Sifiel
No ultimo lugar em que me viram
Christie está lembrando de algo, enquanto seu quarto se forma em minha volta já posso ouvir sua respiração acelerada, me aproximo da cama, seu rosto brilha com suor, e a face adormecida tem expressões de dor, realmente algo lindo de se ver, pego a cadeira onde ela costuma sentar para desenhar e a ponho ao lado da sua cama, apanho um monte de desenhos que ainda não foram expostos na parede de pedra e me sento para olhar o que ela tem admirado ultimamente.
Eu não posso deixar que as suas lembranças vão muito adiante no que aconteceu, não era hora, antes deveria avisar Bianca que ela descobriria logo sobre o pai, eu podia sentir tanto o cheiro quanto realmente o que a Christie estava sentindo, e não era medo, era pura dor, haviam poucas coisas no mundo que poderiam deixa-la com medo, minha meta era descobrir todas elas, até hoje eu só tive o prazer de saber de uma.
Os piores sentimentos dos humanos causavam bons sentimentos em mim, mas ao contrário do que pensam, a relação possuidor e possuído não é assim, as sensações são misturadas, e a dor dela me causava tanto sentimentos bons como uma dor que parecia estar longe mas presente, observei os desenhos e percebi que uma grande parte deles era de uma única garota, interessante, seria mais alguma coisa para eu ter o prazer de arruinar? Passo para o próximo tenho a maravilhosa surpresa de ser uma imagem minha feita em grafite, com certeza o melhor desenho que ela já fez, levanto os olhos para olha-la, seu corpo se contorce de dor na cama, ok, está na hora, levanto e ponho a cadeira no lugar, ainda com o meu desenho no topo da pilha pego uma caneta e escrevo, "o melhor de todos, amei" assino meu nome com um coração, e os crentes ainda dizem que demônios são o mal do mundo.
Passo a mão no seu rosto, pequenas chamas negras o cobrem e logo somem, sua respiração se acalma e seu sono logo chegará ao fim, desço as escadas, passo pelo quarto de Bianca que dorme tranquilamente, descendo mais um andar chego na cozinha, olho a cafeteira e o pote de vidro ao seu lado, café, um dos bons vícios dos humanos, não que eu tenha alguma crítica aos outros, tudo que os mata lentamente é simplesmente incrível para mim, mas esse era especial, pego duas canecas, e passo café suficiente para três, subo as escadas novamente, abro a porta do quarto da matriarca da casa e a observo em seu sono tranquilo, aprovei o pijama, vejo as linhas negras deixadas por mim em suas pernas e busto expostos pelo tecido, falo alto.
- Bom dia Bianca, vamos tomar café.
Devagar seus olhos abrem, e ela me fita, essa mulher me detesta, certamente se pudesse me matar o faria, por isso eu gosto dela.
- Ser acordada por você não é bem o que eu chamo de bom dia Sifiel. Por favor se retire. – Ela diz enquanto levanta
- Se é por causa das suas vestes eu diria que não há nada de mais para mim, e também que mesmo assim gostaria de ficar – lanço um sorriso malicioso e pisco.
- Espero que você morra.
- Oh, eu sei querida, sinto lhe frustrar, mas creio que isso nunca acontecerá – lhe digo com um sorriso de quem diz que tem pão quente na mesa.
Lhe dou as costas e volto para o café, logo ela aparece com uma roupa bem menos animadora, e com uma cara tão fechada que tenho o prazer de servir sua xicara e lhe entregar com o melhor sorriso de garçonete que ela já viu, eu com certeza seria a garçonete mais arrasadora que o mundo humano poderia ter, ela ignora meu charme, e se dirige a biblioteca.
Quando sentamos cada um em uma poltrona, ela me olha e diz.
- ótima escolha de canecas. – Olho para a caneca rosa com orelhas de gatinho e bigodes estampados em minhas mãos e dou uma risadinha.
- Gatos são a melhor coisa que vocês têm por aqui, apesar de muitos humanos terem certa aversão a eles já que há uma mania geral da sua espécie de querer controlar tudo ao seu redor, gatos e sua natureza independente e que beira a superioridade incomoda muito a quem pensa que pode controlar alguma coisa. Humanos e sua medíocre ideia de grandiosidade, vocês nunca aprendem. – Tomo um gole de café, ela apenas me olha.
- Então, a que devo a sua desagradabilíssima visita? – dou risada.
- Christie vai descobrir sobre o pai. – é muito satisfatório ver toda sua expressão se desfazer, o choque, a confusão e algo como desolação passarem pelo seu rosto em questão de segundos – eu avisei que esse dia ia chegar Bianca, você devia ter contado.
- O que você fez?
- Isso não tem relevância eu garanto, mas eu gostaria muito de saber o que fará quando a sua filha descobrir que escondeu algo dela a vida inteira. Mas como tenho certeza que você nem sequer pensou nisso, você tem o tempo de uma caneca de café para ter ideias enquanto eu observo seu mundo cair, de novo. – Tomo mais um gole de café, e sei que Christie está descendo as escadas, há alguns momentos de silencio até que a mulher desolada em minha frente fale novamente.
- Ela vai me odiar Sifiel.
- Ah eu garanto que não, ela vai me odiar, o que não faz diferença já que ela me odeia de qualquer forma, um pouco de ódio a mais ou a menos que diferença faz? Inclusive olha ela aí – paro de falar e ela surge na porta, observa a cena como quem não está entendendo nada, viro para ela e dou um sorrisinho.
Ah o caos, como eu amo o caos.
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Chama Negra
Ficção Geral- Ganhador do 2º lugar na categoria LGBT do concurso Escritores Fantásticos - Um demônio, que não é qualquer um. Uma garotinha inocente, que cresceu sendo possuída por um "ser maligno". Uma garota com o pai alcoólatra. Todos sabem que a vida não é f...