Prólogo

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Nova York, outono de 1961


Guerras e ameaças de novas guerras. Melanie Levinsky não se lembrava de alguma vez que tivesse ouvido notícias de genuína paz. Mesmo após o fim da Segunda Guerra Mundial, ainda havia a Guerra Fria e a simples menção dela fazia seu corpo gelar. Os últimos anos haviam sido turbulentos para a família Levinsky, sendo de decendencia judaíca foram ameaçados quando os ideias de Hitler começaram a ganhar força.

No início dos anos 40 quando a Segunda Guerra Mundial tomou conta do leste europeu, não ficou outra saída além de fugir. Melanie era pequena nessa época e não se lembrava com clareza de muitas coisas. Mas definitivamente se lembrava do medo.

O medo era aquela angústia já familiar que se escondia dentro dela, às vezes ela até se esquecia que ele estava lá até sentir o peito apertar e temer perder tudo o que tinha. Sobreviver era dificil e cansativo. E quando se era diferente, o mundo parecia muito mais ameaçador.

Enquanto crescia, Melanie Levinsky se tornava consciente de que sempre corria o risco de ser um alvo. Primeiro pela descedencia judaica como milhares de outras pessoas que haviam sido friamente dizimadas, segundo por ser mulher, e terceiro por ter uma habilidade extremamente incomum.

Dom era como Richard, pai de Mel, se referia às habilidades da filha. Descobriram muito cedo que Melanie não se machucava. Quando ela era pequena, foi atropelada na saída da escola. Mas se levantou e andou como se nada tivesse acontecido.

Susan, sua mãe, havia explicado o acontecimento como um milagre. Com 12 anos, Melanie ralou o joelho brincando no jardim. O que era extremamente raro, ela era o tipo de criança que nunca aparecia com um machucado. Seu pai correu para o banheiro em busca de um bandaid e quando voltou para a sala e olhou o joelho da filha, não havia nada lá.

"Já sarou, pai". Ela tinha dito normalmente, foi aí que eles souberam que Melanie tinha uma habilidade fora do comum.
Milagre, era o que os pais dela diziam.

Mas ela logo não se sentia especial depois que percebeu que não podia curar outras pessoas. O corpo dela podia se curar, mas nunca livrar os outros. Melanie não podia deixar de pensar em como seria muito útil se ela pudesse usar o seu dom em outras pessoas.

Porque o que mais queria era que não sentisse mais medo. Isso sim seria um milagre.

Mas além do medo, havia outra coisa que queimava no peito de Melanie. Era uma vontade insaciável de ajudar os outros, já que sua habilidade não o fazia ela encontrou outras maneiras.
Era muito incomum que uma mulher buscasse uma vida que não se limitasse somente ao casamento, Melanie logo percebeu que estudar genética em um curso superior era muito mais difícil pra ela do que para seus colegas todos homens. Ao se formar, conseguiu um emprego em um laboratório das Indústrias Trask e mesmo tendo a formação necessária para ser uma das analistas do laboratório, o cargo em que a colocaram foi na recepção.

Susan sua mãe a lembrou:
"Não reclame, sempre sorria. Saiba o seu lugar, pessoas que reclamam nunca conseguem nada. Toque o seu violino, seja delicada e bonita de boca fechada".

Mas Melanie não queria viver dominada pelo medo, dar o braço a torcer e viver calada por ser diferente. Ela sabia o seu lugar e não era apenas sendo o rostinho bonito em uma recepção. Os homens poderiam fazer suas guerras, Melanie Levinsky tinha um pensamento que ia além.

Viver numa sociedade que oprime tudo o que você é se torna exaustivo, vai drenando tudo o que há de eaperançoso até te fazer questionar porque continua tentando. O sentimento de completa impotência a atingiu naquele outono de 1961, quando Richard Levinsky adoeceu e não havia nada que sua filha pudesse fazer. Nenhuma cura, nenhum milagre.

Susan se negou a aceitar a ideia, se virou para filha e com desespero nos olhos disse:
-Já esperei por tempo demais, Melanie. Por que não fez nada até agora?

Mel a olhou perdida.
-Do que está falando?

-Use o seu dom! -Susan gritou. -Não quer salvar o seu próprio pai?! Do que serve esse poder! Deus te deu para você curar os outros. Como pode ser tão mesquinha e só curar a si mesma?!

Na verdade, Melanie havia tentado inúmeras vezes curar os outros. Na pré escola quando algum amigo se machucava, todas as noites que passou no hospital com o pai, mas... Nunca funcionou. Melanie sabia que não era assim que funcionava.

Sentiu-se péssima. Não poderia curar seu pai, não poderia tirar a dor da mãe.

Richard faleceu dias depois. Susan não dirigiu uma palavra à Melanie no dia, mas depois de algumas semanas quando ela se sentou à mesa para jantar, Susan cuspiu as palavras para Melanie. -A culpa é sua. Isso não é um milagre, é uma maldição.

As palavras ecoaram na mente de Melanie.
-Acho que está mais do que na hora de você casar. Assim pelo menos alguém vai te sustentar.

Melanie bateu o punho contra a mesa.

-Eu não vou. -Ela murmurou. -Estou cansada de abaixar a cabeça pra esse mundo onde deixamos que outros nos digam como devemos viver.

-Você não sabe nada sobre a vida, Melanie. -Susan sibilou.

Mas ela sabia que não precisava ser daquele jeito, podia ser melhor.

Ela não terminou o jantar, se levantou e recolheu os pertences mais importantes em uma mala. Os artigos de genética de Charles Xavier colocou em uma mochila, havia ouvido de um lugar em que poderia ficar e tentar algo diferente.

Ela saiu de casa debaixo da chuva gelada do fim de setembro. Susan a viu sair, mas nada disse. Talvez achasse que ela fosse voltar.

Mas Melanie Levinsky não iria voltar.

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