4º Cap. Adeus Ano Velho, feliz ano-novo

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Não tinha o mínimo senti Ano-Novo do. As lágrimas rolaram, chorei sozinho, ninguém poderia imaginar o que eu estava passando. Nada fazia sentido. Todos sofriam comigo, me davam força, me ajudavam, mas era eu que estava ali deitado, e era eu que estava desejando minha própria morte. Mas nem disto eu era capaz, não havia meio de largar aquela situação. Tinha que sofrer, tinha que estar só, tão só, que até, meu corpo me abandonara. Comigo só estavam um par de olhos, nariz, ouvido e boca.

Adeus Ano Velho, feliz ano-novo

Foi o que eu prometi a mim mesmo. "Se eu não voltar a andar, darei um jeito qualquer pra me matar." Era bom pensar assim. Eu não tinha medo de morrer. Era muito mais fácil a morte que a agonia daquela situação.

- Parabéns, Marcelo. Foram vinte anos bem vividos. Deixará muitas saudades, alguns bons amigos, umas fãs. Fique tranqüilo, o Cassy sabe tocar algumas de suas músicas. Um dia, quando ele gravar um disco, irão saber que você existiu. Mas também, se não souberem, tanto faz. De que vale a eternidade? Um orgasmo dura poucos segundos. A vida dura poucos segundos. A história se fará com ou sem a sua presença. A morte é apenas um grande sonho sem despertador para interromper. Não sentirá dor, medo, solidão. Não sentirá nada, o que é ótimo. O sol continuará nascendo. A terra se fertilizará com o seu corpo. Suas fotografias amarelarão nos álbuns de família. Um dia alguém perguntará:

- Quem é esse cara da fotografia? - Ninguém que interesse.

Meu R.G. irá para outra pessoa. Meu violão se desintegrará em algum depósito de velharias. Meu gravador será roubado por um trombadinha. As cuecas, minhas irmãs poderão guardar para seus filhos, mas aconselho jogar fora, pois até lá já estarão fora de moda...

Tchau, mãe. Se cuida, tá? Thais e Ana, vocês são belas mulheres. Cassy, continue tocando, que você chega lá. Virgínia, pena você não ter me amado como eu te amei. Veroca, Eliana, Nalu e Big, juízo, hein? Gorda, você é um cara incrível. Ricardo, meu irmãozinho, o cara que mais me conhece. Nana querida, não fique com raiva de mim, eu tentei gostar de você, mas não dava, eu tava muito chato.

Marcinha gracinha, você é uma fofa. Fabião, vá à luta, meu chapa. Mariúsa mãezinha, valeu a força que você me deu. Gureti, vê se fica menos briguenta. Maurão, seu veado, não beba tanto. Bundão querido, cuida bem delas, tá? Zequinha, seu louco, largue um pouco os livros, bata mais punheta. Celso, lindo, você é duca. Nelson e Olaf, cuidem bem da chácara. Betão, Rubão, Max, lembrem de minhas posições políticas. Laurinha fofa, emagreça um pouquinho. Milu, você tá me devendo uma transa, hein? Tchau, pessoal, feliz Ano-Novo pra vocês.

Continuei chorando.

Tive outra crise. Essa foi brava.

- Pelo amor de deus, faça alguma coisa!

- Calma, Marcelo - disse Ilma, de mão dada.

- Mexe comigo, balança esse colchão d'água. Isso, mais, eu não agüento! - Tenha um pouco de paciência.

- Quanto falta pra tomar o remédio?

- Mas faz uma hora que você tomou. Fique calmo que o tranqüilizante deve estar fazendo efeito agora.

- Merda! Esses remédios já não fazem efeito, devo estar imune.

Precisava descarregar essa energia acumulada. Balançava os braços, virava a cabeça, mas nada. A porra da dor de barriga não pa.rava. Eu tava tonto de tanto ficar na mesma posição. Pedi pra lima inclinar um pouco a cama.

- Aí nessa manivela.

- Não pode, sua coluna não está calcificada ainda.

- Claro que pode. O Dr. Alex falou, hoje de manhã, que agora tem que, de hora em hora, erguer um pouco a cama (sempre fui mentiroso).

Feliz ano velhoOnde histórias criam vida. Descubra agora