Capítulo VIII

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Migalhas De Pão Indicam A Direção

Acabei cochilando na floresta durante a tarde, atravessei o já costumeiro "portal transparente dos contos de fadas", no início da noite e, para minha surpresa, voltei a ser Chapeuzinho Vermelho.

- Ué, dei ré ao invés de avançar? - pensei em voz alta, olhando minhas vestes e a bolsa de couro no chão, sem resistir a comer grande parte do que havia nela, já que estava morrendo de fome e não queria pensar no amor, acordos e suas consequências estúpidas. - Onde será que eu estou? - sussurro, para mim mesma, notando que esta floresta era um tanto mais obscura e fechada que a de chapeuzinho.

Levanto-me e volto a caminhar, o mais silenciosamente possível, afinal, se eu estou como Chapéu, o lobo pode estar por aqui.

Não demora muito para que eu aviste uma casa e duas figuras de estatura baixa próximas a ela. Me aproximo com cautela e assim que sinto o cheiro forte de caramelo, marshmallow e açúcar suficiente para uma vida de diabetes, sei exatamente onde estou e quem são os dois baixinhos prestes a abocanhar esses doces malditos.

Mesmo sabendo que a bruxa jamais os comeria, que eles se salvariam, eu me pus a correr até aquelas crianças famintas e abandonadas a própria sorte pelo pai.

- Parem! - sussurrei, ao lado dos dois que perderam o fôlego de susto. - Desculpe, não tenham medo, quero ajudá-los. - eles me olhavam, segurando as mãozinhas um do outro e, naquele momento, eu imaginei como seria ter essa ligação com um irmão, sentir-se seguro apenas com um aperto de mãos, mas logo volto a tona. - Não comam esses doces! - tiro da mão de João, um menino de aproximadamente seis anos, magricela, de olhinhos castanhos redondos e cabelos escuros, uma bala colorida. - Esta casa pertence a uma bruxa, se comerem isso, ficam em dívida com ela, que vai devorá-los em troca. Pelo amor de Deus, crianças, não acharam nem um pouco estranho uma casa feita de doces prontos para o consumo perdida aqui no meio do mato, prontinha para ser abocanhada? - solto, com uma raiva que nunca percebi ter, mas, como burrice sempre me irritara, incomum seria que eu ficasse quieta, no entanto, quando vi seus olhinhos se encherem de lágrimas, me senti extremamente culpada. - Ora, sinto muito, não queria ser cruel com vocês. - suspiro. - Estão mesmo famintos, não é? - eles assentem, apressados. - Venham, eu tenho comida.

Guio eles para longe da casa e divido o conteúdo de minha bolsa com os mesmos, que comem felizes.

- Há quanto tempo estão perdidos? - questiono e Maria, uma versão feminina do irmão, com longos cabelos escuros divididos em duas tranças, se apressa em responder:

- Dois dias. O papai nos deixou aqui para ir cortar lenha, mas ele não voltou. - ela murcha, encolhendo os ombros, triste.

- Marcamos o caminho com migalhas de pão, mas os passarinhos as comeram. - completa João, chateado.

- Vamos mudar isso, prometo a vocês. - digo e os dois sorriem, felizes.

- Agora durmam, devem estar cansados, e não se preocupem, estarei aqui o tempo todo. - os dois se deitam, próximos, e dormem quase que instantaneamente e eu, tento ficar de vigia como um daqueles caras dos filmes de guerras, mas eu sou humana, sedentária e um poço sem fundo de sono, o que me leva a dormir dez minutos depois deles, acordando ao ouvir um chiado horrível ao meu lado.

Abro os olhos e dou de cara com um nariz pontudo, com uma verruga na ponta. Me afasto assustada, o que acorda João que cutuca Maria, e encaram a bruxa, paralisados por sua feiura, sendo ela de um tom de pele amarelado e doente, corcunda, extremamente velha, enrugada e carrancuda, além de ter uma cabeça e um nariz enormes.

- Você! - ela aponta um dedo longo e ossudo em minha direção. - Que direito acha que tem para tirar-me a refeição? - arregalo os olhos e encaro as crianças, que estavam abraçadas, com medo dessa tia de trezentos anos.

Princesa, não! - Invadindo Os Contos De Fadas (Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora