1O. sanity for lunch

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      Algumas coisas já não faziam mais tanto sentido para mim e eu não sentia mais vontade nem de levantar da cama. Faltei por uma semana inteira à faculdade e o pior é que eu sequer me importava com isso. Mesmo assim meu semblante era calmo, mais sereno do que nunca... mas ninguém poderia imaginar o que aquela expressão sem vida escondia. Era difícil achar uma maneira de organizar os pensamentos, que em contramão ao meu humor, eram turbulentos na minha cabeça.
      Sempre que o Sol se despedia do céu, trazendo a noite escura e silenciosa para ocupar o seu lugar e eu me encontrava sozinho no meu quarto, tudo aquilo vinha à tona... a dor de lembrar perfeitamente o som que as palavras de Chen faziam ao sair de sua boca me dizendo aquelas coisas insensíveis; a confusão física e mental que tomava conta do meu corpo por não conseguir ainda processar ao certo o que eu sentia... se era raiva, tristeza, decepção; e a minha sombra demoníaca, me observando do canto do quarto, como uma víbora esperando o menor sinal de fraqueza para dar o seu bote, e ela sempre dava.
      Eu agarrava meu travesseiro e chorava baixinho ao me dar conta de que estava completamente perdido dentro da minha própria cabeça, naufragando em meus pensamentos. Poucas eram as vezes em que eu saía para qualquer outro cômodo da casa e quando o fazia era sorrateiramente pela madrugada quando tinha certeza de que não precisaria ter contato com ninguém.

      — Querido, abre a porta, por favor. — Mamãe batia no meu quarto naquela manhã.

      Fixando incansavelmente o teto branco eu sequer me dava o trabalho de responder, mesmo estando completamente acordado por ter passado mais uma noite em claro. Adormecer havia se tornado meu pior medo desde aquele dia, pois sempre que fechava os olhos e relaxava, via Chen aonde quer que minha mente me levasse.
      Quantas vezes não acordei por volta das 3 da manhã após ter um sonho tão real com ele? E então eu me encolhia na cama e tornava a chorar, desiludido, pois tudo não havia passado de um sonho e eu jamais poderia tê-lo novamente como antes. Eu não o via mais como antes. Mas nossos sonhos deveriam ser bons e a angústia que se instalava no meu peito ao acordar estava longe de ser uma sensação boa...

      — Minseok, abra a porta — disse ela, batendo mais uma vez. — Sei que está acordado.

      — O que você quer, mãe?

      — Onde você quer chegar com isso? Não saiu do quarto nem pra comer desde ontem.

      — Não tô com fome.

       O que, de certa forma, era verdade. Meu apetite havia diminuído tanto que em quatro semanas já havia perdido mais peso do que ganhei em meses, e isso estava deixando minha mãe louca. As poucas refeições que eu fazia durante o dia, quando o fazia, era apenas para que ela parasse de pegar no meu pé como se eu tivesse 9 anos mais uma vez, me tratando como uma criança anêmica e me obrigando a comer até a última migalha no prato.

      — A menos que você esteja dentro de um vaso e fazendo fotossíntese no tempo que fica aí trancado, eu não acredito nisso.

      Embora desde aquele dia com Chen na orla da praia eu estivesse muito mal (e isso fosse muito perceptível), não queria e nem tinha coragem de tratá-lo de outra forma, até tentava parecer melhor para ele. Para falar a verdade, Chen foi a única pessoa com quem eu mantive algum contato nesse meio tempo, de forma virtual, claro, pois eu não tinha estômago para olhá-lo nos olhos novamente, mesmo que cada músculo do meu corpo e minhas entranhas implorassem por isso. Assim me recusei a demonizar a sua imagem, o que só fez minha percepção de que aquilo fora um mal entendido aumentar.
      A cada dia que passava eu tinha recaídas e chorava por toda a noite, sempre com o pensamento de que isso seria passageiro, o que estava longe de ser reconfortante, pois aquele sentimento parecia cravar-se cada vez mais em mim, como um tumor que crescia fora de controle. Um mal que mesmo que fosse superado, deixaria um vácuo enorme em mim.
      Tao me visitou por alguns dias, queria me fazer companhia, pois só ele sabia melhor da angústia que eu estava passando. Na faculdade estava mais invisível que nunca, então ele não tinha outra alternativa a não ser ir me encontrar em casa. Sua última visita foi em uma tarde fria de julho. Eu não estava em um dos meus melhores dias.

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