Capítulo 1

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Os dias quentes me deixavam com um péssimo humor. O ônibus estava lotado de manhã e eu tive que ficar em pé, espremida por pessoas suadas, desejando chegar logo na faculdade. Nunca quis tanto ter um carro, assim não precisaria passar por isso todos os dias.

Pensando nisso, encaro os cadernos espalhados pela mesinha da cafeteria que eu tinha vindo antes da aula. Como cheguei cedo hoje, resolvi aproveitar para adiantar algumas tarefas e, por isso, minha mesa logo tinha ficado uma bagunça. Eu tinha tanta coisa para fazer essa semana que sentia que a qualquer momento surtaria e jogaria tudo para o alto.

Quando faço minha última anotação e fecho o caderno, bebo um gole do meu café e olho pela janela, observando que o campus já estava mais movimentado do que quando eu tinha chegado. A cafeteria também se encontrava mais cheia e, enquanto eu passo os olhos pelo local, um garoto entra, chamando a minha atenção.

Era bem bonito. Usava roupas casuais que, poderiam ser simples, mas nele pareciam elegantes. Era uma daquelas pessoas que quando você encontrava, fantasiava uma história de amor e uma longa vida juntos. Eu o encaro curiosa por nunca tê-lo visto antes. Talvez ele fosse um calouro?

Ele entra e vai direto para a fila que se formava no caixa para fazer o pedido, estava encarando o celular e parecia com pressa. Não consigo deixar de notar a capinha vermelha do celular, quase igual a minha. Ele, por fim, levanta a cabeça e olha em volta, encontrando o meu olhar. Ele me encara por alguns segundos e eu desvio o olhar para a minha xicara vazia, constrangida. Quando tomo coragem para olhar novamente, ele já tinha ido embora.

Desde que eu entrei na faculdade, nunca me envolvi com alguém. Eu não costumo ir as festas porque sempre tenho que estudar e acabo não socializando muito. Quando eu ainda era caloura, fiquei afim de um cara da minha classe, o Lucas. Mas, ironicamente, ficamos amigos e hoje em dia é até estranho pensar na possibilidade de sermos mais do que isso.

E isso resume a minha vida amorosa nesses últimos anos: sem festas, sem encontros e sem namoros. Na verdade, minha adolescência também não foi diferente disso, o que significa que eu nunca cheguei a ter uma vida amorosa realmente. Por isso eu me agarro a qualquer oportunidade de conhecer alguém diferente, como o que aconteceu hoje. Mas, como sempre, não deu em nada.

Com isso, vejo o horário no celular e percebo que já estava quase na hora da minha primeira aula. Recolho todos os cadernos da mesa e os guardo na minha mochila com pressa. Caminho até o caixa e, enquanto procuro o dinheiro na carteira, noto que alguém esqueceu o celular no balcão. Pego o aparelho e arregalo os olhos ao notar a capinha vermelha que chamou minha atenção mais cedo, ou melhor, o dono dela. Isso só poderia ser um sinal! Sem tempo para pensar em outras opções, guardo o celular na bolsa, decidida a encontrar aquele garoto novamente. Se esse era o destino me dando uma chance de finalmente conhecer alguém, eu abraçaria a oportunidade, afinal, não tinha nada a perder.

As aulas da manhã passam normalmente e logo chega o horário do almoço. Hoje eu tinha aula prática a tarde, por isso, precisaria almoçar na faculdade, já que não teria tempo de voltar para casa nesse curto intervalo. Eu não gostava de almoçar aqui, o refeitório se tornava um caos nesse horário com a turma da tarde chegando e o pessoal da manhã saindo. A única vantagem é que hoje os meus horários bateram com os da Bianca e ela me faria companhia.

- Oi, Bella! – a garota se senta na minha frente e deposita sua bandeja na mesa. Franzo o nariz ao encarar o hambúrguer no prato dela. Ela, vendo minha expressão, já se manifesta. – Não diga nada.

- Eu não disse. – Levanto as mãos em sinal de inocência e ela aperta os olhos.

- Sua cara disse. – Aponta para o meu rosto e eu rio.

Bianca, além de ocupar o posto de minha melhor amiga, também divide o apartamento comigo. Nos conhecemos no fundamental mas nos tornamos melhores amigas mesmo no ensino médio e, desde então, tem sido assim. Por coincidência, entramos na mesma faculdade, então decidimos morar juntas, já que bancar as despesas sozinha é muito difícil e nenhuma de nós estava disposta a viver em uma república.

- De que adianta se você nunca me escuta e continua comendo essas porcarias no almoço? – reclamo e ela revira os olhos.

- Não é porcaria, você só está com inveja porque tem que comer essa gororoba enquanto eu aproveito meu hambúrguer – ela aponta para a minha comida e eu faço uma expressão ofendida.

- Não é gororoba, é comida saudável – retruco e ela dá de ombros, começando a comer seu amado hambúrguer.

Eu não era uma maluca por dieta nem nada. Comer coisas saudáveis não significa que eu nunca como hambúrgueres deliciosos e gordurosos, apenas não como todo dia. Não quero bancar a estudante chata de medicina mas acho que devemos cuidar da saúde, principalmente se você quiser passar dos trinta. Por isso, eu trazia uma marmita de casa para os dias em que eu precisava almoçar na faculdade. Não era nada absurdo, apenas comida normal e salada. A Bianca era exagerada. Eu até me ofereci para fazer comida para ela trazer também, mas ela negou.

- O Lucas não vai almoçar com a gente hoje? – ela dá falta do garoto que geralmente nos fazia companhia nesse horário.

- Ele tinha trabalho em grupo, almoçou mais cedo – digo e ela murmura ''humm'' como resposta. Bianca não era muito próxima do Lucas, acho que eu era o ponto de conexão que ligava os dois. Talvez sem mim eles nem se falassem. Eu gostaria que eles fossem amigos, mas Lucas é muito tímido e a Bianca consegue ser bem intimidadora.

- Não vai atender o celular? – Bianca pergunta de repente e eu escuto um toque de celular vindo da minha bolsa. Mas aquele não era o meu toque.

- O celular! – exclamo ao me dar conta que era o celular do tal garoto tocando e procuro o aparelho esquecido na bolsa. Bianca me observa sem entender nada.

Finalmente encontro e respiro fundo, antes de atender a ligação. 

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