Como a cidade não era grande foram dois minutos de lá até aqui. Dois minutos de silêncio total.
Enquanto íamos, eu reparava que a qualidade das casas ia diminuindo aos poucos, como se fosse uma transição do lado mais rico o lado mais pobre da cidade. Não havia prédios também, e dava para ver o céu com poucas nuvens.
Paramos em frente a uma casa que parecia recém- reformada, com portões de ferros em barras e espetos na ponta de cima. O lado de fora da casa era de cor verde.
- Essa é a minha casa – disse Julia – A casa onde você já foi inúmeras vezes para ficarmos juntas.
Fiquei observando mais um pouco, e as palavras "você já foi inúmeras vezes" me tocaram um pouco. O mais impressionante é não me lembrar disso.
- Então... É aqui que você mora – comentei.
- É alugada, e no final do ano posso ter uma casa nova – disse Julia – Mas eu gosto daqui. Isso me faz mais independente morando sozinha.
Julia e eu saímos do carro. Ela abriu o portão e entrei. Havia dois corredores nas laterais que levava aos fundos, ao lado da casa.
- Pode entrar, vou por o carro na garagem – disse Julia, indo até a velha camionete.
Entrei pela porta da frente, que não estava trancada. Por dentro, os cômodos eram pequenos. Na sala havia um sofá e uma televisão, não daquelas gigante mas era pelo menos de plasma.
Na cozinha havia armários de madeira, uma pequena mesa, geladeira e fogão.
Depois no corredor havia um quarto bagunçado e um banheiro. A casa era simples, mas era bom o suficiente para duas pessoas no máximo.
Olhei para o lado e vi uma estante no fundo da sala, onde havia duas fotografias. Uma fotografia era da família de Julia. Havia alguém que parecia o pai dela ( um senhor de mais ou menos 35 anos de idade), a mãe dela ( uma senhora de mais ou menos 30 anos) e uma menininha no meio de mais ou menos 5 anos. Julia é claro, se reparar nos cabelos loiros e nos olhos verdes.
A outra foto parecia bem mais nova e foi a que mais me chamou a atenção, e estava em um pequeno suporte bem bonito. A foto era minha com Julia, e ela estava dando um beijo na minha bochecha. Eu estava de olhos fechados e com um grande sorriso no rosto. Pelo ângulo da foto, parece que foi tirada de um celular com uma câmera muito boa.
Sorri ao ficar observando a fotografia.
- Essa foto fui eu que tirei – disse Julia, aparecendo de repente ao meu lado. Me assustei ao ouvir a voz dela – Eu quis manter junta com outras fotos que eu tenho nossa, mas você ficou insistindo para revelar . Isso não te lembra nada?
Fiz que não com cabeça. Deu para ver a pontada de tristeza em Julia, mas nada disse.
- Para o jantar de hoje, não tenho absolutamente nada – disse Julia, mudando de assunto – Então estou pensando em pedir pizza. Que tal?
- Adoro pizza – eu respondi.
- Por isso mesmo – Julia pegou o telefone e pediu.
Enquanto esperávamos, assistíamos televisão. Não havia nada passando, mas era só para perder tempo mesmo. Havia apenas um sofá, mas ficamos uma em cada canto, em silêncio, até Julia resolver falar.
- Sobre aquele beijo...
- Desculpe – eu disse, me lembrando do que eu fiz mais cedo – Eu quis que minha mãe parasse de me encher, mas também não pensei em como você reagiria.
- Ei, não foi ruim – disse Julia – Só meio inesperado, mas deu certo. Conseguimos mentir para sua mãe, e você ainda está aqui. Mas do jeito que você reagiu, foi meio desesperador.
- Só não queria voltar para lá – eu disse – Para a casa da minha mãe.
- Você nunca me contou sobre sua infância – disse Julia. Me surpreendi com isso – Sempre que eu perguntava, você fugia do assunto e não queria falar. Mas por quê?
Suspirei, lembrando do meu passado, que era bem triste.
