Capítulo 1

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Morro da babilônia

Ester

Quando a nossa vida está tudo bem por muito tempo, pode ter certeza que logo acontecerá algo ruim.

Pelo menos sempre foi assim na minha vida, não há felicidade ou vitória que permaneça por muito tempo.

Eu sempre avisei o Pedro,  mas nunca me escutou. Achou que a vida era GTA, agora está pagando o preço.

Desde pequena fui ensinada o que é certo e errado, mas quando crescemos, temos que decidir o caminho que vamos seguir.

Usei o coração, ao invés da razão.

Eu e o Pedro estamos juntos a 10 anos, conheci ele na época da escola, tinha 14 anos e ele 16.     
Foi a nossa melhor época, porque no começo tudo é lindo e maravilhoso.

Não estou reclamando do meu marido, mas sim da vida que ele escolheu pra gente.

Eu digo pra "gente" porque naquela época eu era muito nova, o mundo era novo pra mim, por isso agi na emoção, no calor do momento.

Estava ao lado do amor da minha vida e nois dois estávamos contra o mundo.

Assim como eu via nos filmes.
Era tão mágico a forma que eu via o mundo, a forma que eu via o crime.

Estava ao lado dele quando ele entrou pra vida do crime, ficava preocupada, mas na minha cabeça era lindo tudo aquilo, da forma que acontecia, meus olhos brilhavam e cada vez eu queria mais.

Mais aventuras, mais momentos ao lado dele, mais adrenalina.

Coração bandido, amor bandido...

Hoje em dia viro a madrugada pra visitar ele de final de semana.
Vou no corre, porque agora quem tem que segurar a barra toda sou eu.   

Agora no corre dele e no meu.

A vida não é fácil, ainda mais quando você escolhe seguir pelo caminho errado.

Se naquela época eu tivesse a mente que tenho hoje, nada disso estaria acontecendo.

Mas não podemos chorar pelo leite derramado, fizemos escolhas e agora estamos pagando.

Porque eu estou pagando juntinho com ele .

Terminei de fazer as marmitas, embalei tudo e coloquei na bolsa transparente.   
Olhei no relógio e vi que era 03:13, respirei fundo, e fui para o banheiro.

Ando muito cansada, estou trabalhando o dobro e ainda não posso deixar de visitar o meu bem.

Tomei um banho bem quentinho e demorado.
Sai enrolada na toalha e com o cabelo preso e seco, fui direto para o meu quarto, vesti a lingerie que estava em cima da cama e deitei ao lado da minha roupa.

Antes de sair eu sempre tiro um cochilo.
Ninguém é de ferro né

Acordei com o despertador tocando, desliguei e levantei.

Literalmente um cochilo

Passei um creme no corpo, vesti a roupa de moletom que já estava separada, calcei meu chinelo, espirrei o meu lily pelo corpo e roupa, penteei meu cabelo.

Passei apenas um corretivo de baixo das olheiras, um pó, um rímel e um gloss.
Prontíssima pra acabar com o meu cabelo em meia hora.

Aí que horror.

Peguei a bolsa, coloquei no ombro, peguei meu documento, celular e chave de casa.
Tranquei a porta, o portão e comecei a descer a rua.

Cortei caminho pelo beco, de longe avistei o meu cunhado.
Me viu e ficou todo sorridente.

Bom dia, loirinha. - se aproximou e me deu um beijo no rosto

Bom dia, Morales. Tudo bem por aí? - perguntei depois de um sorriso

Plantão está calmo hoje, graça a Deus mo paz. E tu já tá indo pro corre? - assenti de leve - Tenho muito orgulho da mulher que você é, te amo. - me abraçou - Obrigada por não abandonar ele.

Eu jamais faria isso e você sabe bem. Amo vocês - retribui o abraço - deixa eu ir, se não eu me atraso , beijo se cuida aí em, vacilão.

Pode deixar, vai com Deus e manda um abraço pra ele.- sorri e sai andando

Morales é um amor de pessoa, pena que se entregou para a mesma vida que o irmão, ele tinha um futuro brilhante.

Quando você nasce favelado, o destino não tem que estar traçado, você que escreve a sua própria história.
Mas muitos aqui pensam diferente, acha que por ser pobre e favelado o destino é um só.

Cheguei na barragem, cumprimentei os caras que estão de plantão de longe.

Andei até o ponto de ônibus e fui pedir o meu uber, pelo menos esse luxo eu tenho que ter né.
Trabalho por mim e por ele, pra isso acontecer.

De segunda a sexta eu trabalho em uma padaria no Jardim Botânico, mas só é de segunda á sexta porque hoje em dia sou gerente, se não fosse isso, não ia ser todo esse mamão.

Quando estou de "boa", faço uns corres para o Pedro, administro algumas coisas agora que ele está fora.

Meu uber chegou, entrei no carro e fui conversando com o motorista até lá.
Chegou, paguei, desci do carro e fui buscar a minha senha, número 21.

Aguardei junto com as cunhadas na fila, maior zoação.

Um tempo depois, minha senha foi chamada, guardei as coisas no armário e fui para a revista, tudo certo. Passei e fiquei aguardando a liberação. 

Liberaram o corredor e eu fui direto pra cela.

Bom dia, amor da minha vida. - falou assim que me viu e se aproximou para um abraço

Bom dia, amor. Como passou a semana? Tá tudo bem? - falei abraçada com ele

Passei sim amor e como tá lá fora? - falou e me deu um selinho

A mesma correria de sempre né , to cansadona. - fiz careta

Tá sobrecarregada né meu amor? - assenti - Desculpa de verdade, eu não queria jogar esse fardo na tuas costas, mas tu sabe que é a única que sempre correu comigo e eu confio de olhos fechados. - assenti e sentei na cama dele

As coisas vão melhorar, amor. Relaxa que eu estou dando conta. - respirei fundo e coloquei a bolsa do meu lado - vai comer.

Agora eu quero me alimentar de outra forma. - falou sentando ao meu lado e fechando a cortina, ri e neguei mordendo os lábios

Coração bandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora