Capítulo 2

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Este lugar é diferente. Onde estou?

Olho em volta, os prédios predominam o local. Até que me recordo. Já estive aqui, talvez em outro sonho. Não sei.

As pessoas começam a surgir. E em meio de todas as pessoas, me vejo. Penso que talvez sou eu a morrer. Já é a minha ora? E se não for, o que estou fazendo aqui?

Noto que olho para o céu, o que me faz fazer o mesmo. O céu esta cinzento e as nuvens paradas, aos poucos sinto a chuva cair fraca e calma. E por mais estranho que seja, sinto as gotas geladas atravessar meu corpo.

Sinto que algo esta muito errado e que talvez possa não ser eu a morrer.

As pessoas começam a se apressar, mas eu não preciso. Não eu neste exato momento.

Não sei direito quem é dessa vez, mas posso ter certeza que aguém vai morrer.

Logo me vejo andar com mais velocidade tentando escapar da chuva, certamente é o que eu faria. Me apresso também tentando me alcança, sinto que vou esbarrar em cada uma pessoa por quem passo. Mas não é preciso pensar assim, eu simplesmente atravesso cada um deles. É como se eu não existisse neste mundo. Ninguém me vê ou me sente, mas eu vejo e sinto. Sinto o calor do corpo de cada um por quem passo, sinto o frio da chuva em cada gota que me atravessa.

Não é tão estranho, não pra mim que já estou acostumada a essas coisas. É tão normal quanto ver um casal que não se aguentam ficar perto começarem a se amar.

Sinto a chuva se acalmar e logo passa, as nuvens cedem deixando os pequenos raios de sol surgirem aos poucos. Há uma pequena livraria, me vejo ali olhando os livros através do vidro.

Mas logo algo novo surge, sinto que vai acontecer e me apresso.

Quando? Onde? Quem?

Olho em volta tentando ver a pessoa mais vulnerável, meu olhos passam por cada pessoa que vejo, mas apenas um deles me chama a atenção. Um garoto parado em uma esquina a espera do sinal fechar para poder passar. Será que é ele? Me pergunto.

Ando até ele para ver quem é. Ele olha para o sinal e volta a sua atenção para o celular em sua mão. Me aproximo. Ele tem cabelos castanhos claros, pele clara e olhos de um castanho tão claro que aparenta ser verdes. Um garoto bonito, admito.

Ouço o barulho de pneu derrapar e logo após um carro vem em minha direção em alta velocidade, a água da chuva no asfalto não ajuda muito. Fecho meus olhos e o carro passa por mim em menos de cinco segundos, quando me volto a abri-los, vejo o carro parado quase dentro de uma cafeteria, vou até lá e logo o encontro, o garoto da esquina esmagado pelo carro e seu sangue espirrados pela lataria amassada e os pequenos cacos de vidros da cafeteria.

O corpo totalmente irreconhecível e apenas sei que é o garoto pelas roupas e pelo carro ter passado por mim, não daria tempo para ele correr pela velocidade em que o carro estava.

Aos poucos as pessoas se aproximam assustadas e curiosa, alguns rostos perplexos e outros em choque. Mas para mim são apenas curiosos. Vejo pessoas pegarem seus celulares e tirarem fotos, pessoas totalmente insensíveis.

Mas entre todas as pessoas ali, finalmente me vejo, estou em frente da livraria apenas olhando de longe. E finalmente, sinto vontade de chorar.

Acordo com meu rosto molhado pelas lágrimas, não consigo me levantar e muito menos me mexer.

— Você está bem? — Uma voz calma e preocupada pergunta.

— Ela está chorando Lie, como você acha que ela esta. — diz outra voz.

— Cala a boca, Juliene. — Lie a repreende.

— Vão todos para a cama. — Samira finalmente manda.

Ouço passos lentos saindo do meu quarto e poucos sussuros. E agora sei que sou o novo assunto.

Me sento. Vejo Samira em pé ao lado da minha cama.

