Capítulo 07

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"A vida é feita de momentos aleatórios. Um dia você está vivendo os melhores dias da sua vida, no outro você está vivendo os piores, mas tudo bem, alto e baixo fazem com que a vida tenha seu equilíbrio. Depois da morte de minha mãe, minha vida mudou um pouco, papai contratou uma empregada. Cheguei um dia em casa e a encontrei na cozinha.
— Me desculpe, mas quem é senhora?
A mulher de meia-idade sorrir para mim.
— Senhorita Evans, sou Amanda Petrônio, a nova empregada da casa.
— Nunca tivemos empregada.
— Agora temos.
Meu pai desce a escada e vai até a cozinha, abre a geladeira e pega uma garrafa de vinho.
— Você está bem, papai?
— Sim.
E foi isso tudo que ele me respondeu.
A parte da mudança também chegou na escola, os professores me tratavam com mais atenção, às vezes me sufocava, as pessoas me tratavam diferente. Mas só havia uma que continuava a mesma, independente do que acontecesse.
— Colombia?.
Bethâny pergunta ao ler a ficha em minha gaveta do criado mudo.
— Sim, um dos melhores cursos de enfermagem é em Colombia?
— Está pensando em me deixar?
Ela semicerra os olhos.
— Não, estou apenas vendo opções.
— Você e suas opções.
— Todo mundo tem opções.
— Opções como Bryce?
Me viro quando ela fala esse nome, arqueio uma sobrancelha e ela sorrir.
— Bryce? O quarterback do time da escola?
— Sim.
— Do que você está falando?
Paro de arrumar minhas coisas e a encaro.
— Bryce pediu para sair comigo.
— Uau, acho que isso é uma sorte, né?
— Sei que você não curte o tipo de cara que ele é.
— O tipo de cara bombado, atleta e burro?
— Anne!.
— Ok, desculpe. — Levanto a mão em redenção. — Não importa se não curto esse tipo de cara, não sou eu que irei sair com ele. Boa sorte no primeiro encontro.
— Obrigada.
Esse foi o início do frustrante namoro de Bethâny. Eu já sei que Betty teria o coração partido algum tempo depois, mas tudo bem, diário, ter o coração partido ocasionalmente nos deixa mais fortes. Teoria da minha mãe."

Passo pela porta de vidro e vou até a recepção, a loira fria me olha com reconhecimento.
— Boa tarde.
Ela fala ao tirar os olhos da ficha em suas mãos.
— Boa tarde, vim ver Anne Evans.
A loira franze os olhos, então pega o telefone e faz uma ligação.
— Jack, Jamie Stone está aqui para ver a senhorita Evans. Tudo bem ele ir? Oh sim! Tudo bem, então. Ok. Obrigada.
Ela desliga e me encara, vejo em seu crachá o nome Lavigne.
— Você pode entrar — ela faz uma cara de surpresa. — Você tem acesso livre ao quarto da paciente.
— Obrigado.
Saio andando e vou até o elevador, aperto o botão chamando, ele chega e eu entro.
Saio no andar de Anne, o último andar do hospital. A ala está vazia, em silêncio, o sol atravessa a enorme janela de vidro. Caminho até sua porta, paro quando ouço uma música clássica tocando ao som de piano, abro a porta e vejo que em uma cadeira há uma pequena caixinha de som, a música vem dela, fecho a porta e caminho até ela, me sento na cama ao seu lado, pego sua mão gelada, a acaricio.
— Como você está? — Fico a encarar, a música preenche o quarto, deixando um clima leve. — Sua cor está melhor, eu acho.
Me levanto e abro a persiana, os raios solares invadem o quarto, trazendo vida, viro e encaro Anna, sorrio ao ver quão linda ela é, o sol lhe trouxe um ar sereno, fico estudando seu rosto, à luz do dia sua beleza se destaca. Olho pela janela e vejo um táxi parar em frente a uma cafeteria, um casal desce e entra nela, o táxi vai embora, mais adiante as pessoas atravessam no semáforo, o mundo está se movendo, pessoas vivendo suas vidas alheias às outras, pessoas que não sabem a história escondidas atrás de sorrisos.
Um bip do aparelho de monitoramento cardíaco me chama atenção, encaro a máquina que mantém Anne viva, se desligarem, a vida dela vai embora, franzo a testa ao constatar que a vida dela está literalmente nas mãos dos outros, essa ideia me incômoda.
Pego meu celular e vejo a hora, abro o navegador e uma ideia surge.
Anne Evans.
Pesquisar.
Na tela do meu celular aparece a foto de Anne ao lado de seu pai, há uma pequena descrição.
Anne Evans é a filha do talentoso Adam Evans, dono das empresas Evans's Arquitetura.
Entro em uma página qualquer e vejo que há um pequeno artigo sobre a morte da mãe de Anne, um artigo de 2016.
Hoje completa dois anos da morte da esposa de Adam Evans, a jovem professora Chloe Evans, que morreu de câncer no cérebro, deixando para trás sua filha que hoje tem 17 anos, mas que na época tinha apenas 15 anos. Uma criança apenas. Chloe era conhecida no mundo da caridade, uma mulher generosa que vivia fazendo trabalhos comunitários para instituições carentes, uma renomada professora de história, que deixou saudade em muitos.
Até hoje os pais de Anne não se pronunciaram sobre a perca que sofreram.
Katherine e Cal Johnson vivem sua vida discretamente no sul de Nova York, hoje eles, com 61 e 66 anos, vivem em uma casa típica americana...
Paro de ler e fico encarando as fotos de Anne com seu pai que está abraçado à sua mãe, na época, ela tinha 15 anos, seu cabelo era longo como agora, ela tinha um sorriso lindo. Sua mão estava segurando a da sua mãe, a mulher em seu quadro de foto, a semelhança entre elas são visíveis. Seu pai também parece muito feliz segurando a cintura de sua esposa. Vejo a foto dos avós maternos de Anne, vejo semelhança de Anne neles. Pergunto-me como eles podem ter abandonado a neta após ter perdido a filha.
Procuro artigos falando do acidente de Anne, mas não acho nada, apenas artigo falando da nova esposa de seu pai.
Finalmente, depois de um ano e meio após perder sua esposa de uma maneira trágica para uma doença, Adam Evans está de casamento marcado com a jovem dentista Daphne Clark, uma dentista renomada em Nova York...
Paro de ler o artigo e vejo a foto de Daphne, uma morena de olhos verdes.
Amenizo a tela do meu celular e volto para Anne, e ela continua aqui parada, sem se quer ter uma reação, encosto na parede e fico parado a encarando, eu posso fazer isso o dia inteiro.
Me pergunto o que Anne estaria fazendo da vida dela agora. Ela certamente estaria ansiosa para entrar na faculdade. Começar um novo ciclo. Ela estaria namorando ou tendo encontros horríveis e jurando nunca mais ir em um. Ela estaria saindo com sua melhor amiga e comprando coisas novas. Estaria desesperada para descobrir em qual bloco da faculdade ela iria ficar, qual seria sua colega de quarto e se elas se dariam bem.
Pensar nisso me deixa com raiva, porque a vida simplesmente foi terrível com Anne. Ela foi interrompida. Ela foi arrancada de sua vida.
Fecho minha mão em punho. Eu queria conseguir mudar isso. Queria poder dar uma vida para ela. Fico rangendo os dentes porque a raiva me consome.
— Merda, Anne. Você merecia mais. Você é só uma garota!
A raiva fica tão insuportável que preciso sair do quarto dela. Preciso sair de perto dela. Não pego o elevador, desço as escadas correndo.
Todos a abandonaram!
Chego na saída e vou para a calçada.
Minha adrenalina está alta. Olho para o andar em que Anne vive. Não, isso não é viver. Isso... Respiro fundo. Sento na calçada. Coloco minha cabeça entre minhas pernas para poder respirar e conseguir pensar.
Sinto uma lágrima escorrendo até meu nariz. Ela cai no chão.

