8 - PHILLIP, MEU FILHO

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Sebastian foi por bastante tempo dependente de heroína, e não era pouca. Foi na linha 8
que o vi pela primeira vez. Vendia jornais e dormia numa instituição da Solmstraβe para
jovens sem-teto. Diariamente ia e vinha entre Wittenau e Gesundbrunnen, exatamente como
eu, e era muito bonitinho, grande e magro, com cabelos escuros e olhos verdes-claros.
De início não ousei falar com ele, que tinha um jeito meio arrogante e não parecia
interessado. Além disso, era dezoito anos mais novo e, naquela época, eu não me sentia muito
bonita e nada sexy.
Pouco tempo antes, tinha feito um voo planado do alto do mezanino da Pflügerstraβe,
numa noite em que estava muito doida. Havia tomado remédios para dormir e mais heroína,
Mandrax e codeína. Um pouco de cada coisa. A cama tinha só uma proteção baixinha na
lateral e caí dormindo. Dois metros e quarenta de queda livre e eu completamente chapada.
Fiquei com o ombro direito e o braço em frangalhos.
Um amigo que estava na minha casa por uns dias chamou uma ambulância e fui direto
para o hospital. Não podiam engessar braço e ombro, por isso me internaram em observação
por alguns dias. Obviamente pirei, em crise de abstinência. Isso foi em 1995 e até então nunca
tinha ouvido falar da metadona.
Antes, os médicos davam no máximo codeína como calmante, para quem estivesse
querendo se desintoxicar na marra. Mas nessa época foram lançados os primeiros programas
à base de metadona — e foi como comecei a substituição.
Quando me deixaram sair, marquei de ir a um consultório médico ou hospital que
distribuísse metadona em ambulatório, para ter minha dose. Como não havia muitos médicos
que atendessem nesse ramo, tinha que pegar as linhas 7 e 9 até Turmstraβe para ir ao
hospital de Moabit.
Um dia, estava sentada na recepção e vi o vendedor de jornal bonitinho da linha 8 sair da
sala de enfermagem resmungando: “velha bruaca”. Não pude deixar de rir porque também a
achava muito antipática. Hoje sei que na verdade todos os médicos especializados na
substituição de heroína são desagradáveis e desinteressados pelo paciente como pessoa.
Drogados e médicos formam uma relação puramente utilitária, em que uns são pagos e
os outros recebem mais droga do que poderiam comprar. Só isso.
Então dei uma boa risada vendo a irritação do rapaz. Ele olhou para mim querendo
comprar briga.
— O que tem de tão engraçado?
— Calma, ela também já pegou no meu pé.
Por que está reclamando? — perguntei.
— Ela fica toda nervosa por causa de 17 mililitros — respondeu ela.
Minha cota era de 12 mililitros de metadona e também achava insuficiente.
Hoje em dia, com 51 anos e depois de quase vinte de substituição, sei que é muito. Da

