Eu continuava a visitar-lhe, a levar-lhe flores
A ir contar-lhe como foi o meu dia
Tentava manter-lhe informada sobre a sociedade e seus horrores
Tínhamos um gosto único, peculiar, eu falava mesmo sabendo que não iria haver resposta
Continuava a levar-lhe o jornal e nas noites de inverno alguma bebida quente
No natal, comprava aquelas flores que ela sempre tentou ter em casa
Ainda levava aquele livro de poesia que ela tanto gostava
E eu lia para ela, e continuava a ler até se tornar tarde
Algumas vezes comprava aquele urso que ela tinha quando era criança
E nas noites de chuva eu permanecia ao lado dela, e falava-lhe sobre as estrelas, a lua e viagens a Marte
E mesmo ela não respondendo eu sabia que ela ouvia
Permanecia ao lado dela, chuva, neve, sol, não importava o quê, eu ainda lá estava
Falava-lhe de política mesmo sabendo que não gostava
Ainda levava um maço de cigarro para dividir
Noites falando com ela sem querer dormir
Havia pouca coisa de valor em minha vida
Havia poucos momentos em que podia simplesmente falar
E ela me concedia esses momentos, ela me mostrava como sarar as feridas
E mesmo no silêncio, e mesmo ela não respondendo eu sabia que a gente se divertia
Eu sabia que ela não queria ficar sozinha, então é lá que eu ficava
Fingia que contava as estrelas com ela
Fumava e fingia que ela fazia o mesmo
E mesmo quando me foi proibida a entrada no cemitério, eu continuei a visitar-lhe apenas porque ninguém poderia tirar-me aquele momento.
VOCÊ ESTÁ LENDO
As Minhas Notas( A Vida De Daniel Richard)
AléatoireDaniel Richard, um homem solitário com um passado que não consegue deixar, cheio de feridas e questões por resolver, foi anotando todas as suas memórias em um bloco de notas com a esperança de que um dia quando já não poder lembrar de nada e quis...