Maldições são facilmente confundidas com dadivas quando envolvem dinheiro. Se um homem perder sua mulher e filha, mas ganhar na loteria no dia seguinte, ele facilmente poderia dizer que foi um presente para compensar sua perda. Como, eu pergunto, um punhado de folhas de papel moeda, podem vir a compensar duas vidas perdidas?
Leonard sabia o quanto o peso da maldição era insuportável. E estava maior ainda enquanto ele corria desenfreadamente pela rua, só percebera o quanto seu cabelo estava comprido, ao senti-lo atrapalhando sua visão. A vista turva e a falta de iluminação prejudicavam muito a fuga do rapaz, mas ele não parava, suas pernas quase se movimentavam sem nenhum comando, o instinto natural de fuga do ser humano, liberou nele uma carga de adrenalina surpreendente. Leonard correu, correu até seus joelhos cederem.
A queda foi brusca, agora ele estava com o corpo colado ao chão, a chuva incessante que caia, criou poças no chão, que agora ficavam manchadas de sangue, a suave mistura do transparente com o vermelho vivo, os cabelos loiros, estavam agora escuros e os fios grudados pelo sangue pegajoso. Leonard abriu os olhos e viu sua mão espalmada nos ladrilhos da rua, que agora, um a um, lentamente, se transformavam em ouro puro, a água, em ouro liquido, tudo em que suas mãos tocavam, aos poucos, se transformava em ouro.
-França, Franconville, 06:47 A.M.-
Leonard levantou-se num pulo na cama, a respiração falha, a pele formigando com o arrepio, os lábios secos e os cabelos úmidos. Ele passou as mãos no rosto, as luvas de couro não ajudavam muito a limpar o suor, então ele se direcionou ao banheiro, a água gelada começou a cair em seu corpo, fazendo-o despertar e sentir seus músculos contraírem. Ele apoiou-se no ladrilho da parede com as mãos, não demorou muito para seu despertador tira-lo do transe e força-lo a terminar o banho. Uma leve brisa entrou pela janela, fazendo-o estremecer e se deslocar para fechar a janela e a visão que ele teve, fez um sorriso brotar no mesmo instante, lá estava ela. A Moça Verde, era como ele apelidara a moça de cabelos ruivos que sempre estava trajando uma blusa verde pelas manhãs, era seu uniforme de atendente da padaria em frente à casa de Leonard. Ele raramente a via antes de estar na frente dela pedindo o mesmo café forte com canela de todos os dias, era sempre uma boa surpresa, a garota emanava uma energia positiva inigualável.
O rapaz respirou fundo e vestiu-se para o trabalho, checou-se no enorme espelho localizado no centro do igualmente enorme quarto e saiu. A rotina de uma pessoa amaldiçoada não era muito diferente de uma pessoa normal. Bem, pelo menos até aquele dia.
- Está atrasado essa manhã. - A Moça Verde disse sorrindo enquanto preparava o café de Leonard. - Como vai?
- Já estive melhor. - Ele respondeu com o mesmo sorriso no rosto. - Eu, me distraí por alguns minutos.
Ela o entregou o café e o croissant de brinde como sempre, mas havia algo de diferente nela hoje, ela parecia mais radiante. E o motivo ficou claro em minutos, um garoto esguio saiu dos fundos da loja e abraçou a garota, haviam alianças prateadas nas mãos de ambos. Merda. A Moça Verde agora tem um namorado verde. Leonard suspirou e acenou para os dois, deixando o local, ele colocou seu café da manhã no banco do passageiro e partiu com seu carro em direção ao centro. Não podia dizer que estava feliz, A Moça Verde era provavelmente, a maior interação humana que Leonard possuía naqueles tempos de caos em que viviam, a tecnologia corrompera tanto as pessoas, que encontrar alguém que te cumprimente com um sorriso todas as manhãs é raro.
Agora ele sentia-se um pouco triste, a imagem do abraço do casal verde não lhe saia da cabeça. Um abraço, a porcaria de um simples abraço, era algo simplesmente impossível para ele, a não ser que ele quisesse transformar a pessoa em uma estátua de ouro. Ele respirou fundo e seguiu seu caminho, morava perto do trabalho, mas isso não tornava o trajeto e sua rotina mais fácil. Leonard parou o carro e sentindo o gosto amargo da vida e do café, ele se direcionou para o prédio do departamento de polícia de Franconville, não era um lugar perigoso para se morar, então seus dias como agente duraram pouco, logo ele pediu transferência para algo em que ele pudesse ser mais produtivo. A resposta de seu supervisor foi: Arquivos. Leo passou cumprimentando os agentes que fingiam estar trabalhando em casos importantes, mas o assunto da vez era o jogo do Paris Saint-German que perdeu para uma goleada do Barcelona, time para o qual Leonard secretamente torcia.
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Gold (O Projeto Zodíaco)
Science Fiction- Breve Hiatus - "Primeiro vem a bênção de tudo que você sonhou. Mas então vem as maldições de diamantes e anéis Só a princípio teve o seu apelo? Mas você não pode diferenciar o falso do verdadeiro Quem você pode confiar? Quando tudo, tudo, tudo que...