Capítulo 4

182 43 76
                                        

Lauren

No mesmo lugar de sempre

(São Francisco)

A fachada da loja era tão acolhedora que era difícil acreditar que o dono fosse tão rabugento como realmente meu chefe era, mas ah, eu o adorava, ele era um velho com cabelos totalmente brancos, óculos redondo, olhos azuis gélidos, e um nariz pontudo, a pele era bem clara, ele andava devagar mas o respeito que empunha não era abalado por isso, nem pela corcunda, talvez ele me lembrasse um pouco Dumbledore nesse sentido, mas se eu falasse isso pare ele era capaz de me jogar algo por cima, definitivamente ele era um senhor revoltado.

Vi seu olhar sobre mim pela janela antes de entrar na loja, entrei, já preparada para o que viria, sorri, adorava suas reclamações.

- Realmente posso concluir que os relógios a sua volta estão todos quebrados ou você é tão burra que até hoje não aprendeu a olhar a hora, com 19 anos, francamente, você me frustra, e se entrasse um bando de marmanjos destruidores e vândalos aqui, o que eu, um velho caquético ia fazer?

- Sabazio, eu tenho certeza que você ia se virar muito bem – eu ri, ah com certeza ele iria, ele era um velho durão quando queria, poderia afastar quase qualquer um – e além do mais o que uma garota burra de 19 anos que nem sabe ver a hora poderia fazer?

- Me poupe – ele bufou rindo e me olhou – vem aqui antes que eu desista.

Ele estava sentado à sua mesa, com um livro antigo em alguma língua que eu nunca saberia falar, papéis, uma caneta de pena e tinteiro, enquanto me aproximava ele deslizou pela mesa uma pequena bolsinha de veludo vermelho, parei ao seu lado e esperei, não arriscaria pegar, nunca se sabe o que ele faria em seguida.

- É seu, pegue de uma vez.

Peguei o pequeno saquinho e abri, algo brilhou lá dentro, puxei, era uma chave com um cordão amarrado e uma pedra olho de tigre pendendo na ponta, dentro do pacote ainda restava um papel, que ao olhar percebi que possuía um endereço escrito, olhei para Sabazio que continuava concentrado no que fazia e me ignorava com sucesso, ele previu a pergunta e falou.

- Como eu sei que você não tem intelecto suficiente para entender, eu explico, essa é a chave do meu trailer, no caso agora do seu trailer, o endereço é onde obviamente ele está, junto de vários outros, nos quais outras pessoas também moram. – Eu fiquei parada com a boca aberta por alguns segundos antes dele retomar a fala - Agora, você pode ir, como bem sabe eu não preciso de você.

Eu nem sabia o que sentir ou como reagir, mas realmente o que me chocava era que, ele não sabia de nada, não tinha como saber, eu não tinha o visto ainda e ninguém poderia ter falado para ele, os mistérios que envolviam esse homem eu nunca poderia explicar. Como ele sabia que eu estava sem uma casa para morar eu provavelmente ia continuar tentando entender, pois como sempre ele não me contaria nada.

Meus olhos encheram de lágrimas, e não pensei duas vezes antes de o envolver com os braços, pode ser que me batesse com o livro, mas eu não me importava.

- Eu te amo – tentei esconder a voz embargada, mas não foi possível, e para minha surpresa ele não me afastou, pude ver um rastro de sorriso passar por sua cara amarrada.

- Vá logo garota, vai, vai, vai. – Ele me apressou.

E eu fui.

***********************


Depois de caminhar algumas quadras encontrei o endereço que tinha no papelzinho, era um pedaço de campo aberto com alguns trailers, alguns pareciam estar ali há anos, com direito a jardim e tudo, alguns animais podiam ser vistos, enquanto outros pareciam prestes a partir, olhei em volta procurando saber qual deles era o de Sabazio, um deles disposto mais para trás, discretamente afastado dos outros, parecia estar posicionado para que ele e quem o possuía não fosse notado, era verde limão (o que sim era meio estranho dito que ele mostrava não querer chamar atenção) e um pouco menor que os outros, era aquele.

Caminhei em direção a ele ainda meio em dúvida, mas a sutileza e ao mesmo tempo o choque que ele trazia era basicamente uma forma de descrever o seu velho dono, além do mais, verde era minha cor favorita, vi que tinha um símbolo desenhado na porta, já o tinha visto muitas vezes, era um símbolo que eu mesma gostava muito, sim, era aquele. Caminhei agora decidida em sua direção, senti que alguém me olhava mas eu estava muito ansiosa para sequer olhar para outro lugar que não fosse aquele limão gigante parado ali, cheguei na porta, senti cheiro de algo familiar mas não pude dizer exatamente o que era, minhas mãos tremiam quando tentei encaixar a chave na fechadura, um sorriso se abriu quando consegui encaixa-la e gira-la, entrei e olhei para todos os lados tentando absorver o que via.

O sorriso que eu não conseguia conter estampava meu rosto quando Chad chegou com as minhas coisas, logo ele também tinha um sorriso estampando seu rosto, acomodamos as roupas no armário embaixo da cama que compunha um dos cantos do trailer, meu notebook e as outras coisinhas colocamos no balcão curvo que compunha o outro canto, o qual inclusive ja tinha uma TV em cima, o intervalo entre o balcão e a cama tinha armários que também serviam de balcão e um fogão, os armários não estavam vazios, tinha mantimentos além de potes e panelas.

O trailer era novo, nunca tinha sido usado, eu podia notar, o cheiro que eu senti era de sândalo, tinham paus de sândalo dependurados pela extensão do lustre em "s" que contornava a luz, assim como meu antigo quarto, e também a loja em que trabalho. Sabazio tinha feito aquilo especialmente para mim, porque e como eu realmente não sei, mas eu pretendo descobrir.

Eu quase não podia acreditar no que estava acontecendo, que algo tão bom assim estivesse acontecendo, eu só queria que dessa vez, tudo desse certo.

- Seu telefone estava vibrando loucamente, alguém ligando – Chad o trouxe para mim que estava na rua admirando o local enquanto um gato branco se esfregava nas minhas pernas, demorei um pouco para perceber a expressão em seu rosto e a relutância em me entregar.

- O que foi? – ele meio que balbuciou algo que eu não consegui ouvir – Chad, quem era?

- É, bom, sua mãe.

Ele me entregou o telefone e uma chamada perdida de Rebecca brilhava na tela.

Chama NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora