Capítulo 3 - Um recado, um guarda-chuva e um castelo

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Enquanto encarava o Mais Velho mais temido do Orfanato, na entrada do refeitório, Rendrix se perguntou se o medo excessivo de perder algo ainda não adquirido poderia gerar um ódio tão grande em alguém. A julgar pelo comportamento de Urso Polar, achou que sim.

Pela forma como o garoto falara e o brilho em seu olhar quando apontou para Alazar, Rendrix podia apostar que o que motivava a raiva dele não era somente o medo de perder o tal cargo, mas também ciúme. Ramon tinha ciúme do interesse que o diretor havia demonstrado em Rendrix naquela manhã de quinta-feira.

Seria um interesse sobre o qual Rendrix não fazia ideia ou o diretor descobrira uma de suas saídas furtivas do dormitório para se encontrar com alguma menina? Ele apostava na primeira alternativa. Urso Polar parecia ter tido a mesma opinião, um sistema de aviso devia tê-lo alertado: PERIGO! Novo concorrente detectado, elimine o infeliz, ou o infeliz será você!

Isso levava Rendrix a uma nova conclusão: o interesse de Alazar nele era bem maior do que demonstrara na manhã do dia primeiro.

- Tenho um recado para você - A voz de Ramon saiu curta e grossa, novamente em português, trazendo Rendrix de volta para o presente.

- Recado? Recado de quem? - Rendrix não desviou o olhar dos olhos de Ramon. Não poderia vacilar, não seria ele quem quebraria o contato visual, aquilo demonstraria inferioridade.

- Alazar - Pela maneira como Ramon respondeu, Rendrix podia jurar que ele estava com algo azedo na boca - Ele me mandou avisar que você deve encontrá-lo em seu escritório no terceiro andar.

A voz dele entregou a mensagem, mas pela expressão que tinha estampada no rosto, Rendrix achou que o que ele realmente queria dizer era: espero que quando for tomar café se engasgue com o miolo do pão, ou com a casca, ou o pão inteiro, desgraçado, enfie a merda do pão inteiro na boca e vê se morre de uma vez, otário!

Depois da mensagem ser entregue, Ramon começou a se distanciar com dois dos seus amigos (tão grandes quanto ele), sem desgrudar os olhos de Rendrix.

Todos no corredor olhavam para Rendrix e Ramon, como se uma briga estivesse prestes a acontecer. O tempo parecia ter parado, nada parecia se mover, apenas Ramon e os amigos que se distanciavam lentamente. Rendrix foi virando o corpo, seguindo-o com os olhos. Não quebraria a conexão de jeito nenhum.

Antes de virar no corredor, Urso Polar disse cinco palavras, frias:

- Lembre-se da nossa conversa.

Quando ele se foi, o tempo pareceu voltar ao normal. Alunos entravam e saíam do refeitório, lançando olhares amedrontados a Rendrix. No burburinho de conversas ele ouviu alguém dizer: Ele é louco de encarar Urso Polar, não somente um Mais Velho, mas o mais estranho deles! Que loucura!

- Muito bem! - Corvo deu um tapinha nas costas de Rendrix - Não pode abaixar a cabeça para esses marrentos não. Tem que mostrar quem manda.

- Na verdade - Marco disse, enquanto os quatro entravam no refeitório - eles mandam, são os Mais Velhos...

- Ah, dane-se - Corvo devolveu, ainda com um sorriso nos lábios, sorriso de corvo - Eles mandam só porque têm autoridade dada pelos diretores, mas e daí? Quer saber, Drix? Eu estava doido para que vocês saíssem no soco. Eu, sozinho, espancaria os três e mandaria todo mundo para a enfermaria. E os alunos que observavam para o psicólogo, ou psiquiatra. Ah sim, eles iriam precisar...

O comentário foi recebido por gargalhadas dos outros três. Corvo parecia realmente estar falando sério, o que deixava as coisas mais hilárias. Era de conhecimento geral que ele não aguentava um tapa.

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