- Sempre estive sozinha naquela casa – comecei – Na verdade, está mais para uma mansão. Era enorme e gigantesca, mas nunca estava feliz lá. Nunca tive nenhum amigo ou pelo menos alguém para conversar. Nem mesmo os meus pais, que me repreendiam e repreendem até hoje – antes que eu percebesse, estava andando em círculos – O tempo foi passando, meu irmão era o único que eu conversava e teve que se mudar. As brigas na minha casa começaram entre meus pais, e eram tão intensas que eu mesma falei que iria me mudar com ele. Minha mãe foi contra, meu pai não falou absolutamente nada. Então, até ai me lembro da minha vida.
Julia estava quieta e espantada com a minha história.
- E ainda tem mais... – iria falar mais alguma, mas veio uma forte dor de cabeça em mim. Mas foi tão forte que cai no chão.
- Lara! – Julia levantou-se pulando do sofá e veio ao meu socorro – Querida, você está bem?
Ela me ajudou a me levantar e me por no sofá.
- Agora sei o porquê de seu desespero mais cedo para voltar para lá – disse Julia – Você vai ficar com seu irmão e comigo, você querendo ou não.
- É o que eu mais quero – eu disse, mas reparei em uma coisa – Você também?
- Você já me ajudou em muita coisa – Julia respondeu – Mais do que você imagina – Ela se sentou do meu lado e pegou na minha mão – No relacionamento, acho que fui meio... Apressada nessa questão. Mas, eu quero recomeçar isso. Passei tanto tempo com você, que... Não posso simplesmente largar tudo só por causa de um problema. Vamos começar devagar, como amigas primeiro. Aceita?
- Meu irmão disse a mesma coisa – eu disse. Essa conversa estava me deixando vermelha e com um pouco de medo – Bom, como AMIGAS. E sem forçar, tudo bem?
- Pra mim está ótimo – disse Julia, sorrindo. Ouvimos uma buzina do disk-entrega de pizza – Hora de comer!
Depois de comermos, me senti cansada e bem entediada.
- Já que esta meio óbvio que vou passar a noite aqui, pode me emprestar alguma coisa para dormir?
- Você já tem suas próprias – disse Julia, e me levou ao quarto dela. Lá, abriu uma gaveta de um pequeno armário de madeira e mostrou muitas roupas.
- Essas são as suas – ela disse – Cada uma delas. Acha que já não dormiu aqui?
- Acho que já suspeitava – peguei a que mais parecia mais de pijama – É... Com licença?
- Ah, sim claro – disse Julia, levantando-se da cama e saindo do quarto. Claro que eu já sabia que ela já me vira me trocando varias e varias vezes, mas para mim parecia outra vida.
Fui ao banheiro e escovei os dentes, já tinha uma escova minha lá também. Então fui até Julia, que estava na sala.
- Aonde vou dormir? – perguntei.
- Na cama, é claro – respondeu Julia – iremos dormir juntas.
- O que foi que eu disse sobre ir com calma nisso? – perguntei.
- É o que amigas fazem também, ou não sabia disso? – perguntou Julia , levantando-se do sofá – Bem, já vou dormir também. Vamos?
Deitei em lado exilado da cama, no canto da parede. As luzes se apagaram e tudo ficou escuro.
Não sabia se eu queria mesmo esse tipo de "recomeço", como Julia diz. Eu sempre fui sozinha em tudo. Nunca tive amigas ou amigos, e isso sempre me incomodou. Agora parece que estou em outra vida, sem nem mesmo saber o que aconteceu nesse meio tempo.
Fechei os olhos, estava muito cansada. Amanhã mesmo quero saber como foi minha vida, se eu tenho ou não novos amigos. Saber mais sobre esse meu relacionamento e chegar a uma conclusão do que realmente quero nisso tudo.
Odeio coisas que fazem minha cabeça ficar confusa.
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Amando Novamente
RomanceLara Rodrigues acorda em um hospital, depois de ficar um tempo em coma. Havia sofrido um acidente de carro, e não se lembrava de nada dos últimos seis meses. Quando acordou, seu irmão, Rafael Rodrigues, disse para ela que perdera muita coisa do seu...