Pai

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Agosto de 2003

Eu sou apenas uma criança, eu não entendo. Claro, é o que eles seguem me dizendo. Meus pais estão se divorciando, e eu nem sequer sei o porque. Parecíamos tão felizes, tão bem. Aparentávamos ser uma família unida, que se ama. Pelo menos eu amava eles, os dois, e eles pareciam amar a mim. Porém, pelo visto esse amor não existe entre eles. "Você vai entender um dia, meu filho. Você vai entender."Tudo bem, pai. Mas você precisa mesmo nos deixar?

Essa foi a última vez em anos que eu vi meu pai. Me lembro de minha mãe chorando baixinho no quarto. "Por que comigo?", eu a ouvia sussurrar vez ou outra. O que está acontecendo? Demorou um tempo, mas nos restabelecemos. Aprendemos a viver sem ele.

Dezembro de 2008

— Seu pai ligou hoje.

— Que?! - eu realmente estava espantado, faziam cinco anos que ele havia nos deixado, e desde então ele não havia feito nenhum contato - O que ele queria?

— Nada demais. Queria saber sobre você, sobre mim, como a gente tava. Eu disse que a gente tava bem.

Ela talvez não admitiria isso se eu perguntasse, mas minha mãe parecia um tanto quanto abalada com a aparição do meu pai. Isso realmente a pegou desprevenida.

— Só isso?

— Basicamente, sim. Quer dizer, agora ele disse que vai começar a pagar pensão pra você, e que vai se acertar pelos cinco anos que ele não pagou.

— Agora ele é o bom samaritano?

— Filho, eu sei que foi difícil quando seu pai deixou a gente. Mas depois de um tempo você entende que ele precisou fazer isso.

— Não, não entendo. Então meu pai é homossexual? É isso? ele ficou anos casado com você, teve várias namoradas antes de você, e agora ele descobre que é homossexual?

— Quando eu te contei isso mês passado, eu não esperava essa reação.

— Isso não acontece, mãe. Acho que ninguém via gay do nada.

— Você não entende.

— E nem quero!

Ano de 2011

Foi uma verdadeira ironia que menos de três anos depois eu acabei descobrindo a mim mesmo como homossexual. Eu, por volta dos meus 15 anos, comecei a sentir atração por outros garotos, e mais do que nunca eu entendi meu pai. Eu entendi o porque dele não poder ficar com minha mãe, entendi todo o ponto de vista dele. Ele não podia ficar com minha mãe, assim ele estaria enganando a ela e a ele mesmo.

E agora eu precisava contar isso a ele. Nesse dia eu saí da escola apressado e fui até minha mãe no fórum, ela era promotora de justiça. Passei quase correndo por todas as salas e corredores até chegar no seu escritório, onde ela estava sentada atrás da sua mesa falando ao telefone. Entro e me sento em frente a ela, esperando que ela termine e ligação e desligue o telefone.

— Tudo bem, eu vou dar uma olhada nesse caso. Tá certo. Sim, claro. Tudo bem, até mais. Oi Thomas! - agora ela se dirigia a mim - Tudo bem, filho?

— Sim, mãe.

— Aconteceu alguma coisa?

— Não. Quer dizer, sim. Na verdade não. - coloquei as mãos em cima da mesa - A verdade é que eu preciso do telefone do meu pai.

— Do seu pai? Pra que?

— Nada demais, só tenho que falar com ele.

— Falar sobre? - ela me olhou desconfiada.

Morfeu (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora