8ºCapítulo

854 46 4
                                    

 O desejo continuava a pulsar nas minhas veias, mas eu escondi-o bem no fundo das minhas entranhas quando vi o pequeno camião á minha frente. Na lateral deste podia-se ler “Pintura&Arte”.

 – Não. -disse, parando bruscamente e desconectando as nossas mãos.

 – Mia… apenas deixa rolar! Só tens de pintar aquilo que te vier á cabeça.

 – O que é que está exactamente dentro do camião? -perguntei num tom normal.

 – Um elefante vestido de pintor, tu sabes, com um avental repleto de manchas de tinta e um pincel na sua pata gigante.

 Gargalhei alto.

 – Tão idiota! Agora a sério…

 – Telas, de todos os tamanhos, um cavalete, papel de aguarela, tintas de óleo, pinceis de todos os tamanhos e texturas, cadernos de desenho, carvão. Panos de limpeza… eu apenas comprei aquilo que eu achei que era necessário. Porquê esse medo? Eu aposto que tens saudades de te libertar na pintura.

 Ok… a verdade era que eu tinha saudades. Saudades da Mia que era… saudades do passado. Eu sabia, sabia que ele jamais desistiria de mim e isso dava-me força para enfrentar qualquer medo. Desde que ele tivesse comigo eu estaria segura.

 – Tudo bem.

 Ele sorriu, um sorriso gigante.

 – De verdade? Foi assim tão fácil domar a tua teimosia?

 Ok. Agora estava enervada.

 – Eu tenho algumas condições. -exigi.

 Ele soltou uma risada, seguindo-se dum olhar de “Eu sabia que tinha sido fácil demais”.

 – Eu vou voltar a pintar quando eu me sentir preparada.

 – Tudo bem. -respondeu francamente.

 – E eu quero pintar-te! -ele sorriu com a honra- NUO!

 Ele engasgou-se e parou de respirar por breves segundos.

– Nuo? -ele perguntou de novo.

 Acenei que sim com a cabeça e sorri inocentemente, escondendo a vergonha dentro de mim. Eu nem sabia o porquê de ter proposto aquilo, estarei a ficar louca?

 – Podes pintar-me nuo. -um brilho passou pelo seu olhar- Mas só quando eu me sentir preparado.

 – Parece-me bem! -caminhei até ao camião, ele puxou as portas para o lado e eu entrei. O cheiro a tinta inundou as minhas narinas e eu senti-me completa.

 – Posso ficar com o quarto ao lado do meu, como estúdio?

 O seu olhar encontrou o meu. Cinza com azul.

 – Queres o meu quarto como estúdio? -sorriu.

 O quarto dele era ao lado do meu? Eu nunca havia reparado. A casa era gigante e eu deduzi que o quarto dele era em todo o sítio, menos ao lado do meu. Ele dorme “ao meu lado”. Terei de me lembrar disso da próxima vez que pensar em ressonar ou babar-me durante a noite.

 – Eu não sabia que dormíamos tão perto um do outro. -corei, porque é que sentia que aquela proximidade era uma violação á minha privacidade?

 – Pode ser no sótão. -ele disse.

 – Mas… o sótão é o teu espaço e eu… eu… -gaguejei um pouco, sorte que estava escuro no camião e ele não via os meus olhares envergonhados- … não quero invadir o teu espaço Hugo! Eu aposto que existem outros quartos livre que…

Razão De Viver (PARADA)Where stories live. Discover now