maneira mais séria do mundo, Sebastian achava 17 mililitros insuficiente. Era o bastante para
matar um cavalo. As mais altas dosagens de que ouvi falar são de 23. Com mais do que isso,
até o junkie mais dependente e miserável passa dessa para melhor.
Sebastian e eu rapidamente ficamos loucos um pelo outro. Ele me contou sobre sua vida:
tinha nascido na Baviera em 1972. A mãe era homeopata e o pai havia abandonado a família.
Quando tinha 6 anos, outro homem entrou na vida da mãe. Três ou quatro anos depois,
ele ganhou meios-irmãos e irmãs. Mas Alfred, o padrasto, e Sebastian não se suportavam,
desde o início. Os dois formavam uma mistura explosiva sob o mesmo teto. Sebastian
compensava a frustração e solidão fazendo todo tipo de estupidez. Exatamente como
aconteceu comigo, os amigos se tornaram sua nova família. Mas não eram boa influência. Ele
começou a fumar maconha e a testar um monte de drogas à noite, quase deixando de ir à
escola.
Quando seu comportamento em casa se tornou incômodo demais, ele foi para a casa do
pai biológico. Na verdade, só o conhecera dois anos antes, aos 15, e foi morar com ele, em
Hamburgo. Os dois tiveram uma boa relação afetiva, e o pai o fez entender a gravidade de seu
problema com as drogas. Mas os velhos hábitos estavam incorporados, e Sebastian voltou à
Baviera e aos amigos. Depois de passar várias noites se drogando, acabou aceitando o que o
pai havia dito e procurou as melhores clínicas do país especializadas em desintoxicação.
Depois de quase um ano de tentativas, foi finalmente admitido como paciente em
Grunewald. Um ano mais tarde, já sabia quase tudo sobre os efeitos da droga e sobre os
mecanismos da dependência. Até aí, tudo bem.
Mas, quando teve permissão para sair, sozinho no mundo e sem ter a menor ideia do que
fazer da vida, viu-se de novo na rua. Sem dinheiro, sem lugar para morar, sem objetivos. Em
muito pouco tempo estava de novo mergulhado no vício.
Todo mundo, é claro, detesta isso. Não conheço um junkie que se sinta contente de
voltar. É preciso mentir tanto para tanta gente que você acaba ficando bom nisso. Mas a
principal vítima dessas mentiras é você mesmo.
“É a última vez.” “Só mais uma vez.” E no fundo o drogado sabe que algo em si mesmo e
na sua vida não bate bem.
Mas a ideia da mudança assusta demais e com isso você se atola uma vez mais para
esquecer toda aquela merda. Uns aprendem a viver com isso, outros morrem. Há uma linha
tênue entre os dois.
Não sei dizer exatamente o que faz essa distinção. O importante é não deixar que a vida
se passe única e exclusivamente em torno da droga, que você não pense somente em droga,
em conseguir droga e em consumir droga.
Quem não tem esse tipo de problema simplesmente não consegue compreender.
Quando duas pessoas têm experiências em comum, as coisas entre elas se passam com
mais facilidade. A maior parte daqueles que não conhecem o que vivi não conseguem me
entender. Como alguém que cresceu mimado e protegido, que sempre pôde contar com os
pais, vai entender que eu desconfie mesmo de quem amo? Sei por experiência própria que os
que estão mais próximos de mim são os que mais podem me machucar.
Como compreender algo assim, como alguém que nunca viveu nada parecido pode

interagir com minha angústia? Somado a isso, como eu mesma poderia estar com alguém
assim?
Meus relacionamentos com Gode e Alexander tinham mostrado que isso não dava certo e
eu já havia sofrido o suficiente.
Sebastian e eu estávamos tão loucos um pelo outro porque nos encontrávamos na
mesma situação e sabíamos disso. Mas perceber que além do passado semelhante não
tínhamos, afinal, grandes coisas em comum também machucava muito.
Apesar da sua situação, Sebastian se cuidava. Tomava banho na minha casa ou na
Solmstraβe. Eu me sentia bem vendo um rapaz bonito como aquele interessado em mim. Mas
na verdade ele raramente estava presente. Era a época das raves. Sebastian descoloria os
cabelos, usava roupas fosforescentes e ia a festas que não terminavam nunca. Dançava na
Love Parade e incendiava a boate. Tinha seus próprios truques contra o cansaço.
Phillip foi gerado em janeiro de 1996.
Quando vi que estava grávida, pensei: “Já que fui estúpida o bastante para não tomar
cuidado, tenho mais é que assumir as consequências!”
Estava fora de cogitação fazer outro aborto.
Tinha 33 anos e, mesmo sem ter planejado,
achei ser uma das minhas últimas oportunidades de ter um filho.
Além do mais, estava limpa; o que mais poderia querer? Tinha todas as condições que
precisava. Não se deve também ser mãe jovem demais.
Do início ao fim da gravidez, as laricas e os enjoos brigavam para ver quem ganhava. Pela
manhã me sentia mal, à tarde corria para comprar picles, arenque ou ovos marinados.
Depois meu estômago resolvia se livrar de tudo isso e o equilíbrio eletrolítico voltava a
ficar de cabeça para baixo porque eu vomitava e tinha novamente vontade de me empanturrar
de alimentos ácidos e salgados.
Foram nove meses difíceis. Fiquei aliviada de ver que, no final, ganhei apenas 1 quilo a
mais além do peso do bebê. De repente, fiquei cheia de sardas — os hormônios estimulam a
pigmentação em algumas mulheres — e minha pele ficou incrivelmente sensível. Sentia a
mais leve brisa, o menor sopro de vento.
Realmente não posso dizer que eu era uma futura mamãe entusiasmada. Tentava não me
empolgar com a ideia de ter um filho, com medo de que alguma coisa desse errado. O que
faria se estivesse morto? Também não queria pensar em como se chamaria. Pois é, nem
procurei saber se era menino ou menina.
Não fiz ginástica nem qualquer um desses exercícios preparatórios para o parto, apesar
de certa insistência de Sebastian.
Mulheres têm filhos há milhões de anos sem precisar de toda essa lenga-lenga. Para
mim, o essencial era conseguir descansar e proteger minha barriga. Estava o tempo todo
afastando as pessoas que estivessem perto demais para que não esbarrassem. O médico que
fazia a substituição então me propôs um acordo: tentar parar com a metadona. Mas eu tinha
medo de que as coisas de repente se complicassem na minha cabeça e eu desandasse a fazer
besteiras. Depois de conversar, apenas tiramos 1 mililitro da minha dose na clínica de

