A(s) Vida(s) de Lauren

Capítulo 2- Charlie Harrington

  "Não podia ser verdade. Era impossível. Aquilo não estava acontecendo. Era só um sonho ruim." Pensava Lauren, andando em círculos. Mas aquilo era mais real do que ela queria. Desesperada e prestes a cair em prantos, pegou um smartphone ultrapassado que estava na escravinha ao lado da cama e discou o número de Mark, que com os anos de amizade conseguira decorar, mas ao invés de ouvir a voz tranquila que sempre conseguia acalmar seus nervos, ouviu a voz eletrônica que lhe falara que aquele número não existia. Onde estava Mark, o seu apartamento, os seus eletrônicos, o seu CORPO? 

 Como a pessoa equilibrada que era desde a infância, decidiu pensar sobre tudo aquilo que estava acontecendo e sobre como conseguiria voltar ao normal. Decidiu saber quem era de princípio, pegou seu celular e entrou nas redes sociais. "Charlie Harrington" era o seu nome. "Charlie? Meu nome é Lauren, Lauren Mitchell Evans. Que diabos está acontecendo?" A única coisa que Lauren reconhecia era seu anel de prata cravejado com rubis. Aquilo não mudara. 

 Abriu o enorme guarda-roupas de madeira para procurar algo para vestir naquele corpo que não lhe pertencia, mas se assustou quando deparou-se com o péssimo gosto de Charlie, que só tinha roupas coloridas e de péssima qualidade, muito diferente das roupas clean de marcas que Lauren se orgulhava em vestir. Optou por um vestido chemisier já que nunca na vida sentira tanto calor como sentia agora.

 Quando Lauren pesquisou sua localização, viu que também mudara de cidade: morava agora em Berkeley, Califórnia. Ótimo, agora morava em uma cidadezinha quente, bem diferente da grande e fria Nova York. A primeira coisa que deveria fazer era conhecer as pessoas de sua nova vida, então esperou alguém mandar uma mensagem ou ligar.

 Alguns minutos depois, um telefonema: "Alex" seguido por dezenas de emojis de coração. Em alguns dez minutos de ligação, Lauren descobriu que Alex era sua melhor amiga, morava no bairro vizinho e almoçavam juntas todos os dias.

 Pela foto, Alex era magra, tinha longos cabelos castanhos, algumas sardas bem distribuídas pelo seu rosto, olhos verdes e esbugalhados.  Às 13:00h, Alex chegou até o velho prédio de 10 andares que Charlie morava para buscá-la para o almoço. Foram até uma lanchonete simples e antiga que servia comida caseira (Lauren torcera o nariz ao entrar) e sentaram-se em uma mesa pequena e um pouco engordurada.

- E aí, Charlie? Como foi com o Dean ontem?

- Desculpe, quem?

- Aquele surfista loiro, lindo, cheiroso, musculoso e perfeito. Também conhecido como seu namorado.

 Lauren não conseguiu esconder sua preocupação, agora tinha outra pessoa para se relacionar durante sua estadia como "Charlie-californiana-brega".

- Ah sim, ele é mesmo o amor da minha vida.

- Ué que estranho, ontem você estava falando que não levar esse relacionamento tão a sério logo no início.

  Alex riu, cada vez mais desconfiada da sua amiga que estava agindo tão estranhamente.

- Tô brincando!

 Em duas horas de almoço e perguntas disfarçadas, Lauren descobriu os dados pessoais de Charlie que lhe interessavam: nascera em San Francisco e se mudara para Berkeley para estudar literatura na UC Berkeley; quando entrou na universidade, tornou-se melhor amiga de sua colega de quarto, Alex; tivera sete relacionamentos amorosos nos últimos 12 anos (todos deram errado), trabalhava como professora de jardim de infância e seu hobby era escrever romances inacabados.

 Era engraçado como Alex lembrava a Lauren seu amigo Mark. Porque mesmo naquela situação absurda e desesperadora em que ela se encontrava, conversar com Alex quase a fazia se esquecer de que estava em uma vida totalmente diferente da sua, sem fazer ideia de quem era. Mas tinha que manter o foco, precisava de sua vida de volta, e a conseguiria, sozinha ou não.