— As garotas foram na minha sala e disseram ouvir um grito. — explicou ela — Achei melhor trazer uma água para você. — diz ela me entregando o copo, pego e bebo sem vontade. — Que bom que fui avisada sobre você e seus pesadelos, achei que você não acordaria ninguém. Você se sente bem?

— Que horas são? — pergunto.

— Quase cinco da manhã. — informa ela. — Tente dormir um pouco mais. Deve estar cansada.

— Obrigada. — falo, deixando o copo no cômodo ao lado da minha cama.

Me deito apenas para não preocupar Samira que me olha, fecho meus olhos e espero até que ela deixe meu quarto. A porta se fecha e me sento.

Mais uma alma vai ceifar. As vezes até sei onde e simplesmente não sei como impedir. O que posso fazer? Pessoas morrem o tempo todo e por todo esse mundo. E sou apenas uma exceção, mas por que não consigo morrer? Por que tenho que viver vendo outras pessoas morrerem? O que tenho de tão importante?

Me fazer perguntas é sempre o que faço, um passatempo não muito preferido mas tenho que me fazer perguntas extremante difíceis, perguntas que nunca sei responder, perguntas que tenho que descobrir as respostas. Mas como, onde e quem as tem?

Uma batida na porta me faz voltar a realidade, me levanto e vou ver quem é. Meus passos são lentos e leves, paro diante a porta e congelo.

Será que preciso abri-lá? Será que é bom fazer mais amizades?

Desisto de abri-lá e volto para a cama em total silêncio. Me sento e espero alguns minutos. Me levanto e vou até a janela, fico olhando para o céu esperando o dia chegar.

Tentar dormir não me ajuda em nada, sei que não vou conseguir. Olhar para o céu me ajuda a me distrair. O sol vem devagar. Espero calmamente até dar a hora de sair do quarto e fingir que esta tudo bem, deveria ganhar um troféu de melhor pessoa a esconder seus sentimentos. Fico imaginando o homem falar "E o troféu de melhor pessoa insensível vai para", e ai vem o suspense em seguida "Alexandra Roberts", e os aplausos enchem meus ouvidos.

Procuro uma muda de roupa e vou até o banheiro feminino. Umas meninas passa por mim, uma delas é loira e magra e a outra é ruiva e baixa. Procuro não olhar diretamente para ninguém que passe por mim, sei que já fofocaram de mim como sei que ainda vão falar.

Tomo um banho quente e relaxante, volto para o meu quarto e pego minha mochila com apenas o meu caderno. Vou até a cozinha e tomo apenas café.

Vejo que alguns me observam por apenas segundos e sussurar para o parceiro do lado e outros me encaram curiosos sem nem desviar os olhos. Ouço passos e me volto olhando para a porta quando Samira entra séria. E finalmente alguém que não seja eu está com a atenção.

— Bom dia. Como vocês já perceberam, temos uma novata no orfanato...

— Já percebemos pelo grito dela hoje cedo. — Um garoto falou rude.

— E como eu disse a vocês uma semana antes dela chegar — Samira deu uma pausa. —, Alexandra tem pesadelos.

As vozes começaram e reclamações tomam conta do local.

— Chega! — esbraveja Samira. — Sejam educados todos vocês e mostram o colégio a ela.

Samira pega uma xícara de café e sai da cozinha deixando todos em silêncio.

Sussuros começam a preencher o local novamente e logo todos estão me olhando feio, apenas alguns não me olham. Mas isso não alivia nada, apenas ajuda o meu pensamento de que eu não deveria estar aqui, que não deveria existir. Sorrio triste e me retiro da cozinha.

Volto ao meu quarto e me sento. Ouço uma batida na porta e a menina chamada Lie me chama para ir ao colégio.

Vou junto com todos até o colégio.

Logo chegamos e todos seguem seus caminhos.

— Vou te levar até a diretora, mas se caso quiser uma amiga para conhecer melhor o colégio é só me procurar.

— Obrigada. — agradeço.

Distintos - Presságios dos Sonhos - Vol IOnde histórias criam vida. Descubra agora