Virchow.
Num domingo, acordei com uma dormência no ventre. Mas não corri para o hospital
porque tinha visto uma mulher com contrações irregulares e que duas vezes fora mandada
embora. Inacreditável! (Ela não tinha dinheiro suficiente, faltava lugar ou não sei o quê.
Achei a atitude do hospital realmente horrível, pois quem está grávida pela primeira vez não
sabe exatamente o momento certo de dar à luz. Precisava apenas de um apoio e foi mandada
embora!)
Depois de me levantar, procurei minha irmã Anette. Ela perguntou:
— As contrações são regulares?
Não, não eram regulares, mas, quando vinham, davam a impressão de que me partiriam
ao meio. E cada uma trazia um fluxo de adrenalina que me fazia falar sem que eu conseguisse
parar.
Ao mesmo tempo, tentei entrar em contato com Sebastian. Ele tinha uma espécie de
pager, como o que os médicos usavam. Quando finalmente me telefonou à noite, estava
numa cabine de telefone não muito distante da Tresor, uma das boates techno mais
conhecidas da Alemanha. Perguntou:
— Preciso ir?
Ouvindo a sua voz, tive a impressão de que havia tomado alguma coisa. Seria realmente o
caso? Não sei. De qualquer maneira, não queria que estivesse por perto naquele estado e
respondi:
— Não, tudo bem. Só liguei porque não estava me sentindo muito bem.
Depois disso as contrações pararam.
No dia seguinte, voltei à ginecologista, que fez um ultrassom. O consultório estava
perfeitamente tranquilo. Eles me deixaram deitada por um momento, e eu ouvia apenas o
zumbido da máquina e as batidas do coração do meu bebê. Sentia-me numa nuvenzinha e era
tão agradável que dormi.
Quando voltei para casa, Sebastian tinha enfim chegado e dormido um pouco. Como
raramente estava ali, começamos logo a nos agarrar e fizemos sexo anal. É ótimo quando se
está grávida. Mas depois tive imediatamente vontade de chorar, me dando conta de que
Sebastian e eu estávamos longe de formar uma família. E aí as contrações começaram de
verdade.
Como tínhamos ido para o mezanino, fui meio que escorregando pela escada. Doía
demais para descer normalmente. Enquanto isso, Sebastian dormia. E comecei a fazer coisas
estúpidas porque a dor estava me enlouquecendo. Deixei a cabeça no chão e colei a bunda no
alto do sofá de couro. Não queria que o neném saísse.
— Por favor, fica aí dentro. Não sei o que fazer. Por favor, não venha agora. — Eu não
parava de gritar e chorar.
Agarrei-me tão forte no sofá que quebrei todas as unhas.
Depois, com a bolsa já rompida, acabei jogando alguma coisa na cama e gritando com
Sebastian:

— Acorda, que inferno! Estou morrendo!
Só aí ele chamou a ambulância. Às nove horas do dia 24 de setembro. Fui levada para um
hospital de Neukölln.
O médico não parava de avisar a Sebastian: — Não posso cuidar de dois pacientes ao
mesmo tempo, rapaz. Você está bem pálido, sente-se um pouco.
Mas Sebastian foi corajoso. Com minhas veias maltratadas por tantas picadas, as
enfermeiras tiveram muita dificuldade para aplicar a agulha e tudo doía ao extremo.
Sebastian estava de pé ao meu lado e, enquanto elas procuravam desesperadamente um
lugar no meu braço para a aplicação, ele segurava a minha mão e enxugava a minha testa. Eu
suava como louca e gritava sem parar: — Sebastian! Sebastian!
Doía muito. Tudo aquilo foi demais para ele. Realmente não aconselho a mulher
nenhuma que leve seu homem como acompanhante à sala de parto. Não é bom para nenhum
dos dois, porque forçá-los a ver tudo aquilo é uma verdadeira tortura. Além de ser muito
constrangedor. Fiquei terrivelmente envergonhada que me visse sendo costurada por dentro.
Em duas horas, estava resolvido. Mas aquelas dores, nunca mais! Não conseguia
expulsar o neném e tinha a impressão de que meus olhos iam saltar das órbitas. Não fui nada
corajosa. Acabaram tendo que retirar a força, pois sozinha eu nunca teria conseguido. Ele
tinha 46 centímetros e pesava 2,8 quilos. Era minúsculo e nada amarrotado como tantos
recém-nascidos. Desde os primeiros instantes, Phillip era muito bonitinho. No momento em
que o vi e ele berrou ao perceber a luz, fui a pessoa mais feliz do mundo.
Não existem palavras que possam descrever isso. Aquele minúsculo ser que estava ali
precisava de mim. Nada mais importava. Dei um nome composto, sendo um deles Phillip.
Por causa de Philipp Keel de Zurique, só que escrito de maneira diferente.
Depois do parto, permaneci no hospital por uns dias. Era inexperiente demais para ir
logo para casa, tinha que aprender certas coisas.
Phillip foi um bebê adorável e muito tranquilo.
Nada estressante. Estar com ele era pura felicidade. Poderia cuidar de três ao mesmo
tempo. Detesto ouvir mães contarem o quanto os filhos as estressam. E, sem a menor
ternura, soltarem pérolas do tipo:
— Quando você dá isso ou aquilo, ou faz o que ele quer, a lembrança fica e ele vai sempre
querer que faça o mesmo.
Ora, são bebês! Vão querer que acredite que uma minhoca desse tamanho possa ser tão
manipuladora? Que chore só para me irritar?
São pessoas assim que ensinam aos filhos que a vida é uma constante luta. Que nada se
ganha sem esforço e a tudo se deve fazer por merecer, inclusive o afeto. São essas crianças
que crescem e vão estar sempre vigiando o que os outros têm, com medo de tudo. Que se
acham sempre fadadas ao fracasso. O mais importante é ensinar ao seu filho a confiar em si
mesmo e nos que estão a seu redor. Ensiná-lo a dizer: tudo vai acontecer da melhor maneira.
Para isso, é preciso começar não deixando que o bebê arrebente os pulmões só para ter o
que comer.

E é exatamente o que digo para alguns pais: — Seu neném está chorando, vá ver.
— Não, é melhor que chore. Se eu for, ele vai achar que vou até lá toda vez que reclamar.
Acho isso cruel demais. É de se esperar que a mãe dê pelo menos uma olhada quando o
filho chora. É por isso mesmo que está chorando! Mesmo entre os animais é o que fazem
todas as mães, inclusive à noite. Mas há mulheres que aprenderam com suas próprias mães
que devem dormir bem para poder cuidar direito da criança. É horrível. Nunca agi assim.
Sempre acordei antes de Phillip. Em certa época havia notado que ele sistematicamente
chorava entre uma e duas horas da manhã.
Tinha fome e, ouvindo, eu nem precisava olhar o relógio. Depois de compreender isso,
deixava a mamadeira pronta para entrar em ação quando necessário. Saía da cama à meia-
noite e meia, esquentava o leite e tudo ficava ao meu lado, esperando o chamado. Com ele
satisfeito, voltava a paz e todo mundo dormia tranquilamente. Não amamentei, sobretudo por
medo de repassar algum resto tóxico no meu leite.
Depois de ser mãe, fiz várias coisas pela última vez na vida. Me prostituir, por exemplo.
Foram só duas vezes, desde a época da estação do Zoo. Numa delas, pouco tempo depois
do nascimento de Phillip, Sebastian me arrancou o neném do colo durante uma discussão.
Não reagi para não correr o risco de machucá-lo.
Fui largada sozinha no meio do parque de Hasenheide com somente 5 marcos no bolso.
Resolvi então ir até um argentino que havia na esquina para tomar uma cerveja e tentar
me acalmar.
Mas então passou um cara louro de cabelos compridos, num Mercedes vermelho-vivo.
Causou uma boa impressão e, visivelmente, eu a ele. Parou o carro e transamos no banco
traseiro. Ganhei 50 marcos com isso.
Depois fomos a um bar e ele me pagou alguns Southern Comfort e, lá pelas tantas,
perguntou:
— Que tal outra?
Dei de ombros:
— Pode ser. Mas detesto transar quando estou alta.
Fiz isso, é claro, mais para me vingar de Sebastian. Na manhã seguinte, estava de volta
em casa.
Ficamos ainda algumas semanas juntos. Por causa do neném. Tentamos dar um jeito,
mas Sebastian era novo demais e não podia assumir aquelas responsabilidades.
Com seis semanas, Phillip quase morreu.
Começou a tossir muito, sem parar. Já passava o tempo todo no pediatra, por causa da
quantidade de exames que todo recém-nascido faz. É uma vacina aqui, um exame de sangue
ali, e controles de tamanho, de desenvolvimento, de metabolismo. Tudo que eu fazia era me
ocupar daquela coisinha.
Phillip era um bebê muito calmo, mas também acontecia, é claro, de acordar, gritar,
chorar, ter fome ou sede. Certa noite, porém, foi diferente, e ele começou a tossir e a se

