Capítulo XI : 10/05/2017

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Data: 10 de Maio de 2017

Hoje me veio lembranças de um livro que eu li quando tinha meus 18 anos, o nome do livro era "A Morte de Ivan Ilitch" do Leon Tolstói se eu não me engano, eu sempre tive uma grande influência da literatura russa por causa dos meus pais, eles eram grandes fãs da literatura do Dostoiévski, mas lembro-me que este livro mudou minha vida, a melancolia e o sentimento de morte que aquela obra me trouxe foi impactante, eu, pela primeira vez na vida, me senti compreendido por alguém, a forma com o Tolstói retratou o vazio existencial, o medo da morte, aquilo mudou para sempre a minha vida.
Eu sempre ignorei aquele sentimento fúnebre, mas depois daquele escrito tal sentimento passou a viver comigo pelo resto da minha vida, eu vivi intensamente, correndo contra o tempo, tentando ao máximo me sentir vivo, me sentir pertencente a algo, eu comecei a fumar, tive problemas com bebidas, me meti em problemas, quase morri, mas mesmo assim aquele sentimento nunca se livrava de mim.
Era irônico, eu tentava viver, mas parecia que eu estava seguindo um roteiro barato de filmes de adolescentes revoltados com o mundo, a jaqueta de couro, o topete endurecido pelo gel de cabelo, o cigarro no canto da boca, a postura de namorador.
Mesmo inconscientemente, eu estava cada vez mais me tornando um galã de novela adolescente tosco, eu não tentava seguir a "moda", mas por ironia do destino, eu me tornara um jovem genérico de filmes americanos antigos.
Eu lembro das festas que tinham aqui em Salvador e em Pernambuco antigamente, aqueles bailes ainda me trazem memórias até hoje, quando tocava merengue ou lambada o povo ia a loucura, dançávamos como se aquele fosse o último dia das nossas vidas, o calor do corpo, o suor, era uma dança quente, sensual, apaixonante.
Foi numa dessas festas que eu conheci uma garota chamada Gabriela, ela era uma morena de se invejar, o seus cabelos longos harmonizam com teu olho castanho claro, seus lábios carnudos, ela era descendente de indígenas, deveria ser por isso, sua beleza era inigualável, não havia nada como ela, nem mesmo a Gabriela de Jorge Amado era tão bela quanto ela, eu lembro de puxar ela para dentro do carro, era uma cinco e pouca da manhã, estávamos em terras pernambucanas, na praia de Boa Viagem, o sol começara a nascer se misturando com os céus, ele brilhava como a beleza d'orixá Obaluaê, Gabriela então, observando a beleza que jazia os céus, me puxa, me dando um beijo quente, molhado, o som dos nossos lábios se misturando harmonizavam com o barulho das ondas do mar, eramos como cravo e canela, temperavamos os dias com amor na beira do mar.

"Não deixe o samba morrer
Não deixe o samba acabar
O morro foi feito de samba
De samba pra gente sambar"

Era assim que começavam as noites, o samba de roda dominava a cidade, os rapazes convidavam as meninas para sambar, e as baianas dominavam as rodas, elas tinham o samba na ponta do pé, reviravam os olhinhos enquanto sambavam, deixando os rapazes com água na boca.
A lua iluminava o céu, enquanto os pandeiros acariciavam meu coração, penso, que gostaria de ter o dom da pintura para retratar-lhes a beleza daquele dia, mas o que me resta é a escrita, escrevo neste diário como se alguém algum dia fosse ler isto daqui além do meu "eu" mais velho.
Eu estou rindo atoa agora, sozinho, apenas com os sons das minhas gargalhadas ecoando pelo apartamento, é até estranho que aquele adolescente do andar de baixo não esteja batendo punheta um hora dessas, o prédio está silencioso, mas enfim, acho que irei acender mais um cigarro para aproveitar esse silêncio.

Delírios de um morto poetaOnde histórias criam vida. Descubra agora