EPÍLOGO

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Um ponto final e eu estou morto.

Fim.

Jhon Andreas Segundo está morto nesta história. Não morto no sentido inconsciente, mas morto no sentido mais abrasivo da palavra. Passado seu tempo de vinte e sete  anos nesta terra, tornou-se atemporal. Teve sua vida achada em outra vida. Concluiu sua missão aqui, e não restando mais nada a dizer, se doou por inteiro.

Ah, Ana…. Me perdoe por isso.

Mesmo com uma pontada de culpa, estou mais que distraído agora. A sensação de se estar em uma livraria nunca fica velha. O cheiro dos livros é como um portal para um mundo novo, ou, um mundo antigo. Qualquer mundo que exista entre a imaginação de um autor e a fome de um próximo leitor a devorar mais páginas. A promessa de só mais um capítulo. Fui agraciado com esse dom, mesmo a escrita sendo um vício difícil de ser sustentado, continua sendo uma benção.

Passo os dedos pela lombada macia do livro. Em duzentas e cinquenta e sete páginas está a nossa história. Minha e de Ana. Apenas com um final alternativo.

Se não contasse com minha ousadia de tirar minha própria vida através das páginas de um livro, com certeza minha esposa daria conta do recado.

Ela ainda não leu o livro. Minha tenacidade precisou ser bem maior do que a dela, pois Ana insistiu, com toda sua gentileza, me pediu e bateu, chantageou, tentou me roubar o computador… enfim, foi uma luta constante para manter esse livro a salvo da curiosidade da minha esposa.

Minha doce e bela, Ana. Penso com um sorriso involuntário nos lábios.

Apesar da minha arte sutil de ser furtivo, Ana suspeita de que algo pode não estar tão… fiel a história real. E isso aguçou ainda mais sua curiosidade e aumentou minha preocupação. Não consigo esconder nada dessa mulher.

Um movimento próximo a mim chama minha atenção. Olho para baixo e encaro um garotinho com grandes olhos azuis, que puxa a barra da minha calça com insistência.

Kaleu, meu filho, que ontem completou dois anos.

Dois anos que saí do coma. Respiro fundo e deixo essa sensação de vazio escorregar para longe da minha mente. Não é momento para isso.

Pego “minha voz” no colo. É assim que o chamo as vezes. O seu nome não poderia ser mais significativo. Kaleu, a voz. Meu companheiro de escrita.

Encaro seus olhos azuis que brilham como safiras. Jamais imaginei que fisicamente ele se pareceria mais comigo do que com Ana. Mas como uma faca de dois gumes, a biologia não se enganou em me mandar uma cópia personalíssima de Ana. Eu sou a taça, e Ana é o vinho, e esse rapaz é uma taça transbordante de Ana.

Ele aponta imperioso em direção a mãe e em seguida passa as mãos gordinhas na barriga.

Ah! Fome.

Aos poucos estamos ensinando sinais básicos. Kaleu aprendeu rapidamente que não adianta gritar ou chorar como qualquer criança; Aprendeu a ser paciente e naturalmente, observador. Caminho vagaroso pela livraria ainda vazia, em direção a Ana, que está sentada em uma das poltronas, compenetrada na última edição da saga Sussurro. Seu apetite por romance adolescente nunca cessa, não sei o que ela vê nesse Patch Cipriano.

Coloco Kaleu no chão e ele corre para sua fonte de comida mais próxima. Vejo Ana fazer malabarismo entre o menino e o tal
Cipriano ao acomodar Kaleu em seu seio esquerdo.

Moleque sortudo.

Cutuco seu pé esquerdo com o meu; — Sabe que precisa comprar o livro antes de ler, não é?

Medo, a Coragem [DEGUSTAÇÃO - DE GRAÇA NA AMAZON]Onde histórias criam vida. Descubra agora