Capítulo XXIV

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Minha luta não é contra algo visível. Não é algo que eu possa socar, bater e chutar para longe. Não é algo que saia por um sacudir de minhas mãos ou com um sopro. Minha verdadeira luta é contra a impaciência.

É contra o tempo.

Uma vez perguntei ao Jhon porque ele não usava um relógio, por que ele nunca parecia se importar em saber que horas eram. E ele me disse que era inútil. Que as pessoas tendem a querer controlar algo que se esvai independente do que você faça.

O tempo não espera por você, Ana. Então por que me prender e me limitar a números e ponteiros?

Gostaria de ter essa liberdade de pensamento. De ir contra tudo o que sempre me disseram desde a infância: “Seja rapida, você não tem tempo. Tempo para refletir, tempo para crescer e amadurecer, tempo para se formar, tempo para ser rica.” Era o que sempre me diziam. “Seu tempo esta passando, Ana”

Meu tempo esta passando, Jhon. O nosso tempo está. Não consigo pensar como você.

Não consigo pensar assim. Principalmente aqui. Agora. Parada em frente a casa dos  pais dele.

Mas preciso de respostas. Então bato na porta. Toco a campainha.

Bato palmas. Grito.

Nada.

Dou a volta pelos fundos da casa e a grama parece morta, e o
jardim sem vida.

— Não tem ninguém aí.

Levo um susto. Me viro e encontro a origem da voz. Uma garotinha de olhos negros me encara.

— Se foi. — Ela diz. — Um arrepio de mau agouro me sobe e desce pela minha espinha com essas palavras.

Me agacho e fico da sua altura.

— Quem se foi?

— O moço que não fala.

— Sabe para onde ele foi?

Ela balança a cabeça em negativo agitando as tranças, mas aponta para o ponto de ônibus.

Ônibus por que, se ele tem um carro? — Penso eu.

— Beatriz?

Ela olha para a varanda e corre em direção a mulher que provavelmente é a sua mãe.

— Já disse para não ficar xeretando!

— Mas mãe… ela não sabe que eles foram embora. — a menina choraminga.

Eles?

— Espera! — Digo me aproximando da cerca que dividia os fundos da casa. — A senhora pode me dizer o que aconteceu?
Seu semblante preocupado castiga meu subconsciente. Ela se aproxima devagar.

— Não sei se posso dizer muito.

— O que a senhora souber será o suficiente.

Ela suspira. — Eles deixaram a casa faz dois meses. Não tem mais ninguém morando aí. — Ela faz menção com a cabeça em direção a casa vazia.

— Eles se mudaram?

— Não, não chegou a ser uma mudança. Depois que o filho deles sumiu as coisas ficaram estranhas. Eles vinham cada vez menos para casa. Até que o marido parou de aparecer e Maria vinha algumas poucas vezes sozinha para cá. Até que não a vi mais.

Engulo suas palavras em seco.

— Mas como assim Jhon desapareceu? Ele foi embora?

— Isso é que eu não sei dizer ao certo. Um dia estavam todos juntos em casa e no outro escutei gritos e o choro de Maria. Ela veio até mim e perguntou se eu o tinha visto, mas não pude ajudar. O mais estranho é que se o rapaz sumiu, por que Maria não chamou a polícia?

Pisco diversas vezes tentando processar a informação. Além de ter desaparecido da minha vida, também desapareceu da casa dos pais?

Congelo meu rosto em uma faxada tranquila.

— Sabe de mais alguma coisa?

— Não, infelizmente. Era uma boa família.

—Tudo bem, obrigada. — Dando as costas a mulher.

— Espera, quem é você?

Penso por alguns segundos.

Meu sorriso faz minha bochecha e dentes doerem.

— Ninguém importante.

O chão parece grudento e vertiginoso enquanto vou em direção ao carro.

Giro a chave e o motor ganha vida.

Dirijo por dois quarteirões.

E volto para o mesmo lugar. Levo minhas mãos ao ventre sentido o meu bebe. O nosso bebe.

Acho que agora entendi o que Jhon dizia sobre o tempo e como não lutar contra ele. Não são os números que os ponteiros apontam que fazem o meu tempo. Sou eu quem faço o meu tempo.

E é desta forma que será feito.

Esperando.

Esperando até que a noite caia.

Ninguém desaparece assim.

Tomara que eu não seja presa por isso, mas estou prestes a arrombar a casa dos pais de Jhon.

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