Pat parou o carro no cruzamento em frente à entrada da cidade, um enorme túnel. Carros saíam por ele e seguiam a rodovia paralela ao muro, à esquerda e à direita, mas nenhum carro – exceto os CFs – seguiam por onde Pat e Rendrix haviam chegado. Aquele caminho levava ao caos, levava a cidades despedaçadas por algo que Rendrix ainda não sabia o que era, mas desconfiava que possuía íntimas ligações com a catástrofe mencionada por Alazar.
– Que carros estranhos são esses? – Ele perguntou, enquanto esperavam a sinalização ao lado do gigantesco portão de acesso à cidade dar permissão para seguirem. Ele reparou que os carros que saíam eram bem estilosos e esportivos, mas nada parecidos com aqueles sobre os quais aprendera. Os carros que via agora pareciam ter vindo de nenhum outro lugar senão do futuro.
– Esses carros funcionam a energia solar – Pat respondeu, com o interesse de um engenheiro mecânico, tirando os óculos e o pendurando na gola da camiseta – A lataria capta os raios de sol e alimentam todo o mecanismo do carro.
Rendrix observou, maravilhado, enquanto os carros passavam por eles. Alguns eram robustos e grandes, outros pequenos e achatados, porém bem modernos e bonitos. As rodas eram negras e fundas, grandes demais, desproporcionais ao tamanho dos carros. As cores variavam. Alguns eram azuis, outros vermelhos, outros dourados. Rendrix ouviu o barulho do motor: baixo, surdo e forte, como um zumbido de vespa.
Quando o painel ao lado da entrada deu permissão para que eles seguissem em frente, Pat deu partida no Jeep, o oposto das maravilhas que saíam e entravam na cidade.
– De agora em diante, Rend, vamos nos comunicar apenas na Língua Interhumana, está bem?
Rendrix olhou para Pat, sem entender. Pat o encarou, pesando as respostas.
– É só que... ninguém fala português aqui. Seria melhor não chamarmos atenção.
Agora foi a vez de Rendrix pesar a resposta de Pat, que assim como as outras respostas estavam sendo evasivas. Parecia que Pat estava esperando uma espécie de momento especial, quase religioso, para explicar tudo. Além de pesar a resposta, Rendrix pesava também a mensagem por trás das palavras:
Ninguém fala português aqui.
Aquilo significava que as pessoas ali falavam a Língua Interhumana, que por si só significava que ela se tornara o meio de comunicação naquela nova cidade. Quando e como Rendrix não sabia, já que até então achara que a Língua fosse apenas algo exclusivo do Orfanato, um meio de comunicação secreto dos Irmãos Mais Velhos.
– Tudo bem – Concordou, já na Língua Interhumana. Sua voz saiu lenta e acanhada, incerta, como sempre acontecia quando utilizava o idioma depois de muito tempo.
Olhou para Pat, preparando a mente que se habituava ao novo idioma, e perguntou:
– Como não aprendi sobre isso no Orfanato? Essa mudança drástica no Rio, esses carros, essa destruição – A voz dele, como acontecia com todos quando falavam na Língua Interhumana, se modificou para seguir a pronúncia correta. Aquele idioma era mais rápido do que o português, o que fazia com que sua voz, depois de acostumada, ficasse levemente afinada, realçando a estranheza da Língua.
Contudo, apenas parte da sua mente prestava atenção nisso. A parte maior sentia como se tivesse sido enganada a vida inteira, e era nisso que focava. Nada do que aprendera no Orfanato o preparara para aquilo, nada, a não ser, talvez, aquela maldita Língua Interhumana.
– O que aconteceu com o país? E por quê o Rio de Janeiro agora se chama TEND?
Pat dirigiu o carro pela entrada da cidade e pelo túnel, absorvendo as perguntas de Rendrix, embora não as respondesse.
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Noworldland, A Terra de Mundo Nenhum
Ciencia FicciónRendrix é um interno do Orfanato Três Irmãos, uma instituição criada para abrigar crianças e jovens que foram esquecidos pelos pais. Porém, essa não é de longe a preocupação principal de Rendrix. Nos primeiros dias depois do seu aniversário de 17 an...