Capítulo 3 "Bibbidi-Bobbidi-Boo Harry, desejo concedido."

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Enquanto caminho para casa com duas camadas de casacos e os dedos dos pés encaracolados de frio percebo que devia ter ficado a trabalhar até á hora suposta e que provavelmente pareci uma idiota quando me vim embora de forma abrupta...mas não queria sair e ter de lidar com pessoas, não hoje.

Vou chutando as pedrinhas na calçada e agradeço por não estar a chover. Os autocarros vermelhos passam ao meu lado e vejo que estou quase em casa quando a senhora que sai na paragem carregada de sacos se vira para abrir a porta do prédio Corro um pouco com os saltos altos e digo-lhe boa noite a sorrir.

-Julieta! Como está querida?

-Bem, foi um dia longo, deixe que eu ajudo. - Agarro nos sacos de plástico e subimos o primeiro lance de escadas. Oiço o gato dela miar atrás da porta e quando esta a abre o gato salta cá para fora a roçar-se nas nossas pernas.

-Precisa mesmo de lhe dar um nome. - Digo e ela ri-se.

-Ele tem um nome.

-Gato não é bem um nome.

Miss.Corinne ri-se e sorriu-lhe.

Quando finalmente chego a casa e me descalço sinto o alivio que me percorre o corpo. Largo os meus casacos e com cuidado coloco o cachecol no bengaleiro azul claro. Tudo na minha casa grita cor, tenho um sofá amarelo com tantas almofadas azuis que mal há espaço para relaxar. Todas estas coisas me acompanham desde que sai de casa, a manta de retalhos que tenho em cima de uma poltrona e com a qual me tapo quando vejo filmes têm quase a minha idade e lembra-me de casa. Tenho saudades de casa constantemente, é doloroso.

Para me distrair faço chá e saltito para me aquecer, recuso-me a ligar o aquecimento e a ter que sair para recarregar a energia. Hoje não! A minha chaleira grita por mim e tiro a água quente derramando-a numa chávena. Sento-me no sofá e uma série que vi demasiadas vezes faz-me companhia. Gostaria de ter um novo livro para ler...

-Então quando não jogas ténis, estás a ler na biblioteca?

Sorriu. Sei quem é. O rapaz simpático que me ajudou a tirar a minha raquete de cima do armário.

-É um lugar muito mais silencioso que o pavilhão desportivo. – A minha voz sedutora é irritante e juro não voltar a fazê-la.

O rapaz...Harry, é muito inteligente, hoje na aula disse algo espantoso e o professor acenou o que deve significar "que bom uma cabeça pensante!", gostava de conseguir dizer alguma coisa, mas ainda me sinto tímida e de cada vez que tento falar sinto a garganta apertar-se.

-És engraçada Julieta, muito diferente da verdadeira.

Os olhos verdes dele faíscam e inclino a cabeça para o lado deixando o meu exemplar de "Mulherzinhas" de lado, consola-me lê-lo.

-A verdadeira?

-Aquela que se mata de amores pelo Romeu... o meu gato chama-se Romeu.

Abano a cabeça e fecho os olhos por um segundo.

-Engraçado, por muito que fale da peça com rapazes todos dizem o mesmo "rapariga tola", ninguém se lembra de pensar "caramba que história incrível de ser contada"... é só uma história, e a pobre rapariga fica condenada pelo futuro que o escritor lhe ditou.

Harry parece um pouco surpreso com as minhas palavras e uma faísca de interesse acende-se nos seus olhos. Não sou parva, sei que lhe interesso, mas gostava de não me sentir tão elétrica perto dele. Quero que fale comigo, mas não quero que se aperceba.

Two ways to lie *Concluida*Onde histórias criam vida. Descubra agora