O1. meet me in the afterglow

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      Já eram seis e quinze e o despertador tocava pela quarta vez após ser continuamente ignorado. Na tentativa de desligá-lo de uma vez por todas, o acabei derrubando no chão, o que fez barulho suficiente para que eu despertasse do susto. Ao ver as horas quando olhei para baixo, arregalei os olhos e corri para o banheiro. Tinha que estar no colégio pelo menos às 7h00; se eu recebesse mais uma notificação por atraso minha mãe me mataria e serviria em um jantar aos professores como compensação.
      Tomei o banho mais rápido que pude e vesti o uniforme de forma desajeitada, descendo as escadas correndo e quase tropeçando entre um degrau e outro. Sem tempo para fazer uma refeição decente, duas torradas devoradas em menos de três minutos deveriam servir como café da manhã antes que eu pegasse minha bike e saísse pedalando tão rapidamente pela rua que já estava com a garganta seca e a respiração quente antes de virar a terceira esquina. eu sempre evitava ir ao colégio de bike, mas àquela hora o ônibus com certeza já estava bem longe dali. Checando o relógio a cada segundo, faltavam menos de quatro minutos para as 7h00, foi quando tive a impressão de que o chão se desfazia às minhas costas e tentei pedalar o mais depressa ainda (como se isso fosse possível), ignorando os xingamentos e as buzinas desesperadas dos carros que eu negligenciava nos cruzamentos.

      Os portões estavam quase fechando, por pouco ficaria barrado. Estacionei a bike de qualquer jeito no bicicletário e fui correndo para a minha sala que ficava no segundo andar. A porta já estava fechada e pela pequena janela retangular vi o Prof. YoonSung. Ao dar duas batidinhas na porta, olhei para o relógio e vi que já haviam se passado dezenove minutos. Meu estômago despencou. Ele era o nosso professor mais rígido e consequentemente a última coisa que qualquer aluno seu queria era tomar uma bronca dele, rapidamente lembrei que já vi alguns serem mandados à direção por ele nessa mesma situação.

      — Pois não... — adiantou, antes que me visse ao abrir a porta da sala. — Ah, sr. Minseok, não acha que está atrasado para a aula?

      O seu olhar me analisou de cima a baixo. Sua cara denotava um descontentamento colossal em me ver ali na sua frente. Minha roupa estava toda amassada e mal arrumada e eu suava como um porco. Podia sentir a raiz do meu cabelo úmida e minhas axilas estavam pegajosas. E eram apenas 7h19 de uma manhã fria de outono.

      — Perdão, senhor, não ouvi o despertador tocar e quando acordei vim o mais depressa que consegui — falei, ao mesmo tempo que tentava recuperar o fôlego.

      — Uma bela justificativa, não acha? Você sabe que posso e devo levá-lo à sala do diretor, não sabe? — disse, com um tom de desprezo em sua voz e eu olhei para o chão engolindo em seco e assentindo com a cabeça. — Para isso eu teria que ir até lá com você, mas, como estou no meio de uma explanação importante, irei relevar. Você pode entrar hoje, mas que esta seja a primeira e última vez que faça isso na minha aula.

      Agradeci com uma exagerada reverência e entrei na sala no mesmo instante antes que ele mudasse de ideia, sentando na carteira vazia mais próxima que encontrei. Quando o Prof. YoonSung fechou a porta olhou para mim e complementou seu sermão:

      — Para compensar sua falta de disciplina, no fim da aula, irei lhe passar um exercício e o quero respondido até o último toque do sinal.

      Concordei suspirando frustrado e assim que ele voltou à aula corri os olhos pela sala em busca de Chen, que estava logo atrás de mim e deu um tapinha na minha cabeça me mandando ficar quieto e prestar atenção na explicação. Dei um leve sorriso e comecei a escrever o que estava na lousa, um pouco mais satisfeito por tê-lo visto. Quando o intervalo tocou e Chen ia saindo da sala o chamei e perguntei aonde estava indo.

      — Dar uma volta — disse, indiferente, e saiu antes que eu pudesse sugerir ir junto.

      Chen não costumava ser assim. Sempre passávamos os intervalos e qualquer tempo vago juntos, rindo e falando de assuntos que só eram interessantes aos ouvidos um do outro. Nos tornamos inseparáveis desde o 1º ano, mas há umas semanas seu comportamento estava me fazendo questionar a definição de "inseparável". Pensei em ir atrás dele, lembrá-lo de que eu ainda existia, e até o segui sorrateiramente ao jardim. Sentado na sombra de uma árvore ele observava uma rosa em sua mão, o jardineiro teria arrancado o pouco de cabelo que lhe restava na cabeça se visse a cena de alguém depenando as roseiras que ele se empenhava tanto em cultivar.
      Mas parei antes de abordá-lo, de repente achei que precisasse de um tempo, quisesse ficar um pouco sozinho, qual o problema, e por isso fui embora em seguida, outra hora talvez pudéssemos conversar. Estava voltando para a sala quando encontrei Tao no caminho, ele era meu amigo de infância, nos conhecíamos desde o maternal e desde então sempre estivemos juntos. Naquele colégio, embora eu tentasse fazer novas amizades às vezes, sempre foram Tao e Chen as únicas pessoas mais próximas de mim e eu estava feliz assim.

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