Orfanato Três Irmãos, aproximadamente 17 horas antes da fuga de Sophia
Quando parou de rir por nervosismo e loucura, e não por ter achado graça de algo, Rendrix se manifestou:
– Creio que o que o senhor acaba de me contar seja verdade, certo?
– Queria que fosse mentira, meu caro, mas sim, é verdade – O diretor o encarou – E o que você acha?
– Acho que uma revolução é necessária. Essa alienação tem que acabar.
A Verdade Interhumana usava da metodologia de ensino de Noworldland e do justiciolismo para pregar a ideia de Utopia, quando na verdade tudo não passava de um teatro para esconder a Verdade Interhumana, algo mais inquietante e importante, que era mantido nos bastidores. A alienação em massa era similar à alienação que o Orfanato utilizava para criar rebeldes, portanto o desejo de Rendrix em apoiar uma revolução era alimentado por vivência e experiência pessoal.
Já havia sido muito enganado pelo Orfanato, não suportaria ser enganado também por Noworldland.
Alazar riu, um sorriso mais desanimado do que alegre.
– Sabia que você escolheria o lado certo.
Rendrix segurou o caderno por um momento e o folheou, olhando com pouca atenção as coisas que escrevera, enquanto sua mente viajava: pensava no sonho, na Viagem; nas conversas com Pat; nas conversas que estava tendo com o diretor.
No geral, esse tempo todo, ele esteve em cima do muro. Em questão de segundos, o tempo que Alazar levara para contar-lhe a Verdade Interhumana, Rendrix se decidira tão rápido quanto os milésimos viravam segundos e estes minutos.
– Se essa Verdade é tão... – Ele parou, procurando a palavra que carregasse o sentido que queria – ... certa, por que vocês não contam logo para os alunos, pelo menos os Do Meio? Acho que seria tudo mais fácil. O Orfanato não precisaria mentir para eles, ensinando sobre o Mundo Pré-Interhumano e tudo o mais.
Alazar pareceu pesar a proposta por um momento, então fez uma pergunta completamente aleatória:
– Você se lembra de quando era uma criancinha, nos primeiros anos aqui no Orfanato?
– Sim.
– Você se lembra quando teve aulas sobre mitos, lendas urbanas, contos de terror, folclore, e tudo o mais?
– Sim.
– Você acreditou em alguma delas?
– Bem, não cheguei a acreditar, mas admito que fiquei com medo do lobisomem – Rendrix se sentiu constrangido ao revelar seu medo infantil, mas completou rapidamente – Mas depois de um tempo eu parei de acreditar.
Alazar riu com gosto:
– Então pronto, tem a sua resposta. Nós não poderíamos contar a verdade para os alunos, simplesmente contar. Tudo gira em torno da credibilidade. Você acreditou no lobisomem, até o temeu, mas depois perdeu a credibilidade. O mesmo aconteceria com os alunos se simplesmente contássemos a Verdade Interhumana. Com o tempo eles perderiam a credibilidade. O mesmo aconteceria se contássemos a Verdade para as pessoas. Então preferimos coloca-los em um mundo imaginário, preferimos criar verdades e mentiras, preferimos fazer com que os alunos se familiarizem com um mundo que não existe, fazer com que sintam na pele a realidade, para então quebra-la e mostrar o motivo de termos feito o que fizemos e a importância da nossa motivação.
Ele fez uma pausa, para ver se Rendrix entendia, depois finalizou:
– Noworldland foi criada para ser perfeita, utópica, e se não o é em conceitos, com certeza o é em manipulação. O ser humano precisa sentir na pele para realmente aprender. A dor precisa ser sentida.
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Noworldland, A Terra de Mundo Nenhum
Ficção CientíficaRendrix é um interno do Orfanato Três Irmãos, uma instituição criada para abrigar crianças e jovens que foram esquecidos pelos pais. Porém, essa não é de longe a preocupação principal de Rendrix. Nos primeiros dias depois do seu aniversário de 17 an...