo mais sério com ele, uma vez que seus pais eram muito rígidos quando o assunto era o futuro casamento do filho.

Camila sentiu um perfume adocicado tão bom que não parecia ser real. Por alguns segundos, ela sentiu sua cabeça girar como se estivesse prestes a desmaiar.

Shawn mudou da água para o vinho em menos de um segundo. A princípio, ele estava falando algo muito importante em sua língua nativa e, de repente, parou tudo o que estava fazendo para fitar o rosto de Camila.

A garota corou diante tal observação furtiva. Não era sempre que um garoto a encarava de uma forma tão anormal.

Camila deixou seu celular cair de propósito para sair da linha ocular do gringo. Ela se abaixou para pegar seu pertence, e por um instante pensou ter sentido aquele perfume maravilhoso e entorpecedor outra vez.

Ela se levantou, e quando fixou seus olhos em Fred, ele encarava Shawn da mesma forma que este encarava Camila.


A garota deu uma conferida no gringo. Ele olhava para Fred daquela maneira... estranha.

Camila se retirou da mesa desgraçadamente, sem querer atrair a atenção dos dois clientes e atrapalhar aquela cena cômica. Vitória devia estar dando pulos de alegria por ter acertado em cheio quando acreditou que aqueles rapazes eram um casal.

- O que eu disse, huh? - a amiga pôs as mãos na cintura, tomando uma pose de convencida - Eu sei quando as pessoas são.

- São? - Camila franziu o cenho - São o quê?


Vitória deu-lhe um tapa no ombro, dando uma verificada nada discreta no casal que se dizia ser uma dupla de amigos havia poucos minutos.

- Você sabe - ela deu de ombros - Do vale. Tipo eu.

Camila deixou o queixo cair, enquanto colocava as palavras da colega de trabalho na balança. Aquilo fazia sentido. Por mais que ela não entendesse muito do assunto, sua cabeça começava a compreender que, talvez, gente do vale reconhecesse gente do vale sem ter que fazer muito esforço.

Vitória tinha um dom e tanto, e precisava usá-lo com mais frequência perto dela. Quem sabe assim, suas chances de desencalhar aumentassem?

Camila se sentou no banco atrás do balcão de atendimento. Aquele lugar já estava se tornando dela, a única coisa que faltava era uma plaquinha com seu nome escrito.

O céu estava ficando escuro lá fora, e por mais que parecesse ser um fim de tarde normal, a garota sabia que estava prestes a testemunhar uma tempestade jamais vista naquela cidade.


- Vamos ter que fechar mais cedo - Vitória comentou.


- Você sempre arranja um motivo para fechar mais cedo, bonita - Camila torceu o lábio, começando a ficar de mau humor.

- Hoje vai chover - a outra deu de ombros - E se não percebeu, vai ser uma chuva daquelas.

***


Afrodite estava em estado de nervos. Mesmo com o rosto em chamas pela raiva que estava sentindo e seus passos pesados fazendo o solo do Olimpo inteiro estremecer, a deusa do amor ainda tinha uma beleza inimaginável.

- Conte a sua versão dos fatos - a deusa rugiu, fazendo o solo deificado estremecer ainda mais.

Lauren precisava de muita calma para não entrar em desespero. Sua mãe poderia lhe matar se quisesse, isso era uma opção muito óbvia e ela não tinha como evitar.

Afrodite já havia transformado vários de seus filhos em cinzas, e não seria diferente com ela só porque tinha feito ótimos trabalhos... até aquele momento.


- O alvo se mexeu depois que eu soltei a flecha - ela engoliu em seco - Perdoe-me pelo meu pecado.

A deusa revirou os olhos e, sarcasticamente, aplaudiu o pedido de perdão da filha.

- Eu esperava mais de você, Lauren - ela murmurou - Acreditei em seu potencial e te enviei para concluir o mais difícil de todos os casos que tivemos este ano. Aquelas duas coisas precisavam ficar juntas, mas por sua causa, pelo simples fato de que você não pôde segurar a flecha por mais um pouquinho de tempo para acertá-la no alvo... o destino de quatro mortais foi alterado - ela fez uma pausa, encarando as águas claras do rio do Olimpo à sua frente - Está satisfeita?


- Não, senhora - a garota murmurou.

- Acha que o que você fez está certo?

- Não, senhora.

Afrodite sorriu maliciosamente para sua filha semi-deusa.

- Pelas mais antigas leis do Olimpo, aquelas em que está escrito que semi-deuses são obrigados a servir seus progenitores fielmente e sem erros por toda a vida... - ela fitou os olhos de Lauren friamente -... condeno minha própria cria a viver com os mortais por tempo indeterminado, como punição pelos seus pecados.

Os olhos de Lauren se encheram de lágrimas. Passara tanto tempo no Olimpo, compartilhando momentos incríveis com outros semi-deuses, que nunca lhe passou pela cabeça viver como um ser humano comum.

As águas do rio do Olimpo ficaram escuras, quase negras. Provavelmente, os mortais iriam ter uma visão horrenda de um céu nublado prestes a despejar uma tempestade horrenda sobre eles.

Lauren deixou seu arco e suas flechas do amor caírem sobre o gramado verde dos deuses e, sem forças para protestar e pedir por misericórdia, caminhou em direção às águas escuras.

- Espero que aprenda, Lauren - Afrodite disse, alguns centésimos antes de sua cria pôr os pés na água e, por fim, desaparecer diante de seus olhos.

Meu Cupido Deve Estar LoucoOnde histórias criam vida. Descubra agora