23º Capítulo

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 Não sei á quanto tempo o Hugo me segurava contra o seu peito. Não sei quanto tempo se passara desde que eu havia entrado na casa do meu “avô”, eu nem tão pouco sei se posso chamar aquele homem de avô. Tive pouco tempo para absorver o impacto daquilo que vira, até o Tomás me arrastar para longe da porta de vidro que dava acesso ao corpo morto, imóvel e frio. Ali, branco como cal… enforcado no beiral das escadas. “Ele suicidou-se?!” nossa subconsciente, pergunto-me como consegues ser inteligente a esse ponto? “Obvio!” Mente inútil.

 – Tu vais ficar bem… -era a quinta vez que os lábios dele seguravam esta frase, sabia que ele queria acreditar nisso tanto quanto eu.

 Choraminguei mais na curva do seu pescoço, eu nem tão pouco sabia a razão pela qual estava a chorar baba e ranho por alguém como ele. Eu nunca o conheci, nunca se importou comigo. Ele nem tão pouco importa agora, está morto. Sei que pode parecer frio da minha parte, mas eu não tenho qualquer conexão com ele. Olhei em volta, saindo do lugar seguro onde estava. Carros da policia rodeavam a casa branca. Imaginei como seria a minha infância se ela fosse passada com o meu avô, se ele nunca tivesse renunciado a família.

 Puxei o telemóvel do bolso e disquei um número que conhecia de cor.

 #Chamada On#

 – Sim? - a sua voz masculina soou na coluna do meu huawei.

 – Nossa, pensei que seria a Dália a atender… como de costume.

 Um suspiro cansado soou do outro lado da linha.

 – Miranda… filha, hum… precisas de alguma coisa?

 Sim, preciso que venhas tratar do funeral do teu pai… segurei o pensamento bem no fundo da minha garganta.

 – Não me chames filha, se não me tratas como uma.

 Pude sentir os ombros do Hugo ficarem tensos com a menção da pessoa com quem estava a falar. Ele temia assim tanto o meu pai?

 – Desculpa, eu… estou apenas a tentar perceber a razão pela qual me ligaste.

 – Esperava que fosse a Dália a dar-te esta noticia… -dor soou no fundo do meu peito, seria mais difícil do que aquilo que eu esperava.

 – Ela está de recup…

 Interrompi-o.

 – O Matias morreu… eu lamento, não era minha intenção ferir os teus sentimentos dando a notícia pelo telemóvel. Apenas, achei melhor saber por mim do que por polícias na porta de casa.

 Uma maca coberta por um pano branco passou, perto o suficiente para que realmente percebesse a situação que ocorria ao meu lado. A minha mãe estava morta, o meu avô matou-se e o meu pai, chamou-me filha pela primeira vez. Oh deuses, a minha vida é tão fodidamente imperfeita, e mesmo assim é o palerma do meu avô que comete suicídio, enquanto eu continuou a lutar por justiça. Viva á ética… ou então não.

 O choro masculino chamou-me de novo ao planeta terra.

 – João? -chamei, só porque me chamou “filha” não significa que eu o chame de “pai”, fim da discussão- Eu realmente lamento…

 – Eu estarei aí pela manhã, e prepara-te para explicar o motivo pelo qual tu sabes que o meu pai está morto, primeiro que eu. –a sua voz soou rude, fria. O seu tom normal.

 – Eu nem sei o porquê de seres a primeira pessoa para quem liguei. Talvez, tenha esperança que apareças no funeral dele, já que no dela não apareceste, nem por ser a mãe dos teus filhos.

 Respirei fundo. Puta merda!

 – Faz uma má viagem. -continuei- Esperemos que o avião não caia… da maneira que tratas as pessoas que amas, não sei quem seria a alma caridosa que te fazer ia um funeral.

Razão De Viver (PARADA)Where stories live. Discover now