Jornada Em Contos

Quando o Dia e a Noite se Encontram

El Buiré, Arcania.

Era o início do equinócio da primavera, o momento perfeito para eu sair em busca da flor que eu precisava para testar uma nova poção que vinha trabalhando nos últimos meses. Era cansativo, mas esperava conseguir resultados o mais breve possível, nosso reino precisava que desse certo. A população estava sendo acometida por uma terrível praga, todos os magos médicos estavam lutando contra o tempo para achar um antídoto para a doença infernal, nome dado devido ao que a praga fazia com suas vítimas que começavam a sentir uma ardência terrível por todo seu corpo, fazendo-as sentirem que estavam em chamas e, depois de alguns dias, subitamente, elas paravam, mortas. Eu fazia parte do batalhão convocado para tentar achar um antídoto, estava entre as melhores magas médicas da minha região, mas, mesmo assim, não conseguia achar uma fórmula, um antídoto que revertesse a situação do meu povo. E quanto mais demorávamos, quanto mais eu demorava, mais pessoas morriam e isso ia me consumindo diariamente. Eu tinha que achar uma forma de salvá-los e rápido.

Meu lar é chamado de Arcania, reino dos magos e encantadores, moro na cidade de El Buiré, que é considerada a mais próspera, devido aos seus portos mercantis ao Sul e também por ser o centro produtor de amuletos e artigos mágicos, por isso eu tinha a certeza que era ali que seria encontrada a fórmula necessária para deter a praga. El Buiré possuía uma flora invejável pelo restante do Reino e também por Galtero, reino dos guerreiros, pois possuía a maior quantidade de plantas e flores medicinais já conhecidas em nosso mundo. A que eu estava procurando era uma flor específica que achara em um dos meus antigos livros sobre a flora de El Buiré, a minha intuição me dizia que ela poderia salvar o meu reino dessa enfermidade, mas também sabia que seria difícil de encontrá-la. A flor é conhecida como Arysemun, suas pétalas se abrem no início do equinócio da primavera e sua estadia como flor dura apenas dois dias, depois disso, ela se transforma numa pequena fruta, que não tem nenhuma serventia para o problema que o reino passava. Lembro-me que quando falei sobre ela para os outros magos médicos encarregados dessa missão, eles riram de mim, dizendo que essa flor não passava de uma lenda, que eu estava perdendo a razão por acreditar nela, pois ninguém nunca a tinha visto a não ser a autora do livro. Minha avó.

Sim, minha avó Hèlieneh era uma maga médica como eu, a melhor da sua época, uma referência para todos os outros magos do reino. Ela era incrível, catalogou mais de mil espécies de plantas e flores medicinais, incluindo a Arysemun. A lenda nasceu porque, depois que minha avó catalogou a planta em seu livro, nunca mais ela fora vista por ninguém. Faz 50 anos desde que Arysemun foi vista pela última vez. Pode parecer realmente que eu perdi a razão, mas não quero perder as esperanças, sei que essa flor é a nossa salvação. Se Hèlieneh estivesse viva, seria mais fácil para eu saber onde encontrar essa flor, mas ela morreu quando eu tinha 10 anos, deixando para mim seu bem mais precioso, seu livro contendo todas as plantas e flores que ela encontrou ao longo da vida. Eu acredito na minha avó, acredito na existência de Arysemun e sei que ela salvará o nosso reino da doença infernal. Em suas anotações, ela escreveu onde tinha encontrado Arysemun, mas era uma localização inexata, só sabia que era mais ao Sul de El Buiré.

Era nisso que eu estava pensando, enquanto caminhava por um bosque, sempre com a pintura que minha avó fizera da flor junto comigo. Ela era de um violeta incandescente que parecia furtar a cor ao seu redor, se eu encontrasse, seria fácil reconhecê-la. E, por mais que eu já tivesse decorado todas as suas características em minha mente, eu não deixava de lado a pintura, pois era uma forma de manter minha avó perto de mim nesse momento. Foi então que escutei um grito. Dor. Outro grito. Concentrei-me para escutar melhor de onde estava vindo o grito. Parecia vir da minha esquerda, certo, fui para lá, em direção a quem quer que estivesse precisando de ajuda.