O mundo perdido: Eleições 2018

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Boa noite Diário. Sei que poderíamos nos ver em situação menos abrasiva, mas eleger um candidato nessa era pós qualquer coisa não está sendo um ato pacífico ou mesmo obrigatório e enfadonho.

Com o advento das redes sociais vivemos a individualidade coletiva. Lembro de minha avó citar que sempre decidia por seu candidato na hora de votar até que seu filho, no caso meu pai, cansado de vê-la ao sabor do momento e alvo de esperteza alheia decidiu fazer a "fezinha" como o mesmo chamava, como se votar fosse um jogo de loteria.

Minha mãe sempre votou no candidato do meu pai e eu em meio a essas ocorrências estou tentando fazer o tipo correto e investiguei alguns candidatos a Presidência, Governador e Deputados. Cheguei a conclusão que prefiro fingir que não passei dos quatorze e me abster mesmo sabendo da serventia de um voto a mais.

Contei a novidade a Joe como se estivesse contando um caso qualquer de rede social juvenil e acho que sua reação descontrolada e abismada saiu do script de amigo paz e amor bom vivan. Foi mais ou menos assim:

- Você tem problema cara? Ah você tem né?

- Joe patriotismo não cola em você!

- Cara! Vei! Mano! Você não pode se abstrair.

-Abster...

- Você não percebe o que um voto nulo significa cara... Você não existe pra democracia. Você não come, não bebe, não respira: você é um defunto andarilho. Você não se manifesta... Você é um vândalo social.

Olhei para o meu amigo e não o reconheci. Sua seriedade e até trato com as palavras o transformava em um alienígena culto, não pela pronúncia correta, mas lucidez sobre o assunto. Diante de tal retórica perguntei sobre seu candidato e a impressão se diluiu.

- Ele é um crápula! Quer acabar com a liberdade de ir e vir como aquele marido que vigia a esposa pra que não faça o mesmo que ele está fazendo, ou seja, sendo um traidor safado.

- Ele vai trazer a segurança de volta, a dignidade, a confiança de sair tranquilamente nas ruas sem pensar que um bandidinho qualquer vai meter uma bala na sua cara.

- Jura? Joe, você pode fielmente ser confundido com esse bandidinho porque você é fuleiro.

A mão no peito demonstrou ressentimento.

- Cara assim você me ofende. Eu não tenho perfil de bandido não cara. Não ando em moto sem escapamento e nem tenho cara de verminoso. E minhas roupas são até carinhas.

- Você é fuleiro sim Joe e eu também. Você acha mesmo que você vai poder pirulitar com liberdade em lugar de gente de posse? Dignidade? Cara. A gente nem sabe quanto tempo as faculdades estarão ao nosso alcance. A única coisa que teremos desse lado da ilha são incertezas.

- Na minha casa é tradição votar pelo mais forte. Lá não entra Presidente pé rapado e sindicalista que afundou o Brasil.

- O que ele fez que afundou o Brasil?

- Ele colocou um monte de incapacitado nas faculdades e teve que importar médico de Cuba porque os daqui não são capacitados. Eu nunca vou querer ser tratado pelos médicos formado por esse governo. E Professores? Tudo burro e emburrecendo os alunos. Na minha casa votamos nos fortes porque somos...

- Fracos.

- Hei!

Olhei para o meu amigo e nada mais vi que um perfeito torcedor. Tradição? Mais forte? Discurso de torcedor.

Analisei a situação e percebi que meu amigo não se via como um mero expectador, mas participante ativo de um processo de redemocratização, detentor de toda a soberania, o próprio Presidenciável e pior: a família era ele a mãe e um namorado que ela resolvia trazer quando aparecia.

Meu amigo não é homofóbico ou metido a Hitler, é apenas uma das pontas das hélices que pensa em um propósito, errado, mas que confia ser o melhor.

Resolvi deixá-lo ao sabor de suas próprias conclusões, pois a razão é um soldado lutando com um braço só e sem espada, apenas esperança.

Sabe Diário.

Pensei em votar no amigo imaginário do cara preso, mas não julgo correto que um homem que de forma justa ou injustamente, esteja cumprindo pena, leve adiante com um escudo falante, seus planos de governo.

Resolvi que este não seria o momento, pois não há partidos, há pessoas as quais confiamos ou não e nesse momento ainda não confio no escudo falante.

Pensei no cara bacana da mulher atriz, mas ele não me pareceu pronto ainda para tal cargo.

Algo é claro: Precisamos outra vez do novo, recomeçar. O Brasil está bagunçado ao extremo e estamos como expectadores esperando um milagre.

Compreendo a crença posta sobre os ombros de alguns na esperança de uma guinada, mas não somos um barco, somos apenas uma sociedade com crise de valores e medo.

Passei pela casa do amigo Joe, mas resolvi não entrar nesse dia o qual sabia que ouviria mais alguns sermões como se tivesse me abstendo de adotar um time.

Deixei as redes sociais, pois estava feroz e amarga. Me afugentei em meu lar onde a democracia ainda mora e minha mãe ainda faz cópias dos candidatos do meu pai.

Minha avó há dois anos não vota mais e eu, bem, ninguém me questionou sobre decisões. Aqui Diário o dia da eleição é um dia ainda enfadonho.

Nascemos com o mau de acharmos que diante de nossas condições de não empresários ou banqueiros, o pão, o leite, o arroz e a honestidade ainda é o melhor remédio contra a praga chamada política.

Meu pai sempre diz que é isso o que resta ao pobre independente em qual modelo social ele seja inserido. Esse ano ainda vou me abster, próxima vez quem sabe.

Quero fazer a diferença quando a diferença for algo diferente de salvador da Pátria, Robin Hood, engomadinho ou louco de pedra.

TEDDY O COITADINHOOnde histórias criam vida. Descubra agora