XI 》Desenvolvimento

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PARTE I

   Os braços dele rodearam-me, afoguei a minha cabeça no peito dele e encolhi os braços. A vontade de chorar consumia-me, lutei contra isso até sentir o Eduardo a dar-me um carícia na parte de trás da minha cabeça e afastar-se. Depois, o Sílvio cercou-me com os braços dele, manti a mesma posição, o Eduardo avisou-me que ia para a pista de dança e caso precisa-se podia encontra-lo lá. As lágrimas caíram uma a uma, não durou muito, controlei-me e evitei que elas saíssem sem parar.

   Um conforto instalou-se em mim, um que procurei durante muitos anos... Afinal, só ele me dava aquele conforto.

Porquê choro?

   Eu estava feliz, reavi o Sílvio, fiz um belo discurso, a meu ver, sem ter preparado nada, porém, havia a tristeza de ter todos aqueles olhares de pena em cima de mim, o que nunca quis. O facto de verem-me quase como uma estranha por ter sido órfã, não só a mim, como ao Sílvio, também contribuiu para o aperto no meu peito. Somos pessoas normais, e quis mostrar isso, falei dos meus pais, no início pensaram que eu estava a falar dos meus progenitores, aqueles que me trouxeram ao mundo, mas não. Eu falara dos meus únicos pais, Manuela e Mário, estes criaram-me e amam-me. Não gostava que os chamassem de pais adotivos, magoa-me imenso referirem-se aos meus pais dessa forma. Agradeci aos presentes por estar ali e puder contar o meu lado da história. Apelei para que os donativos fossem para apostar no futuro das crianças, jovens e pré-adultos, talvez umas explicações se fosse preciso, para melhorar notas baixas ou chegar a um patamar mais alto...
   Consegui disfarçar que este ambiente incomodava-me e que não era grande adepta do evento de caridade, até sair daquele palco e ter encontrado o Eduardo, que encaminhou-me para um sítio mais reservado com pouco movimento. E aí as lágrimas caíram. Ao recuperar do deslize que tive, ainda fiquei mais uns minutos rodeada pelos braços do Sílvio.

-Queres desabafar? - perguntou-me, depois de nos separarmos, e agarrei nas suas mãos, ficando a mirá-lo.

- Senti a tua falta. Uma das únicas coisas más na minha vida foi o facto de nunca mais ter tido contacto contigo, depois de ir morar com os meus pais. - escapou dos meus lábios num murmúrio.

-Foi estranho para mim viver sem ti.

-Como foi?

- Deixei de infringir regras. -sorriu ao lembrar-se provelmente de algum momento.

- Nunca mais foste apanhado a roubar latas de atum?

-Não. Nem isso nem a...

Para meu espanto o Miguel apareceu no local da festa onde estávamos, aparentemente a comunicar com alguém através do telemóvel.

-Resumindo... - falou novamente, assim que percebeu que não havia perigo e que não iria incomodar o Miguel, pensei eu. - Tornei-me mais responsável, dedicado e... Acho que não consigo resumir 20 anos em poucas palavras.

-Deveriamos marcar um dia para atualizar as nossas vidas, se quiseres. - recomendei.

-Um dia? Nem um mês chega! São 20 anos a dobrar. Talvez um ano? E claro que quero, isso nem se põe em causa.

   Sorri quando falou entusiasmado, era evidente que ambos queriamos voltar a fazer parte da vida um do outro.
Saber que não era a única ainda aumentava mais a minha felicidade.

    A chamada do Miguel terminou, e sem aperceber-me ele abordou-nos cumprimentando o Sílvio, como se fossem conhecidos. A curiosidade bateu-me à porta. Eu não sabia nada sobre a vida dele, o mais provável era serem amigos, visto que também pouco sei sobre a vida do meu chefe.

- Como vai a tua filha, a Beatriz? - perguntou o Miguel ao Sílvio.

Amigos, se não, não sabia o nome da filha.

- A crescer de pressa. - respondeu o Sílvio.

-Imagino, se calhar já não a reconheço.

-Ela é que com certeza o re... - parou de falar e olhou para mim.- Desculpa não te o apresentei... Migu...

-Nós conhecemos-nos. - interrompi-o.

- Ah sim...

- Trabalhamos juntos. - informou o Miguel.

-És advogada? - perguntou admirado e eu fiquei sem reação.

-Pai!!! Estás aqui!!

   A Beatriz, filha do Sílvio, apareceu e correu para ao pé dele. Atrás vinha a Inês Eduarda, a sobrinha do Eduardo que, quando me viu abraçou-me.

-Andávamos à tua procura... Doutor Miguel!

Doutor? Teoria descartada.

- Olá Beatriz.

- Sabe, eu vim chamar o meu pai para dançar, também tem que vir, vai gostar.

-Vamos todos! - a pequena agarrada às minha pernas pediu.

- Está bem.

   Dei um mimo no ombro da Inês, e todos conformados com a ideia de ir dançar, começamos a andar em direção à pista. O Sílvio, consegui perceber naqueles instantes que adorava crianças. Deu a mão às duas meninas, falando coisas engraçadas. Acabei por ficar para trás e o meu nome foi pronunciado pelo Miguel. Parei de caminhar e olhei para trás, graças à minha visão de 180 graus notei que o Sílvio também olhou para trás, mas logo desviou assim que o Miguel fez um aceno afirmativo com a cabeça.

Queria dizer que está tudo bem e não há problema? Provável.

- Sim?

- Ouvi o teu discurso, com certeza não foi fácil de proferir tudo. - disse aproximando-se de mim.

-Não foi mesmo, eu não sabia para o que vinha.

-Tornou as coisas piores?

-Não sei, mas se queres saber, sinto-me aliviada.

-Posso abraçar-te? Faz bem...

-Sim, claro. - o abraço foi suficientemente apertado para sentir-me bem e confortável. - Obrigada pela atenção.

Ao separar-nos uma das minha mãos foi puxada para cima, ele tinha-a agarrado e fez com que eu gira-se.

-Vamos para pista de dança? - perguntou-me.

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