engasgar. Peguei-o no colo, colado ao meu ombro esquerdo como fazia sempre e andei de um
lado para outro no quarto, saltitando às vezes para ver se aquilo passava. Mas estava piorando
e seria impossível pregar o olho.
De repente tive a impressão de que Phillip não estava conseguindo respirar e o corpo dele
ficou azulado. Peguei correndo cobertor, mamadeira, carteira do seguro médico, toda a
documentação e corri ao pediatra o mais rápido possível. Sabia que na porta do consultório
teria um cartaz indicando o endereço de um médico de plantão. Sorte nossa: não era muito
longe.
Quinze minutos depois, invadi o consultório com o carrinho abarrotado, gritando
apavorada:
— Meu filho está com coqueluche, ajudem por favor, está sufocando!
Nunca, em tempo algum, se deve arriscar um diagnóstico diante de um médico. Aprendi
nessa ocasião.
— É uma bronquite. A senhora mora em Neukölln e esta região está cheia de recém-
nascidos na mesma situação. Estamos no outono, é uma epidemia — disse o médico depois de
examinar meu bebê por dois minutos.
Era um homem com mais ou menos 40 anos, de cabelos curtos, louros e agrisalhados,
bem magro. Fitava o vazio com uma expressão indiferente por cima dos óculos sem armação,
encostando o estetoscópio no peitinho de Phillip. Não me olhou uma única vez, apenas
assinou a receita sem uma palavra; prescreveu um xarope para a tosse e remédios para
abaixar a febre. E nos mandou embora.
— Ele vai ficar bem — garantiu. — O próximo, por favor.
Eu queria muito acreditar quando o médico disse que Phillip não tinha nada de grave. E
ele de fato ficou melhor por alguns dias, mas depois voltou a tossir da mesma maneira.
É terrível para uma mãe ver seu bebê sacudido pela tosse e não poder fazer nada. Eu dava o
xarope e vigiava como se vigia leite no fogo, indo o tempo todo ao berço para verificar se não
estava ficando azul de novo.
Não queria também me tornar uma dessas mães paranoicas que correm ao pediatra por
qualquer coisa. Com a fama que tenho, todo mundo, de qualquer maneira, pensa logo o pior
de mim, sobretudo os médicos. É assim que as coisas são, e tenho que levar isso em
consideração.
Nunca me senti tão impotente. Phillip tossia a cada inspiração e de novo não o ouvia
mais respirar. Corri diretamente ao médico de plantão, pois de novo era noite. Mais uma vez,
mandou-me de volta com alguns remédios: — A crise dura de uma semana a dez dias, mas
depois tudo entra nos eixos — disse o grosseirão me dando alguns tapinhas no ombro, como
se eu fosse uma garotinha que acabara de fazer uma besteira.
Ele havia injetado algo no neném que de fato o acalmou um pouco. Mas, no dia seguinte,
quando Phillip ficou totalmente azul, fui diretamente ao serviço de apoio à infância.
— Façam alguma coisa, os médicos não me levam a sério. Precisam me ajudar, meu filho
precisa de um tratamento sério. Está com coqueluche. Sei porque também tive quando era
bebê e minha mãe me contou. Façam alguma coisa!

Uma mulher da assistência social nos levou ao hospital. Lá Phillip foi imediatamente
deixado em quarentena e ligado a um monte de tubos e máquinas para controlar o coração e a
respiração. Diagnóstico: coqueluche!
Armaram uma cama para mim, um desses negócios que despencam para frente ou para
trás assim que a gente muda de posição. De qualquer forma, eu mal conseguia fechar o olho,
como poderia dormir? De vez em quando, as pálpebras caíam sozinhas — quando isso
acontecia eu me esticava um pouco na cama de armar.
Várias vezes acordei com o alarme que disparava quando Phillip tossia. Dava um pulo de
2 metros, de tanto que aquilo zumbia nos ouvidos. É um barulho horrível. Eu pegava meu
filho e batia de leve nas costas dele para que pudesse respirar. Tinha visto as enfermeiras
fazerem e não era complicado.
— Respira, filhinho! Vamos, respira!
E foi assim por uma semana. Pouco a pouco as coisas se arranjaram. Não faço ideia de
quantas crianças foram contaminadas naquele consultório por causa do pediatra que não me
deu ouvidos.

Eu, Christiane F., A vida apesar de tudoOnde histórias criam vida. Descubra agora