Eu já estava me preparando pra agir. Como presidente do Centro da Agrícola, conheci o comando da AP de Campinas (Ação Popular). Mas reinava a indefinição política no movimento estudantil e nas organizações clandestinas. Reflexo da indefinição do próprio pais. O MDB fora extinto e novos partidos já estavam em organização. Um deles, um tal de PT (Partido dos Trabalhadores), organizado por alguns recentes lideres sindicais e pelo tal de Lula. No meio estudantil, a tese era "ficar com as oposições unidas no velho MDB", futuro PMDB.
O meu grupo, que também era diretoria do DCE-Unicamp, UEE-USP e UNE, ficou em cima do muro. Eu arrisquei. Quebrei o pau em Campinas e, junto com o Percival (aliás, quem fez minha cabeça), me filiei ao PT .
Era uma nova opção, sem os velhos chavões parlamentares. Um partido organizado por trabalhadores e não por políticos, raposas velhas, exilados que não estavam no Brasil há quinze anos. Uma oportunidade utópica de se construir um partido da classe trabalhadora, e não um partido de personalistas que se dizem defensores dos interesses do povo brasileiro (advogados, engenheiros etc. que saem da classe média e vão fazer política) .
É a minha mentalidade ingênua e ignorante das teorias revolucionárias da esquerda (Lenin, Trotsky, Marx...).
O Airton Soares, deputado federal por São Paulo, se filia ao PT. Nas eleições de 78, havia feito campanha pra ele, apesar de votar no Darci Passos (um amigo íntimo da família). O Airton fazia dobradinha com o Geraldinho, amigão nosso, ex-companheiro de diretoria do DCE da USP da minha irmã Veroca, que se candidatou a deputado estadual e, por incrível que pareça, foi eleito.
O PT começou a aumentar a influência no meio estudantil e até rachou com a diretoria da UNE. Na Unicamp, todo o nosso grupo estava agora decidido pelo PT. As coisas melhoraram, quando o Geraldinho também mudou para o PT. Ótimo, tínhamos o nosso primeiro deputado estadual.
O movimento operário estava explodindo. A greve de 79 foi vitoriosa, até fez com que o Governo fizesse um decreto de aumento salarial de 20% para todo o país. Mas a maior vitória mesmo foi a reorganização dos sindicatos, principalmente no ABC, e, de uma certa maneira, a politização dos operários.
Sofri o acidente, e, ao lado do Hospital Paraíso, no Colégio Siori, foi feito o encontro de fundação do Partido dos Trabalhadores. E o meu quarto estava-se tornando ponto de encontro dos amigos do Marcelo que participavam do encontro do partido. Foi quando a Veroca me falou que o grupo autêntico do MDB ( um grupo de uns dez deputados da Assembléia Legislativa de São Paulo) estava consultando as bases para saber se iriam ou não para o PT .
E entraram pela porta do meu quarto o Eduardo Suplicy, o João Breda e a Irma Passone, para saber minha opinião.
Visitinhas políticas.
O Suplicy eu já conhecia de longa data, e foi o primeiro que perguntou: – O que você acha de mudarmos do MDB para o PT?
Quem diria, eu que nunca trabalhara na vida, convencendo um deputado a ir pro Partido dos Trabalhadores. Ele me ouvia atento (o Suplicy é desses que conversa com uma criança no mesmo tom que com o Presidente da República).
Final da história. Os três, mais um tal de Marco Aurélio, acabaram mudando pro PT que, somando o Geraldinho, tinha uma bancada de cinco deputados na Assembléia. Era uma tendência natural. O MDB, por mais glorioso que tenha sido no passado, era um saco de gatos. Muitos membros estavam interessados em realizações pessoais, e outros só usavam a legenda por saberem que, em São Paulo, vota-se na oposição. Prova disso foi que, logo depois da extinção dos partidos, a metade dos deputados foi pro partido do governo, o PDS (uma vergonha).
Até hoje o Suplicy, sempre que me encontra, diz que eu fui muito importante pra decisão dele. Venhamos e convenhamos, quem sou eu pra influir um deputado a mudar de partido? Mas fico emocionado com a atenção dele, e, principalmente, por ter gente como ele no PT. Orgulho-me de ser um dos primeiros filiados do PT e um dia ainda direi pros meus filhos:
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Feliz ano velho
AdventureMarcelo tocava guitarra, jogava futebol e estudava engenharia agrônoma. Aos vinte anos sofreu um acidente que o deixou paralítico. Feliz Ano Velho repensa sua vida. Dizer que é um relato de vida comovente é fazer pacto com o lugar comum. Mas e daí...