                                                                                                  ~∆~

— Oi, Jamie.
Levanto os olhos e encaro Giovana, seu cabelo está trançado, ela carrega um copo de milkshake.
— Oi, Gi.
Termino de passar o pano no balcão. Meu humor está péssimo.
Saí do hospital e vim direto para o trabalho. Desde a hora em que saí de lá, não consegui parar de pensar nela.
Gi deita a cabeça de lado e me analisa. Um sorriso maroto surgiu em seus lábios.
— Que horas você sai daqui?
— Às 7 da manhã, por quê?.
— Que pena, ia te chamar para uma festa.
— Uma festa hoje?.
— Sim.
Ela diz sorrindo, então toma seu milkshake.
— De quem?
— Uma amiga minha, quer ir?
Preciso distrair minha cabeça. Preciso parar de pensar em Ann.
Passo a língua nos meus dentes superiores, então olho para Finnick.
— Me dê um minuto.
Saio de perto dela e vou até Finnick.
— E aí, cara?
— E aí, Finnick, você acha que o movimento hoje aumentará?
— Sinceramente, não. Está querendo sair?
— Sim.
— Vai, seguro as pontas aqui, se eu precisar te ligo.
— Certo.
Vou até a Gi e sorrio.
— Só vou trocar de roupa e já volto.
— Ok.
Ela sorriu, vou até os fundos para trocar de roupa. Paro um instante e me pergunto se está certo eu sair, sendo que Anne está naquela situação. Me repreendo mentalmente, uma coisa não tem nada a ver com a outra. Anne ainda continuou lá. Eu ir visitá-la não significa que não posso viver minha vida aqui fora.

~∆~

A música está alta, pessoas circulam por toda a casa, adolescentes bêbados, Gi acena para algumas pessoas.
— Vamos lá, vou te apresentar, minha amiga.
Ela segura minha mão e entramos na casa, viramos o corredor para a cozinha, entramos lá, está tendo uma competição de quem vira o copo mais rápido.
— Gi.
Esse é o momento em que tudo para, e tudo vem como um raio. E lá está a garota da foto de Anne, a garota que estava com a trança igual à dela.
— Bethâny!
Elas se abraçam com força. O cabelo de Bethâny está solto, ele é todo enrolado e vai até a cintura, e preto. Ela é mais bonita pessoalmente.
— E quem é esse?
Ela pergunta ao se virar para mim, então sorri.
— Esse é Jamie, uma dos meus amigos. Jamie, essa garota linda, é Betty, a dona da festa.
— Olá, Bethâny.
Ela sorri e me abraça como se fôssemos os melhores amigos do mundo.
— Jamieeee. — Ela arrasta meu nome. — É um prazer te conhecer.
A mesma me solta e me encara.
— Bethâny.
É somente isso que consigo dizer. Ficamos nos encarando, ela com um sorriso e eu apenas sem expressão.

Não Me Deixe IrOnde histórias criam vida. Descubra agora