Capítulo 4: O Mestre

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- Pare de tentar me acertar e me acerte! – bradou o Mestre.

Por mais rápido que o monge atacasse, só conseguia chutar o ar – o Mestre era mesmo muito ágil. O discípulo encurtou distância, tentou uma série de socos, mas tudo o que conseguiu foi receber um punho na face. Logo se recuperou e arriscou três chutes seguidos – o Mestre recuou, saltou de lado e revidou com um chute no estômago que fez o noviço cair no chão.

O Mestre se aproximou e esticou a mão para ajudá-lo:

- Em vez de afirmar que pode me derrubar, me derrube. Você é o que você faz, não o que diz que vai fazer.

O discípulo assentiu com a cabeça e o Mestre completou:

- Em alguns dias lutaremos novamente.


***


Percebam que o desejo excessivo causa sofrimento. A fadiga e os problemas do ciclo de nascimento e morte são gerados pela cobiça e pelo desejo. Nutram poucos desejos, sejam receptivos e serão contentes em corpo e mente.

Discurso sobre as Oito Percepções dos Grandes Seres (Bā dàrén jué jīng)


***


Todos os guerreiros têm uma chama queimando dentro de si chamada de A Fúria. Quando se está inebriado pelo desejo, mais cedo ou mais tarde a Fúria irrompe em uma cólera destrutiva que leva somente à perdição. Por isso o monge treina a mente, o corpo e o espírito. Com concentração plena, a Fúria é domada e convertida na energia flamejante que o move com vigor. Com a Fúria canalizada, o guerreiro conquista sozinho todo o campo de batalha.


***


O Soldado da Fortuna escolheu ser um Monge Guerreiro porque preza a liberdade.

Sendo livre, não necessita obter uma conquista maior que a última, nem carregar um fardo aonde quer que vá, ou ter o rosto estampado em praça pública. Alguém que se submete aos seus desejos, que se prende a uma ideia ou se sujeita à expectativa que os outros tenham dele, é um ser que só conhece a miséria da escravidão.

O contentamento é livre de posses e conceitos. Liberdade é deixar ir.


***


O Soldado da Fortuna acha que tudo é uma grande competição. O Monge Guerreiro sabe que o mundo todo é uma pequena comunidade.


***


O Mestre percebeu que o discípulo treinava um grande número de chutes em um espaço muito curto de tempo. Aproximou-se, e disse:

- Faça menos, com mais foco.

A partir deste dia, o discípulo priorizou a prática de um dos golpes, e até hoje é difícil encontrar alguém que o aplique melhor que ele.

O Monge Guerreiro treina o mesmo chute dez mil vezes. Porque vencerá a luta com este mesmíssimo chute, não com dez mil chutes diferentes.


***


Você não pode dizer "não meditarei hoje", ou "não treinarei hoje". Porque essa desculpa vai se estender por vários dias, então vários meses, então você não será mais um Monge Guerreiro, mas apenas alguém que sonha em ser um Monge Guerreiro.

SPIRITUS GLADIUS: O Manual Prático de Combate do Monge GuerreiroOnde histórias criam vida. Descubra agora