capítulo 6

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Estou cansada. Meus pés nunca doeram tanto. Só consigo pensar que não fui feita para andar. Não mesmo!

Hugo guia o caminho em sua forma de falcão. Tem sido uma viagem silenciosa e quase solitária. Ele está concentrado demais em esperar por qualquer perigo para ficar jogando conversa fora. E tudo bem, com todo este cansaço não sei se seria capaz de desenvolver qualquer diálogo.

O gavião de cabeça cinza faz seu pouso em um tronco na beira da trilha. Hugo, então, volta a me olhar com seus olhos escuros, dizendo:

— A instalação fica vinte minutos daqui. Vamos descansar e amanhã continuamos como previsto.

— Tudo bem. — respondo com a voz fraca e desanimada.

Durante a viagem fizemos paradas nos postos de abastecimento. Um nome mais elaborado que o necessário. São apenas casas simples com o básico que uma pessoa pode necessitar em casos de necessidade. Outro ponto para Una.

Andamos durante mais vinte minutos até encontramos o posto local. Hugo faz a gentileza de permitir que eu tome banho primeiro. Quando já estou limpa deito e sonho que estou em casa.

Hugo me acorda na hora do jantar.

— Melhor? — ele pergunta me oferecendo alguns legumes saborosos.

— Sim. Foi uma longa caminhada, mas eu só precisava dormir um pouco. Você descansou?

— Vou descansar assim que acabarmos. — responde já voltando sua atenção para o próprio prato.

Mas, eu sei que ele não irá descansar enquanto não estivermos em casa. Então preciso distraí-lo dos possíveis problemas que nos aguarda.

— Quando chegar em casa, a primeira coisa que vou fazer é deitar e dormir por três dias completos. — falo e depois enfatizo meu desejo dando um longo bocejo.

— Você acabou de acordar! Isso não é normal. Talvez este seja seu poder: a incrível habilidade de dormir em qualquer circunstancia. — fala me provocando.

— Talvez você esteja certo! São poucas as coisas que me tiram o sono. Seria interessante. Não poder voar ou me transformar em bichinhos de estimação, mas sim convocar o sono em momentos de necessidade. — respondo entrando na brincadeira.

— Bicho de estimação? Você sabe que eu posso, literalmente, te matar com apenas uma de minhas mãos? — diz enquanto me encara fingindo ultraje.

— Se você fosse me matar, já teria feito isso. — respondo um pouco distraída com a luz da lua que entra pela janela acentuando a cor de seu cabelo.

— Você está certa. Te matar não teria a menor graça. Por outro lado, tortura é uma boa saída... — fala para em seguida avançar em um ataque de cosquinhas, me fazendo rir até chorar. Nossos pratos ficam de lado enquanto ele também dá gargalhadas por causa da minha risada estranha.

Quando nos acalmamos ele me olha e diz, ainda com um sorriso no rosto:

— Eu poderia me acostumar com isso. Você devia ficar feliz com mais frequência. — desvio o olhar e não respondo.

Atingir a felicidade não é fácil. É só tomar como exemplo um momento como este. Não foi planejado, mas foi necessário alguém de confiança para que ele existisse. A alegria envolve muitas variáveis para ser algo que vem fácil.

A gente só é feliz quando criamos boas memórias ao lado das pessoas que a gente ama.

E eu amo meu melhor amigo por me fazer esquecer o cansaço e o nervosismo para o dia seguinte. É por isso que ainda compartilhamos este laço: eu estava tentando distraí-lo e ele fez o mesmo por mim.

Amizade é baseada nisto: em buscar o bem para o outro, mesmo quando ele não percebe. Mesmo quando não pode retribuir.

E, mesmo com o dia de amanhã rondando como a lembrança de um sonho ruim, adormeço feliz com a consciência de que nada de ruim pode acontecer contando que Hugo permaneça ao meu lado. E eu do dele.  

A lenda das estrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora