Positivo !

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As vezes o dom de alguém é cuidar de outra pessoa.

1.Negação é uma habilidade que eu dominava na adolescência.

Não pense nisso. Não fale disso. Engula isso. Engasgue com isso.
Não chorei na noite em que meu pai faleceu.

Nem quando o xerife Mitchell veio até a nossa casa para nos levar ao
hospital, ou quando o médico nos contou que não conseguiram salvá-lo.

Não derramei uma lágrima durante o velório ou o enterro.Obrigada por ter vindo.

Sim, serei forte para minha mãe.
Você é tão gentil. Oito dias depois que ele estava embaixo da terra, minha mãe estava trabalhando no restaurante no andar de baixo. Eu estava na cozinha, tentando
abrir um pote de picles.

Fui até o quarto dos meus pais e chamei meu pai para ajudar. Foi aí que me toquei, olhando para o quarto vazio. Ele não estava lá. Ele nunca mais estaria lá.

Caí no chão e chorei igual a um bebê. Em cima de um pote de picles.

Esse é o mesmo conjunto de habilidades que me permitiu passar o resto da noite na casa dos Hernandez. Sorrio. Converso. Abraço todos para me despedir.

Bruno e eu voltamos para casa e fazemos amor. E não conto para ele.

Você não grita fogo em um cinema a não ser que tenha certeza de que há chamas.

Já viu… E o Vento Levou? Minha heroína é Scarlett O’Hara.

“Não posso pensar nisso agora. Pensarei amanhã”.

Portanto, este é meu plano. Pelo menos por enquanto. O amanhã chega rápido.

Parece que Deus tem um senso de humor doentio. Porque a qualquer lugar que vá, tem algo sobre gravidez.

Dê uma olhada:

O homem passeia com cachorros ao meu lado na calçada, a policial guia o trânsito, o homem na capa da revista People na banca de jornal, a executiva no elevador apertado que parece contrabandear bolas de ginástica por baixo de sua blusa.

Cubro a boca e mantenho distância, como uma turista tentando evitar a gripe suína.
Enfim, chego na gravadora. Sento-me à mesa e abro minha fiel planilha diária.

Sim, ainda uso uma agenda de papel. Bruno me comprou um Black-Berry de Natal, mas ainda está na caixa. Não confio em nenhum dispositivo que pode jogar
meu trabalho em um abismo desconhecido com o toque de um botão.

Gosto de papel. É sólido, real. Para destruí-lo, você tem que queimá-lo.
Normalmente, sou um pouco controladora. Anoto tudo.

vivemos e morremos seguindo o cronograma. Mas, ultimamente, tenho estado distraída, preocupada com o cansaço e o sentimento geral de inutilidade.

Então, me esqueci do fato de que tinha começado uma nova cartela de anticoncepcionais, mas não tinha menstruado na última.

Falando sobre anticoncepcionais.... O que é que tem?
Noventa-e-nove-vírgula-nove-por-cento de eficácia, vá se ferrar.

É a mesma exatidão estatística daqueles testes de gravidez que você tem de fazer xixi no pauzinho, por isso que não vou nem chegar perto de um desses.

Em vez disso, pego o telefone e ligo para o escritório da doutora Roberta Chang.

Lembra-se dos quatro alunos que moravam comigo, com a Deia e com o Yago fora do campus na Pensilvânia? Bobbie era uma deles. Seu marido, Daniel, era o outro.

Bobbie é uma pessoa incrível. Seus pais vieram da Coreia quando ela ainda era um bebê. Ela é pequenininha, o bastante para comprar roupas em loja de
crianças, mas tem a personalidade de uma amazona.

Ela também é uma ótima ginecologista e obstetra.

Recomendo-a como médica para vocês aí.

Bob e seu marido se mudaram para Nova York faz apenas alguns meses. Não a vejo há anos, mas nossa amizade é uma daquelas que continua firme, mesmo se
ficarmos uma eternidade sem nos falar.

Quando nos encontramos, parece que não ficamos longe nem um pouquinho.

Marco uma consulta e, automaticamente, anoto na minha agenda.

        " Bob – 19h."

Fecho a agenda e coloco-a na mesa perto do telefone. Depois, olho para o relógio e percebo que estou atrasada para uma reunião.
Merda.

Pego uma pasta e saio da sala,
Ainda não estou pensando nisso… caso queira saber.

Quando volto depois de duas horas, Bruno está sentado à minha mesa,
impaciente, batendo uma caneta no mogno escuro. Na maioria das vezes, a gente almoça junto, pede comida e divide em uma das salas.

Kate: Oi.

Ele olha para cima.

Bruno: Olá.

Kate: Já pediu ou estava me esperando?

Ele parece confuso.

Bruno: Hã?

Me apoio na ponta da mesa.

Kate: O almoço, Bruno. É por isso que está aqui, né?

Ele mexe a cabeça.

Bruno: Na verdade, queria falar com você sobre o jantar. Um novo restaurante abriu em Little Italy, e estou com uma vontade de comer massa. Ia reservar para
nós esta noite. Às sete.

Congelo.

Não sou muito boa em mentir. Bom, não desde o Ensino Médio. Até mesmo naquela época, não havia muitas mentiras de verdade. Eram mais… omissões de atividades que minha mãe surtaria se soubesse.

Renda-se 2Onde histórias criam vida. Descubra agora