CAPÍTULO XVI

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Meus pensamentos travaram quando me deparei com a carcaça de um ônibus de cabeça para baixo, bem ali, numa área sem árvores ao lado da estrada.

Não sei por quantos minutos fiquei estática, encarando o veículo. Quais as chances de isso ser real? Quais as chances de eu estar delirando por ter passado a noite em claro e por estar doente? Afinal, eu estava vendo o que eu queria ver.

No entanto, repassemos os fatos: foi um acidente de ônibus que me colocou nessa confusão toda e essa estrada chegava a ser bizarra de tão pouco movimentada. Em todo o tempo que estive andando por aqui, não houve um automóvel sequer trafegando. E agora, tenho um ônibus virado aqui. Isso ia além de suspeito.

Por outro lado, a dúvida é uma dádiva. Tudo era tão óbvio, eu achava, mas ter certeza disso não custava nada. Era bom certificar que eu estava pisando em chão firme.

Aproximei-me do veículo, pernas doloridas da longa caminhada. Minhas articulações falharam, fazendo-me cair de joelhos bem diante dos restos do automóvel. Larguei a barra de ferro que eu carregava ao meu lado e abaixei-me um pouco para ver o interior do veículo, em busca de algo que me servisse de prova.

Ali dentro estava um verdadeiro caos. Cacos de vidro, neve espalhada pelos bancos, assentos quebrados... Pensar que eu consegui sobreviver a isso... Talvez eu realmente tivesse sorte.

Deitei-me, tentando aumentar meu campo de visão. Não vi nada que chamasse atenção. Nenhum suposto bilhete esperando por mim. Nenhum objeto perdido.

Coloquei-me de joelhos, com dificuldade. Minhas pernas não paravam de doer e não pareciam querer funcionar agora. Segurei a barra de ferro e apoiei-me num só joelho, trêmula. Quando peguei o impulso para levantar, uma lufada de vento frio assoprou no meu rosto trazendo consigo vários panfletos... Panfletos?

Consegui segurar um deles no ar. Observei o papel e bom, era realmente um panfleto. De um jogo de hóquei. Eles vinham de dentro do ônibus, estranhamente.

Tive uma sensação de dejavu em torno disso, como se tudo fizesse sentido. Panfleto de jogo de hóquei. Eu já tinha visto isso e não parecia ter tanto tempo.

Sem pensar muito no que eu estava fazendo, levei a mão a um dos bolsos do casaco. Senti os papeis que eu guardava ali e tirei o único que não era um bilhete. Sacudi-o para desamassá-lo e coloquei-o ao lado do panfleto que eu havia capturado no ar.

Eram iguais. Ambos eram panfletos de um jogo de hóquei. Naquele momento, eu compreendi o sentimento de dejavu. E também comecei a ligar os fatos.

Lembrei algo que até agora, não havia passado pela minha cabeça.

Momentos depois de termos entrado no ônibus, o time de hóquei da escola começou a distribuir estes papéis. Acho que era algum jogo contra o time de outra escola, não sei direito. Nunca dei muita importância para esses times.

Mas esse simples fato anulava toda e qualquer sombra de dúvida. Eu estive dentro daquele ônibus. Ah, como é bom afirmar algo com certeza.

Mas e agora? Como eu devo proceder com isso? Devo continuar a caminhar, seguindo pela estrada?

Não antes de dar uma boa olhada no local.

Agora sei que meu ponto de partida foi bem aqui, bem longe do lugar onde acordei. Eu fui arrastada por alguém — o stalker — até lá. Mas como? Deve haver algum atalho por aqui. Algum rastro.

Caminhei ao redor do ônibus, conferindo as proximidades minuciosamente. De início, pensei que poderia encontrar pegadas ou algo do tipo, mas se passaram dois meses. Bati na minha própria testa: não seja burra, Elizabeth. Você acha que o tempo não fez questão de apagar?

Seria um esforço inútil. Eu não ia encontrar nada ali. Deve haver algo...

Olhei em direção à floresta ao redor. E se...

Não, eu acabaria me perdendo da estrada. Mas será que...

Droga, que confusão!

Parei e respirei fundo. Com a cabeça quente eu não ia conseguir pensar em nada. No entanto, era meio difícil esfriar a cabeça quando sua testa está queimando em febre e suas pernas não param de latejar de dor. A verdade é que eu estava bem cansada e tudo o que eu queria era dormir um pouco.

Infelizmente eu não podia parar agora. Eu precisava encontrar aqueles dois. E talvez aqui eu encontre algo que me ajude nesse propósito.

Distanciei-me um pouco do veículo, aproximando-me da vegetação da floresta. Olhava o tronco das árvores, em busca de marcações ou algo tipo. Observei o chão coberto de neve mais uma vez, mesmo sem expectativas. Nada.

Eu já ia voltar para o caminho cinza, quando mais uma rajada de vento passou por entre as árvores, assoprando as dezenas de panfletos que estavam ali espalhados pelo chão. Eu olhei involuntariamente em direção ao vento, pouco antes de o mesmo cessar, e... Enxerguei algo estranho.

Um matagal alto ao meu lado. Eu não tinha reparado naquilo. Também não tinha reparado que, atrás do mesmo não havia nenhuma árvore. Não sei se foi impressão minha ou uma alucinação de uma mente febril, mas acho que vi, por um breve instante, aquele matagal se abrindo como uma cortina.

Eu fiquei alguns instantes meio paralisada. Meu olhar alternou entre o matagal e a estrada. Quando me dei conta, estava curiosa para ver o que havia atrás daquilo. E eu já estava me aproximando.

Foi um sofrimento achar aquela estrada, e lá estava eu, me enfiando na floresta de novo. Tudo bem. Eu não iria longe, não ia me perder, e se eu não achasse nada que me interessasse, eu daria meia-volta e voltaria para estrada. E então eu caminharia e caminharia atrás do desgraçado que está com Thomas, fugiríamos e procuraríamos ajuda. Pronto, felizes para sempre.

Ah, eu realmente não estou acostumada a ser otimista desse jeito. Na verdade, eu sabia que não poderia conseguir, mas eu ia morrer tentando.

Embrenhei-me no matagal denso. Andei com dificuldade, visão prejudicada pela vegetação. Quanto mais eu tentava segurar as plantas fora do meu caminho, mais delas surgiam na minha frente. Bem ali, eu pensei que já estava perdida e que não havia mais volta.

No entanto, quando coloquei minha mão entre a vegetação à minha frente para abrir mais espaço, senti a brisa fria do inverno na ponta dos meus dedos.

Arquejei. Avancei a todo vapor, pouco me importando com os arranhões ou com os ramos que certamente ficariam presos ao meu cabelo. Apenas fiz questão de proteger meus olhos, fechando-os.

Enfim havia me livrado daquela confusão arbustiva. Senti uma brisa soprar suavemente no meu rosto.

E abri meus olhos.

E à minha frente...

À minha frente uma nova estrada. Uma estrada de terra batida, ocultada por todo aquele matagal.

***

EUJUROQUENÃOQUISDEMORARMAISDEDOISMESES! DESCULPA!

(Toda vida eu venho aqui pedir desculpa por demora, é incrível. Desculpem por isso também.)

Espero do fundo do meu coração que vocês tenham gostado, porque eu sofri pra escrever isso daqui. É sério. Sério.

Só pra ressaltar: tem uns capítulos reescritos aí. São o VI, o VII, VIII e o X. 

É isso. Votem e comentem, porque assim vocês fazem um projeto de escritora feliz. Amo vocês. sz.


These Roads - Nessas EstradasOnde histórias criam vida. Descubra agora