[05] Pobre e limpinha

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Capítulo 5: Pobre e limpinha

— Ficou me esperando? – Fran pergunta ao sair do banheiro.

— Eu... – penso no jeito menos humilhante possível de justificar meu medo de me aventurar pelos corredores da escola sozinha.

Não é do meu feitio me melindrar por qualquer coisa. Mas no meio tempo em que fiquei parada decidindo o caminho que deveria tomar para alcançar a sala de aula com mais rapidez vi pela frestinha da porta do banheiro masculino um rapaz enrolando um baseado.

A visão me paralisou.

Minhas pernas se recusam a se mover. Pensamentos conflitantes tomam conta de mim.

Acabara de presenciar um crime.

E, se eu pensar bem, não é o primeiro.

Afinal, meu pai não foi preso à toa.

— Nossa, você quer mesmo saber quem te jogou a bolinha, hein! – Fran fala de um jeito que não sei se é uma pergunta ou uma afirmação.

Ainda por cima, apoia a mão no meu ombro de um jeito que me arranca de vez das indagações sobre o usuário de drogas.

Há algo mais sério rolando ali.

Fran acabou de sair do banheiro.

E eu não sei se ela lavou a mão.

Dou um passo para o lado a fim de encerrar o contato, ao mesmo tempo, torço para que ela entenda aquilo como um incentivo a caminharmos de volta para a sala.

Até porque, todo intervalo entre aulas tem seu fim.

— O quê? – ela indaga com a cara amarrada, ao se colocar ao meu lado. – Sou pobre, mas sou limpinha, tá? Esqueceu que trabalho num estabelecimento que serve comida? Se fosse para você ficar reticente quanto a higiene das minhas mãos, era melhor que fosse enquanto eu servia seus cupcakes.

— Eu não falei nada! – me defendo, pulando uma caixa de som que atrapalha o caminho.

— Pior do que falar, você fez – Fran me acusa. – Agiu como se eu estivesse suja. E é esse tipo de atitude sem noção sua que me faz não querer te contar o que vi sobre a tal bolinha.

— Isso é golpe baixo – declaro, tentando bancar a senhora da razão. – Fui atacada, você tem o dever moral de me contar.

— Talvez eu até tenha – diz Fran entortando a cabeça para o lado, como se o atentado que sofri não fosse grande coisa. – Mas só vou contar o que sei com uma condição.

— Isso é chantagem – evidencio.

— Talvez – ela me dá razão. – Mas o que você vai fazer? Me processar? Contar tudo para e diretora? Ninguém vai ligar!

— O que você quer, então? – pergunto, sem me dar ao trabalho de assumir que muito provavelmente ela tem razão.

— Fazer suas unhas – ela revela. – Depois da aula.

Cato cavaco ao não reparar outra caixa de som largada pelo corredor tamanho é meu susto.

— Isso não faz sentido nenhum – argumento. – Minhas unhas estão feitas.

Mostro para ela as duas mãos para que ela comprove com seus próprios olhos que não estou mentindo.

— Mas estão muito sem-graças! – ela exclama ao mesmo tempo em que entramos na sala. – Qual é o sentido de fazer a unha se é pra pintar com um esmalte que é da mesma cor da unha?

A arte de morder a línguaOnde histórias criam vida. Descubra agora